segunda-feira, 30 de maio de 2011

ALERTA À NAÇÃO BRASILEIRA

Um dos papeis da Igreja na sociedade é ser uma consciência profética capaz de ajudar a cada ser humano (entendido como um indivíduo livre e competente diante de Deus e dos homens, vivendo em uma sociedade pluralista) a discernir valores essenciais que norteiam os relacionamentos em todas as suas dimensões.

É nesse contexto que os batistas – integrantes de uma denominação cristã que, ao longo de toda a sua história, defende a liberdade religiosa, de consciência e de expressão – se manifestam para alertar sobre os perigos que a sociedade brasileira corre diante das novas conjunturas sociais aprovadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF) e que estão sendo propaladas por leis que tramitam no Congresso Nacional e por ações promovidas pelo Executivo.

Assim, alertamos para o perigo:

• De construir uma sociedade em que a legalidade pode ser estabelecida pelos interesses políticos e inclinações pessoais, como ocorreu no caso da releitura contraditória feita pelo STF do artigo 226 da Constituição Federal. O artigo diz:

“Art 226 - A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.
(...)
§3o – Para efeito da proteção do Estado, é reconhecida a união estável entre o homem e a mulher como entidade familiar, devendo a lei facilitar sua conversão em casamento.
§4o – Entende-se, também, como entidade familiar a comunidade formada por qualquer dos pais e seus descendentes.
§5o – Os direitos e deveres referentes à sociedade conjugal são exercidos igualmente pelo homem e pela mulher.

Quando uma casa que tem como principal missão defender a Constituição a rasga, corremos o perigo de viver um Estado jurídico de exceção, ao qual a nação brasileira não deseja retroceder.

• De destruir o conceito de família (que não é só cristão, mas universal e multicultural) para reconstruí-lo sob a égide somente da afetividade e não em toda a dimensão de suas funcionalidades como base da sociedade.
• De criar uma sociedade em que os valores essenciais são relativizados, pois onde tudo é relativo nada sobra para apoiar os alicerces do nosso futuro.
• De viver em uma sociedade que abandona os valores divinos revelados nas Escrituras Sagradas, pois a História, desde os tempos bíblicos, têm demonstrado que sociedades que abandonaram os valores mais elementares implodiram por perderem os seus pilares sustentadores – ainda que tenham sido, em algum momento, grandes potências no contexto universal.

Tais atitudes nada mais são do que a iniqüidade institucionalizada. Assim, conclamamos a sociedade brasileira a continuar mostrando que existem opiniões divergentes. Sem discriminação e com respeito a cada indivíduo, tais manifestações visam a defesa de valores pessoais e sociais, com integridade. Somente quando todos os segmentos da sociedade se expressam é que as forças políticas de nossa nação se sensibilizam para obviedade dos valores essenciais, como no caso recente da decisão de nossa presidente, Dilma Rousseff, ao impedir a distribuição do chamado “kit contra a homofobia ” nas escolas públicas.

Curitiba, 27 de maio de 2011

Pr. Paschoal Piragine Jr.
Presidente da Convenção Batista Brasileira.

Autorizamos a reprodução deste conteúdo única e exclusivamente se a fonte for citada como Convenção Batista Brasileira e com a inclusão do link para www.batistas.com (na internet).

FONTE: CONVENÇÃO BATISTA BRASILEIRA (link abaixo).

http://www.batistas.com/index.php?option=com_content&view=article&id=591:alerta-a-nacao-brasileira&catid=24:artigo3&Itemid=42

sábado, 28 de maio de 2011

IMPLICAÇÕES DO LIVRE ARBÍTRIO E DA TEORIA ARMINIANA

Por CHARLES SPURGEON.

De acordo com o esquema do livre-arbítrio, o Senhor tem boas intenções, mas precisa aguardar um servo, a iniciativa de sua criatura, para saber qual é a intenção dela. Deus quer o bem e o faria, mas não pode, por causa de um homem indisposto, o qual não deseja que sejam realizadas as boas obras de Deus. O que os senhores fazem, senão destronar o Eterno e colocar em seu lugar a criatura caída, o homem? Pois, de acordo com essa teoria, o homem aprova, e o que ele aprova torna-se destino. Tem de existir um destino em algum lugar; ou é Deus ou é o homem quem decide. Se for Deus Quem decide, então Iavé se assenta soberano em Seu trono de glória, e todas as hostes Lhe obedecem, e o mundo está seguro. Em caso contrário, os senhores colocam o homem em posição de dizer: “Eu quero” ou “Eu não quero”. Se eu quiser, entro no Céu; se eu quiser, desprezarei a graça de Deus. Se quiser, conquistarei o Espírito Santo, pois sou mais forte do que Deus e mais forte que a Onipotência! Se eu decidir, tornarei ineficaz o sangue de Cristo, pois sou mais poderoso que o sangue, o sangue do próprio Filho de Deus! Embora Deus estipule seu propósito, me rirei desse propósito; será o meu propósito que fará o dEle realizar-se ou não! Senhores, se isso não é ateísmo, é idolatria; é colocar o homem onde Deus deveria estar. Eu rejeito, com solene temor e horror, essa doutrina que faz a maior das obras de Deus – a salvação do homem - depender da vontade da criatura, para que se realize ou não. Posso e hei de me gloriar neste texto da Palavra, em seu mais amplo sentido: “Portanto, isso não depende do desejo ou do esforço humano, mas da misericórdia de Deus" (Rm 9.16).

Fonte: Biblioteca de Iglesia Reformada

http://www.iglesiareformada.com/Spurgeon_Arbitrio.html

sexta-feira, 13 de maio de 2011

VERDADES FUNDAMENTAIS

Por J. C. RYLE.

"Pois o que primeiramente lhes transmiti foi o que recebi: que Cristo morreu pelos nossos pecados, segundo as Escrituras, foi sepultado e ressuscitou no terceiro dia, segundo as Escrituras" (1Co 15.3,4).

O Apóstolo Paulo relembra aos coríntios que, entre as coisas que "primeiramente" lhes havia ensinado havia dois grandes fatos sobre Cristo: um era a Sua morte e o outro era a Sua ressurreição. Creio que a passagem nos introduz a dois assuntos extremamente relevantes: 1) Por um lado, precisamos prestar atenção às verdades primordiais que Paulo transmitiu aos coríntios. 2) Por outro lado, precisamos entender as razões que levaram Paulo a colocar essas verdades numa posição tão singularmente proeminente.
I. O que exatamente, então, pregou o Apóstolo "primeiramente" em Corinto? Antes de responder a essa pergunta, devemos compreender a situação de Paulo quando saiu de Atenas e entrou em Corinto.
Estamos diante de um judeu solitário que visita uma grande cidade pagã pela primeira vez, a fim de pregar uma religião inteiramente nova e iniciar uma agressiva missão evangelizadora. É membro de um povo desprezado tanto por gregos quanto por romanos, isolado e afastado de outras nações - em seu pequeno canto da Terra - pelos seus peculiares hábitos e leis, e sem nenhum renome entre os gentios, nem por sua literatura, nem por suas armas, artes ou ciência. "Pessoalmente" esse valente judeu "não impressiona" e sua "palavra", em comparação com a dos retóricos gregos, é "desprezível" (2Co 10.10). Encontra-se quase sozinho numa cidade famosa em todo o mundo, mesmo aos olhos pagãos, pelo seu luxo, imoralidade e idolatria. Esse era o lugar e esse era o homem! Difícil imaginar uma situação mais extraordinária.
E o que esse judeu solitário disse aos coríntios? O que disse a respeito do Fundador da nova fé que ele desejava que aceitassem no lugar de sua antiga religião? Começou dizendo-lhes como Cristo havia vivido e como havia ensinado, operado milagres e falado "como jamais homem algum falou"? Disse-lhes que Cristo havia sido rico como Salomão, vitorioso como Josué ou erudito como Moisés? Nada disso. O primeiro fato que Paulo proclamou a respeito de Cristo foi que Ele tinha morrido, e que Sua morte havia sido do tipo mais desonroso: a morte de um malfeitor, a morte de cruz.
E por que Paulo fez questão de falar primeiramente da morte de Cristo e não de Sua vida? Porque morreu pelos nossos pecados, como Paulo disse aos coríntios. Uma profunda e maravilhosa verdade, uma verdade que se encontra na base da religião que o Apóstolo havia ido pregar! Porque a morte de Cristo não foi a morte de um mártir ou um mero exemplo de abnegação. Foi a morte voluntária de um Substituto divino dos culpados filhos de Adão, por meio da qual Ele fez expiação pelo "pecado do mundo". Foi uma morte de tão extraordinária importância para a situação do pecador diante de Deus, que proporcionou uma redenção completa das consequências da Queda. Em poucas palavras, Paulo disse aos coríntios que, quando Cristo morreu, o fez como representante [e substituto] do pecador, expiando nosso pecado pelo sacrifício de Si mesmo e suportando o castigo que merecíamos: "Pois também Cristo sofreu pelos pecados de uma vez por todas, o justo pelos injustos, para conduzir-nos a Deus" (1Pe 3.18); "Deus tornou pecado por nós aquele que não tinha pecado, para que nele nos tornássemos justiça de Deus" (2Co 5.21). Um mistério grande e maravilhoso, sem dúvida! Mas um mistério para o qual cada sacrifício havia sinalizado, desde a época de Abel. Cristo morreu "segundo as Escrituras".
Outro grande fato com respeito a Cristo que Paulo inseriu em seu ensino foi a ressurreição dentre os mortos. Corajosamente disse aos coríntios que o mesmo Jesus que morreu e foi sepultado saiu vivo da sepultura no terceiro dia, e que muitas testemunhas O viram, tocaram n'Ele, falaram com Ele em pessoa. Por meio desse assombroso milagre demonstrou, como frequentemente havia dito que faria, que era o prometido e há tanto tempo esperado Salvador, que Deus o Pai havia aceitado a satisfação pelos pecados por meio de Sua morte, que tinha completado a obra da nossa redenção e que a morte, assim como o pecado, era um inimigo vencido. Em resumo, o Apóstolo ensinou que havia ocorrido o maior dos milagres, e que, com semelhante Fundador da nova fé que tinha vindo proclamar, primeiro morrendo pelos nossos pecados e depois ressuscitando para nossa justificação, não havia nada impossível nem faltava coisa alguma para a salvação do homem.
Essas eram as duas grandes verdades que Paulo disse com prioridade quando iniciou sua campanha como mestre cristão em Corinto: a morte substitutiva de Cristo pelos nossos pecados e Sua ressurreição do sepulcro. Duas verdades incomparáveis. Sem dúvida, adotar essa tática seria uma dura prova para a fé e para a coragem de um homem culto e erudito como Paulo. A carne e o sangue resistem a isso. Ele mesmo disse: "Pois decidi nada saber entre vocês, a não ser Jesus Cristo, e este, crucificado. E foi com fraqueza, temor e muito tremor que estive entre vocês" (2Co 2.2,3). Pela graça de Deus, ele não desistiu.
O caso de Corinto não foi único. Onde quer que fosse o Apóstolo dos gentios, pregava a mesma doutrina com prioridade. Dirigiu-se a ouvintes heterogêneos, a pessoas com mentalidades muito diferentes. Mas sempre valia-se do mesmo remédio, seja em Jerusalém, seja em Antioquia, seja na Pisídia ou em Icônio, em Listra, Filipos ou em Tessalônica, seja Beréia, Atenas, Éfeso ou em Roma. Esse remédio era a história da Cruz e da Ressurreição. Permeia todos os seus sermões e epístolas. Mesmo Festo, o governador romano, quando conversa com Agripa sobre o caso de Paulo, descreve o Apóstolo falando de "um certo Jesus, já morto, o qual Paulo insiste que está vivo" (At 25.19).
a) Vejamos agora quais eram os princípios essenciais dessa "religião" que saiu há tantos séculos da Palestina e que mudou o mundo. O maior dos descrentes não pode negar o efeito que o Cristianismo produziu no gênero humano. O mundo antes e o mundo depois do Cristianismo são tão diferentes como a luz da escuridão, como a noite e o dia. Foi o Cristianismo que arruinou a idolatria pagã e esvaziou seus templos, que deteve os combates dos gladiadores, elevou a posição da mulher e melhorou as condições das crianças e dos pobres. Esses são fatos que com certeza podem desafiar os inimigos da fé cristã. São fatos que constituem uma dificuldade enorme para a filosofia ateísta. E o que possibilitou todas essas conquistas? Não foi - como dizem alguns - a mera difusão de um código moral elevado, uma espécie de platonismo melhorado. Não! Foi a simples história da Cruz do Calvário e do sepulcro vazio no jardim, a maravilhosa morte de Alguém "contado entre os transgressores" (Is 53.12) e o assombroso milagre da Sua ressurreição. Foi relatando fielmente como o Filho de Deus morreu pelos nossos pecados e ressuscitou para a nossa justificação que os Apóstolos mudaram a face do mundo, fundaram igrejas e transformaram um incontável número de pecadores em santos.
b) Por outro lado, devemos aprender qual deve ser o fundamento de nossa própria religião pessoal se verdadeiramente queremos ter vida espiritual saudável. Que os cristãos primitivos possuíam essa qualidade de vida espiritual saudável é algo claro como o Sol do meio-dia. No Novo Testamento lemos continuamente sobre a alegria, a paz, a paciência e o contentamento. Lemos na história eclesiástica sobre a coragem e firmeza dos cristãos diante da mais feroz perseguição, de como suportaram o sofrimento e morreram de modo triunfante. E qual foi a origem dessas características peculiares, que despertaram a admiração até mesmo de seus piores inimigos e a perplexidade de filósofos pagãos como Plínio? Só pode haver uma resposta. Esses homens haviam abraçado firmemente os dois grandes fatos que Paulo proclamou "primeiramente" aos coríntios: a morte e a ressurreição de Jesus Cristo, o Senhor. Jamais nos envergonhemos de seguir seus passos! É fácil zombar da "teologia sistemática" e de credos, confissões doutrinárias e declarações de fé como se fossem coisas antigas e ultrapassadas, impróprias para o nosso tempo. Mas, afinal de contas, quais são os frutos da filosofia moderna e do ensino frio e insípido do humanismo em comparação com os desprezados dogmas do Cristianismo bíblico? Se alguém quiser ter paz nesta vida, esperança na morte e experimentar conforto e consolação no sofrimento, jamais encontrará tais bênçãos, exceto entre aqueles que descansam nos dois grandes fatos de nosso texto, e que podem dizer: "A vida que agora vivo no corpo, vivo-a pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou por mim" (Gl 2.20). Sim, o coração humano somente encontra repouso nos "dogmas" tão desprezados pelos filósofos humanistas!
II. Permitam-me passar agora a outra ideia a respeito do tema que estamos tratando. Vimos quais foram as verdades que Paulo proclamou "primeiramente" aos coríntios e quais foram os efeitos que produziram. Tentaremos agora compreender e examinar as razões que o levaram a colocá-las numa posição tão preeminente.
Essa questão é muito interessante. Não posso sustentar, como fazem alguns, que Paulo adotou tal procedimento somente porque assim lhe foi ordenado pelo Senhor. Creio que as razões são muito mais profundas. Essas razões devem ser procuradas nas necessidades humanas e no estado decaído da natureza humana. Creio que as carências humanas jamais seriam satisfeitas por uma mensagem diferente daquela pregada pelo Apóstolo Paulo em Corinto; e se não tivesse procedido desse modo, seu trabalho ali teria sido em vão.
Porque há três coisas óbvias a respeito de todo homem, quando examinamos sua natureza, sua posição e sua constituição. O homem é uma criatura com um sentimento de pecado e de responsabilidade no mais íntimo de seu coração; uma criatura que experimenta a dor e o sofrimento desde o berço até a sepultura; e uma criatura que tem diante de si a certeza da morte e de um estado futuro final. Esses são três grandes fatos com os quais nos enfrentamos inexoravelmente em todo o mundo, em todas as culturas. Percorra todo o planeta e você encontrará esses fatos tanto nos cristãos mais educados quanto nos pagãos mais incultos. Percorra seu próprio país, e você os encontrará tanto no camponês quanto no filósofo. Em todos os lugares, em todas as classes sociais, você encontrará o mesmo. E a tese que defendo é a seguinte: que não é possível imaginar ou conceber nada mais admiravelmente adequado para satisfazer a necessidade da natureza humana do que a mesma doutrina que Paulo pregou em Corinto: a doutrina da morte de Cristo pelos nossos pecados e Sua ressurreição do sepulcro por nós. Tal doutrina ajusta-se perfeitamente à necessidade humana, tal como a chave correta se encaixa em sua fechadura.
Permitam-me expor brevemente as três coisas que acabo de mencionar e tentarei mostrar a intensa luz que lançam sobre a escolha que Paulo fez daquilo que deveria pregar em Corinto.
a) Consideremos, em primeiro lugar, o sentimento interior de pecado e imperfeição que existe, em maior ou menor grau, em cada membro da família humana. Admito abertamente que difere grandemente entre diferentes pessoas. Em milhares de indivíduos parece como que houvesse desaparecido por completo. A falta de educação, o pecado constante, a rejeição contínua da fé cristã, a indulgência habitual em todos os desejos da carne: tudo isso tem a capacidade fantástica de cegar os olhos e cauterizar a consciência. Mas onde você encontrará um homem - exceto entre os brâmanes de castas altas ou entre cristãos lunáticos - que se atreva a afirmar que é perfeito e que não confesse, se seriamente questionado, que não é exatamente quem deveria ser e que sabe que deve fazer o bem, mas não o faz? Oh, não! A grande maioria dos seres humanos tem uma consciência de pecado que de vez em quando os faz sentir-se em completa desgraça. A austeridade auto-imposta dos hindus ou o temor de governantes como Herodes e Félix são provas do que quero dizer. Onde quer que haja um filho de Adão, há uma criatura consciente, no mais íntimo de seu coração, da culpa, de seus defeitos e de sua necessidade.
E quando esse sentimento de pecado desperta e nos atormenta, quem pode curá-lo? Alguns falam vagamente da "misericórdia" e da "bondade" de Deus, mesmo sendo completamente incapazes de explicar seu significado ou de explicar que direito tem o homem a elas. Outros se convencem a si mesmos de que seu próprio arrependimento, suas lágrimas e orações, e a prática ativa e diligente de ritos religiosos lhes trará paz. Mas que filho de Adão obteve paz dessa maneira? Jamais coisa alguma fez bem à alma humana exceto a visão do divino Mediador entre Deus e os homens, a Pessoa real e viva, onipotente e cheia de misericórdia de Jesus Cristo, que suportou nossos pecados, sofreu em nosso lugar, e levou sobre si o fardo de nossa redenção. Enquanto o homem olhar somente para si mesmo e buscar limpar-se do sentimento de pecado pelas suas próprias forças, conseguirá apenas sentir-se mais e mais perdido e condenado. Mas quando olhar para fora, para "Jesus Cristo, homem" morrendo por seus pecados, e descanse sua alma n'Ele, encontrará, como encontraram milhões através dos séculos, exatamente o que necessita a sua alma ferida. Em suma, a fé na morte de Cristo pelos nossos pecados é o remédio que Deus providenciou para a necessidade espiritual do homem. É a cura divina para essa praga letal que infecta toda a humanidade e que faz com que todos os homens sintam-se condenados. Se Paulo não tivesse proclamado essa cura em Corinto, teria demonstrado uma grande ignorância sobre a natureza humana e teria sido um médico sem valor. E se nós, ministros do evangelho, não a proclamamos é porque nossos olhos estão fechados e não temos luz.
b) Consideremos agora a tendência universal do homem ao sofrimento. As Escrituras dizem que "o homem nasce para as dificuldades" (Jó 5.7) e tal afirmação é continuamente experimentada por milhões que nunca conheceram a Palavra de Deus. Todos concordam que o mundo está cheio de problemas. É um ditado correto que chegamos a esta vida chorando, passamos por ela reclamando e a abandonamos decepcionados. De todas as criaturas de Deus, nenhuma é tão vulnerável quando o homem. O corpo, a mente, os sentimentos, a família e a propriedade são todos suscetíveis de transformar-se em fontes de dor e agonia. E não há classe social ou hierarquia que seja imune a essas coisas. Tanto ricos quanto pobres experimentam a dor, os eruditos e os incultos, os jovens e os velhos; a dor está presente no castelo e no casebre, e nem a riqueza, nem a ciência, nem a posição social elevada podem evitar que a dor invada nossas casas e nos assalte sem prévio aviso, como um homem armado. Essas são questões antigas, eu sei; os poetas e filósofos da antiga Grécia e mais tarde de Roma as conheciam tão bem quanto nós. Mas devemos sempre manter esses fatos em nossas mentes.
O que nos ajudará a resistir e suportar a dor? Se nosso estado é tal, desde a Queda, que simplesmente não podemos fugir à dor e ao sofrimento, como poderemos torná-los mais suportáveis? As frias lições do estoicismo carecem de poder para isso. É fácil teorizar sobre resignação e submissão à vontade de Deus quando tudo está bem. Mas quando a tempestade chega e os corações desfalecem, fluem as lágrimas e surgem brechas em nosso círculo familiar, quando o dinheiro se evapora e chega até nós a doença, simplesmente queremos algo mais do que princípios filosóficos abstratos e lições de moral. Queremos um Amigo pessoal e vivo, um Amigo a quem possamos nos dirigir com plena confiança, sabendo que Ele pode nos ajudar eficazmente.
Dito isso, minha opinião é que exatamente aqui resplandece com tremendo poder a doutrina que Paulo pregou aos coríntios, sobre Cristo ressuscitado. Esse Cristo satisfaz exatamente as nossas necessidades! Temos Alguém assentado à direita de Deus como nosso Amigo, e Ele tem poder para nos ajudar. Jesus, o Filho de Deus, se compadece de nossas fraquezas, conhece o coração do homem e toda a sua situação, porque Ele mesmo nasceu de uma mulher e participou da carne e do sangue. Sabe o que é dor, porque Ele mesmo chorou, gemeu e sofreu nos dias da Sua carne. Demonstrou Seu amor por nós - nos "aturou" (At 13.18) - durante trinta e três anos, por meio de inúmeros atos de bondade e incontáveis palavras de consolação. E morreu finalmente por nós na cruz. E antes de abandonar este mundo disse palavras como estas: "Não se perturbe o coração de vocês. Creiam em Deus; creiam também em mim" (Jo 14.1). "Não os deixarei órfãos; voltarei para vocês" (Jo 14.18). "Peçam e receberão, para que a alegria de vocês seja completa" (Jo 16.24). Não posso imaginar uma verdade que melhor se ajuste às necessidades do homem como esta. As regras, princípios e prescrições em tempos de dor têm a sua utilidade; mas o que o coração humano anela é um Amigo pessoal para apoiar-se e com o qual possa ter comunhão. O Cristo ressuscitado e vivo que intercede por nós à destra de Deus é precisamente o Amigo que necessitamos. Se Paulo não tivesse proclamado isso aos coríntios, teria deixado de satisfazer uma das maiores necessidades do ser humano. O homem não encontrará satisfação em nenhuma religião ou espiritualidade que não preencha as maiores carências da natureza humana. Os mestres que não cedem espaço ao Cristo ressuscitado e vivo em seus sistemas teológicos não deveriam ficar surpresos se os seus cansados ouvintes porventura busquem refúgio aos pés de religiões humanas ou mesmo do catolicismo romano.
c) Consideremos, em último lugar, a certeza da morte e de suas consequências que todo filho de Adão sabe que enfrentará um dia.
Dizer que a morte é algo grave é expressar o óbvio. O fim de cada indivíduo continua sendo uma circunstância transcendental em sua história e a maioria dos homens honrados assim o confessam. Abandonar o mundo e fechar os olhos para tudo aquilo com o que nos relacionamos, entregar nossos corpos à humilhação da fraqueza, da decadência e do sepulcro; sermos obrigados a abandonar todos os nossos planos e propósitos; tudo isso é bastante grave. Mas quando acrescentamos o perturbador pensamento de que há algo além, algum tipo de prestação de contas pela nossa vida na Terra, a morte de qualquer homem ou mulher transforma-se num acontecimento muito mais do que grave. Bem falou Shakespeare, nosso grande poeta, do "pavor de algo além da morte". É um temor que muitos sentem bem mais do que gostariam de admitir. Poucos encontram paz no fatalismo maometano, e menos ainda na doutrina da aniquilação.
De fato, não há nenhuma questão na qual as religiões não inspiradas da Antiguidade ou os sistemas filosóficos modernos sejam derrubados de tal forma como diante da questão da morte. Morar para sempre nos campos elíseos, entre fantasmas espectrais, era um fim não desejado nem mesmo pelos heróis homéricos. A teoria vaga e infundada de um estado de repouso depois da morte onde, de algum modo, as almas dos bons e justos, separadas de seus corpos, passam uma existência infindável sem propósito ou atividade é realmente um triste consolo. Homero, Platão, Bolingbroke, Voltaire e Paine ficam mudos e estarrecidos diante da visão de um sepulcro aberto.
Mas exatamente no ponto onde todos os sistemas criados pelos homens são mais fracos e incapazes de satisfazer as necessidades da natureza humana, é justamente onde o Evangelho proclamado por Paulo em Corinto é mais forte. Porque ele nos revela um Salvador Todo-Poderoso que não somente morreu pelos nossos pecados e descendeu ao sepulcro, mas que também ressuscitou corporalmente e demonstrou Sua vitória sobre a morte: "Mas de fato Cristo ressuscitou dentre os mortos, sendo ele as primícias dentre aqueles que dormiram" (1Co 15.20); "Ele tornou inoperante a morte e trouxe à luz a vida e a imortalidade por meio do evangelho" (2Tm 1.10); "E libertasse aqueles que durante toda a vida estiveram escravizados pelo medo da morte" (Hb 2.15).
E demos graças a Deus porque Cristo não obteve essa vitória sobre a morte e o sepulcro unicamente para Si mesmo. Desde então Ele tem capacitado a milhões de homens e mulheres cristãos, que têm crido n'Ele e têm confiado n'Ele, para afrontar o rei dos terrores sem temor e descer ao vale da sombra da morte com a esperança firme e segura de que sairão vitoriosos e verão, em sua carne, a Deus. Leia a história das mortes dos cristãos primitivos sob a perseguição pagã. Considere como morreram os que sofreram pelo protestantismo em Oxford e Smithfield sob a rainha Maria. Encontre, se puder, entre todas as biografias, leitos de morte de inconversos que possam comparar-se aos de cristãos em questão de paz, esperança e grande consolação. Você poderá buscar eternamente, sem encontrá-los. Você chegará à conclusão de que a velha verdade escriturística da morte e da ressurreição de Cristo é exatamente a verdade que se ajusta perfeitamente à natureza humana e, como tal, somente pode ter vindo de Deus. Isto, e somente isto, pode capacitar o homem para enfrentar o último inimigo sem temor e proclamar: "Onde está, ó morte, a sua vitória? Onde está, ó morte, o seu aguilhão?" (1Co 15.55).
Que diremos de todas essas coisas? Sei muito bem que o coração humano e suas carências são questões profundas e complexas. Mas depois de estudar atentamente os corações dos homens durante muitos anos, tenho chegado a uma firme convicção. Essa convicção é que a verdadeira razão pela qual Paulo pregou, em primeiro lugar e antes de mais nada, aquilo que ele pregou em Corinto, encontra-se em seu correto entendimento da natureza, do estado moral e da posição do homem. O Espírito Santo de Deus ensinou Paulo que esse era o único remédio adequado para semelhante enfermidade. A natureza humana precisa de uma religião para os pecadores, um remédio e um Redentor pessoal; e a Pessoa e a obra de Cristo ajustam-se maravilhosamente a esses requisitos. Estamos doentes de uma doença mortal e nossa principal necessidade é de um Médico vivo.
Teria sido completamente inútil que Paulo começasse sua obra em Corinto dizendo aos homens que fossem virtuosos e moralistas, sem falar-lhes primeiramente de Cristo. É igualmente inútil hoje em dia. É até claramente maléfico. Clamar à natureza humana sem mostrar-lhe logo o remédio de Deus pode levar a consequências atrozes. Não conheço caso mais lamentável do que o de um homem que vê claramente o pecado, o sofrimento e a morte por um lado, mas que não vê claramente a Cristo morrendo pelos seus pecados e ressuscitando de outro lado. Desse modo o indivíduo cai em desespero, tornando-se presa fácil de teologias espúrias, como a enganosa teologia do catolicismo romano. Sem dúvida podemos dormir o sono dos descrentes durante muitos anos e não sentir medo ou dúvidas espirituais. Mas uma vez que a consciência do homem desperta e começa a desejar a Paz, não conheço remédio que possa curar-lhe e proteger-lhe do erro que destrói as almas, exceto o que Paulo transmitiu "primeiramente" em Corinto: as doutrinas da morte expiatória e da ressurreição de Cristo.
E agora permitam-me concluir esta reflexão com alguns conselhos. Conselhos que, creio, são adequados aos nossos tempos. Quem sabe se estas palavras possam ser de grande auxílio para muitos!
a) Permita-me, pois, aconselhá-lo encarecidamente que você não se envergonhe de sustentar ideias firmes a respeito das coisas mais importantes, isto é, as verdades fundamentais do Cristianismo. Sua sorte está lançada numa época de livre pensamento, de liberalismo, em que tudo é questionado. Existe uma ampla rejeição à firmeza doutrinária e tudo o que se denomina dogmatismo, e talvez não há ninguém mais exposto a essa mentalidade do que o jovem. A generosidade, a candidez e o desejo de agradar dos jovens fazem com que muitos abandonem ideias teológicas muito "categóricas". A tentação da atualidade é contentar-se com um vago "fervor" espiritual, e abster-se de qualquer ideia preciosa e distintiva; a ser "membro honorário" de todas as escolas de pensamento e sustentar que nenhum homem pode estar certo da verdade.
b) No entanto, a sua fé deve ter raízes para conseguir viver e se desenvolver neste mundo. Flores, por mais belas que sejam, não têm capacidade de perdurar se não tiverem raízes profundas. Admitindo plenamente que no Cristianismo existem coisas secundárias sobre as quais os jovens podem abster-se corretamente de julgar até obterem mais luz, eu lhe peço que se lembre que existem coisas prioritárias sobre as quais você deve, sim, ter uma opinião. Afirmo que você deve fazê-lo se quiser ter paz interior e ser útil para a sociedade. E entre essas coisas prioritárias destacam-se como montanhas numa planície as duas grandes verdades que Paulo pregou aos coríntios: a morte de Cristo pelos nossos pecados e a Sua ressurreição. Apegue-se firmemente a essas duas grandes verdades. Firme sua vida sobre elas. Alimente sua alma com elas. Viva delas. Morra com elas. Não se separe jamais delas: "Eu sei em quem tenho crido". Não em que, mas em quem. Vivo pela fé n'Aquele que morreu e ressuscitou por mim. Tenha isso claro, não importa o preço a pagar. E em seu devido tempo todas as outras verdades das Escrituras serão acrescentadas.
c) Talvez alguns que leiam esta reflexão estejam passando da tranquilidade de um lar feliz para o campo de batalha da dor e do sofrimento. Mas onde quer que você esteja agora, seja na cidade ou no campo, seja entre os ricos ou entre os pobres, espero que você faça sempre o bem. E lembre-se que um grande problema que você terá que resolver constantemente é como ajudar as almas que se encontram sob o fardo do pecado, esmagadas pelo peso da dor e oprimidas pelo terror da morte. E quando chegar esse momento, lembre-se das palavras que lhe digo hoje: A única forma de fazer o bem é seguir os passos de Paulo e dizer aos homens, em primeiro lugar e antes de qualquer outra coisa, constante e publicamente, de porta em porta, que Jesus Cristo morreu pelos nossos pecados e ressuscitou para a nossa justificação, que vive à direita de Deus para interceder, perdoar e preservar; e que logo voltará para nos proporcionar uma ressurreição gloriosa. Estas são as verdades que o Espírito Santo tem abençoado sempre, está abençoando e sempre abençoará até que o Senhor venha. Essas foram as coisas que Paulo ensinou "primeiramente". Decida e determine que essas também serão verdades prioritárias para você.

John Charles Ryle (1816-1900) serviu como reitor de St. Thomas, Winchester, e como Pastor de Helmingham e Stradbroke (Inglaterra). Foi Pastor principal da diocese anglicana de Liverpool, a partir de 1880. Sua produção literária foi imensa. Seus folhetos alcançaram uma difusão de 20 milhões de exemplares. Contribuiu de modo incalculável com a literatura reformada por meio de seus escritos e sermões. O texto acima foi traduzido e adaptado por F.V.S. de um sermão pregado por Ryle na Universidade de Oxford, no ano 1880.

Fonte: RYLE, J. C. El Aposento Alto. Moral de Calatrava (Ciudad Real): Peregrino, 2005, pp. 50-65.

sexta-feira, 6 de maio de 2011

COMO PASSAR O DIA COM DEUS

Abaixo, uma mensagem vigorosa de Richard Baxter, autor de "O Pastor Reformado" [no Brasil, publicado pela PES com o título O Pastor Aprovado] e "O Descanso Eterno dos Santos" [Shedd Publicações], entre outras obras importantíssimas da fé cristã. Vale a pena ouvir com atenção a voz desse puritano - uma voz que nada mais é do que o eco da sabedoria bíblica.


Uma vida santa pode ser vivida de modo mais pleno quando sabemos a sequência e o método apropriado para nossas responsabilidades com cada coisa em seu local apropriado. Portanto, darei algumas breves instruções para santificar o dia.
Dormir
Meça cuidadosamente o tempo de seu sono, de modo a não desperdiçar suas preciosas horas da manhã de forma lenta e pesada em sua cama. Que o tempo de seu sono seja adequado à sua saúde e ao seu trabalho, e não ao seu prazer preguiçoso.
Primeiros Pensamentos
Faça com que Deus tenha a primazia sobre os seus primeiros pensamentos ao despertar pela manhã. Levante seu coração a Ele de maneira reverente e com ação de graças pelo descanso desfrutado na noite anterior e entregue a si mesmo a Ele pelo dia que começa. Você deve familiarizar-se de forma tão consistente com isso que sua consciência possa avisá-lo imediatamente quando pensamentos comuns se intrometam nos primeiros. Pense na misericórdia de uma noite enquanto tantos passaram essa noite no próprio inferno; quantos em prisões; quantos em alojamentos rudes e frios; quantos sofreram dores e enfermidades agonizantes; cansados de seus leitos e de suas vidas. Pense em quantas almas foram chamadas de seus corpos nessa noite para aparecer aterradas diante de Deus - e pense quão rapidamente passam os dias e as noites! Com que rapidez passou a sua noite passada e virá seu novo dia! Preste atenção para o que está faltando à sua alma para prepará-lo para esse novo dia e busque-o sem demora.
Oração
Que a oração que você fizer a sós (ou com seu cônjuge) seja feita antes da oração coletiva em família. Se possível, ore antes de qualquer trabalho do dia.
Adoração em Família
Que a adoração em família seja feita de modo consistente no horário adequado para que a família esteja livre de quaisquer tarefas e interrupções.
Propósito último
Lembre-se de seu propósito último, e quando se dispor para o seu dia de trabalho ou empreender qualquer atividade no mundo, que a santidade ao Senhor esteja escrita em seu coração em tudo o que fizer. Não faça nenhuma atividade que você não possa entregá-la a Deus. Diga verdadeiramente que Ele estabeleceu você em seu trabalho, e não faça nada no mundo para nenhum outro propósito último que não seja agradar, glorificar e desfrutar de Deus. "Façam tudo para a glória de Deus" (1Co 10.31).
Diligência em seu chamado
Dedique-se às tarefas de seu chamado de modo cuidadoso e seja diligente. Agindo assim, mostrará que não é preguiçoso nem escravo de sua carne, e mortificará os desejos e paixões carnais que são alimentados pelo ócio e pela preguiça. Mantenha longe de sua mente os pensamentos ociosos, que pululam na mente dos frívolos. Não perca seu tempo precioso, algo do qual as pessoas fúteis são culpadas diariamente. Agindo assim você estará a caminho de servir a Deus, enquanto os preguiçosos tornam-se culpados do pecado da omissão. Você poderá separar mais tempo para deveres santos se dedicar-se com diligência às suas ocupações. As pessoas frívolas não têm tempo para a oração e para a leitura porque perdem tempo no ócio em vez de trabalhar. Desse modo você poderá esperar a bênção de Deus e Sua provisão tanto para você quanto para a sua família. Isso também irá estimular a saúde de seu corpo, a fim de aumentar sua competência para o serviço ao Senhor.
As tentações e a corrupção
Mantenha-se totalmente consciente de suas tentações e das coisas que possam corrompê-lo - e vigie-se durante todo o dia. Você precisa vigiar, de maneira especial, as coisas mais perigosas que corrompem, e aquelas tentações que suas companhias ou negócios inevitavelmente colocarão diante de você.
Vigie os pecados dominantes da incredulidade: a hipocrisia, o egoísmo, o orgulho, a complacência da carne e o amor excessivo pelas coisas terrenas. Tenha cuidado para não ser arrastado pela mentalidade mundana e pelas preocupações excessivas, ou por planos cobiçosos. Se fizer acordos comerciais com outros, seja vigilante a respeito do egoísmo e de tudo o que pareça injustiça ou falta de caridade. Em todo o seu tratamento aos outros, mantenha-se vigilante contra a tentação da conversa fútil e vazia. Vigie também aquelas pessoas que o tentarão à ira. Mantenha a modéstia e a linguagem sadia e pura. Se conversar com bajuladores, mantenha-se em guarda contra o orgulho. Se conversar com aqueles que o desprezam e o magoam, arme-se contra o orgulho vingativo e impaciente.
No começo essas coisas serão árduas, enquanto o pecado tenha muita força sobre você, mas quando você alcançar uma consciência permanente do perigo venenoso de qualquer desses pecados, seu coração os evitará mais facilmente e de bom grado.
Meditação
Quando você se encontrar sozinho em suas ocupações, melhore seu tempo com meditações práticas e benéficas. Medite sobre a bondade e as perfeições infinitas de Deus; em Cristo e na redenção; no Céu e em quão indigno você é para lá ir e como você merece a miséria eterna do inferno.
O Único Motivo
Qualquer coisa que você fizer, acompanhado ou sozinho, faça tudo para a glória de Deus (1Co 10.31). De outra forma, seria inaceitável para Deus.
Remindo o Tempo
Valorize seu tempo. Seja mais cuidadoso para não perdê-lo, como é cuidadoso para não perder dinheiro. Não deixe que as recreações sem valor, a conversa frívola, a companhia pouco proveitosa, ou o sono, roubem seu precioso tempo. Seja cuidadoso para escapar dessa pessoa, ação ou lugar que roubariam de você o seu tempo. Assegure-se de que não está meramente "ocupado", mas sim que está usando seu tempo do modo mais proveitoso possível, e não prefira um caminho menos proveitoso em vez de um de grande proveito.
Comer e Beber
Coma e beba com moderação e agradecimento pela saúde, não pelo prazer sem proveito. Nunca satisfaça seu apetite pela comida ou pela bebida quando ambas sejam propensas a prejudicar sua saúde. Lembre-se do pecado de Sodoma: "Ora, este foi o pecado de sua irmã Sodoma: ela e suas filhas eram arrogantes, tinham fartura de comida e viviam despreocupadas; não ajudavam os pobres e os necessitados" (Ez 16.49). O Apóstolo Paulo chorava quando mencionava aqueles "inimigos da cruz de Cristo. O destino deles é a perdição, o seu deus é o estômago e eles têm orgulho do que é vergonhoso; só pensam nas coisas terrenas" (Fp 3.18,19). "Pois se vocês viverem de acordo com a carne, morrerão" (Rm 8.13).
Pecados Predominantes
Se alguma tentação prevalecer sobre você, e você cair em qualquer pecado além das falhas habituais, lamente-se imediatamente e confesse-o a Deus. Arrependa-se rapidamente, não importa o custo. Certamente custará mais a você se continuar no pecado e permanecer sem arrepender-se. Não trate de maneira trivial suas falhas habituais, mas confesse-as e lute contra elas diariamente, tendo cuidado de não agravá-las pela falta de arrependimento e pelo desprezo.
Relações Humanas
Lembre-se diariamente das obrigações especiais das várias relações humanas: seja como esposo, esposa, filho, chefe, servo, pastor, magistrado, súdito. Lembre-se de que toda relação humana tem sua responsabilidade especial e sua vantagem para fazer algum bem. Deus requer sua fidelidade nesse assunto igualmente que em qualquer outro dever.
Encerrando o Dia
Antes de voltar a dormir, é sábio e necessário revisar as ações e bênçãos do dia que já está passando, para que você possa estar agradecido por todas as misericórdias especiais e humilde por todos os seus pecados. Isso é preciso para que você possa renovar seu arrependimento assim como sua resolução de obedecer, e para que possa examinar a si mesmo para ver se em sua alma fez o melhor ou o pior, se o pecado diminuiu e a graça aumentou, e se você está preparado para o sofrimento, a morte e a eternidade.
Que essas instruções possam ser gravadas em sua mente e que se tornem a prática diária da sua vida.
Se você as praticar com sinceridade, elas o conduzirão à santidade, farão com que você frutifique e darão serenidade à sua vida, para que um dia alcance uma morte confortável e pacífica.

Por Richard Baxter.

Fonte: Biblioteca de Iglesia Reformada.
Agradecimentos ao irmão Pr. Esteban Larson, missionário da Igreja Presbiteriana Ortodoxa dos Estados Unidos em Rivera, Uruguai.




domingo, 1 de maio de 2011

DESMASCARANDO O DOGMA DISPENSACIONALISTA

POR HANK HANEGRAAFF.

Considere um dogma que praticamente nunca se havia considerado antes do século XIX. Em poucos anos, no entanto, deixou de ser algo pequeno e limitado às Ilhas Britânicas para tornar-se um fenômeno mundial. Milhões exaltaram suas virtudes com fervor religioso e espírito missionário. No século XX, suas principais doutrinas adentraram os bastiões da educação e percorreram os corredores da influência e do poder. Os mestres da comunicação massiva levaram seus princípios para todos os setores das ciências, e as instituições acadêmicas reproduziram fielmente sua mensagem. Apesar de ser, na verdade, um amontoado de informações incorretas, o dogma em questão foi adotado de tal forma que todos os que se posicionaram contrariamente ao mesmo foram considerados reacionários e obscurantistas. Os proponentes desse dogma consideraram-se a si mesmos como guardiões da ortodoxia e passaram a reagir com fúria avassaladora quando alguém colocava em dúvida seus pressupostos. Mesmo com bases obviamente racistas, muitas personalidades famosas, políticos de influência e escritores famosos exaltam suas virtudes.

O dogma ao qual me refiro é o da evolução darwinista. A revolução intelectual que ele desencadeou criou a infraestrutura científica de uma das maiores atrocidades da História da humanidade. A sanha genocida de Hitler foi inflamada pelo argumento racista de Darwin de que “as raças humanas civilizadas deverão exterminar e suceder as raças humanas selvagens do mundo” [1]. No fim das contas, a filosofia de Hitler de que os arianos eram super-humanos e que os semitas eram sub-humanos levou ao extermínio de seis milhões de judeus. Arthur Keith, um antropólogo do século XX, afirmou: “O Führer alemão é um evolucionista, e tem procurado, incessantemente, fazer com que a Alemanha conforme-se à teoria da evolução” [2].

Da mesma forma que Hitler, Karl Marx, o pai do comunismo, viu em Darwin o apoio sociológico e científico de um experimento que rivalizou em magnitude os horrores do holocausto. Sigmundo Freud, o fundador da psicologia moderna, também foi um fiel seguidor de Charles Darwin. Sua crença de que o homem é simplesmente um animal complexo o levou ao postulado de que “a ansiedade, a paranóia e outras desordens mentais incorporam modos de comportamento que foram em algum momento adaptações das espécies humanas nas diversas etapas da evolução” [3]. O Dr. John L. Down qualificou a Síndrome de Down como “idiotice mongolóide” porque ele a considerava um “retrocesso” ao “estado mongolóide” da evolução humana [4].

Tais “retrocessos”, naturalmente, não são desejáveis. Para que a evolução continue progredindo, é vital que o mais incapacitado morra e que apenas o mais apto sobreviva. Marvin Lubenow apresenta corretamente as consequências nefastas dessa ideia em seu livro Bones of Contention: “Se os inadaptados sobrevivessem indefinidamente, continuariam ‘contaminando’ os adaptados com seus genes menos evoluídos. O resultado seria que mais genes adaptados se diluiriam, cedendo lugar aos genes menos adaptados, impedindo o progresso da evolução” [5].

As consequências atrozes da mitologia darwinista podem ser observadas claramente na pseudociência eugenia [6]. A hipótese da eugenia era de que o banco genético da humanidade estava sendo corrompido por genes não adaptados, transmitido por pessoas inferiores. Michael Crichton observou que a teoria da eugenia postulava que “os melhores seres humanos não estavam se reproduzindo tão rapidamente quanto os inferiores: os estrangeiros, os imigrantes, os judeus, os degenerados, os incapacitados e os de mente débil. O plano era identificar os indivíduos de mente débil: os judeus, a maioria dos estrangeiros e os negros. Uma vez identificados, era necessário detê-los para que não mais se reproduzissem, isolando-os em instituições especiais ou esterilizando-os” [7].

A progressão lógica da evolução à eugenia não foi uma surpresa. O surpreendente, no entanto, foi a rapidez com que essa teoria foi aceita pelas elites intelectuais. Crichton menciona que essa teoria era aceita por pessoas como o presidente (dos EUA) Theodore Roosevelt até a fundadora de Planned Parenthood, Margareth Sanger. A eugenia obteve doações filantrópicas de fundações como Carniege e Rockefeller, e mantida por universidades de prestígio tais como Stanford, Harvard, Yale e Princeton. Várias leis foram aprovadas para tratar do “problema” apresentado pela eugenia em vários estados dos EUA, desde Nova York até a Califórnia. A eugenia foi apoiada pela National Academy of Sciences e pela American Medical Association. Aqueles que não aceitavam a eugenia eram considerados ignorantes e atrasados. Em contraste, os cientistas alemães que utilizaram as câmaras de gás para “erradicar” os de “mentes débeis” foram considerados como vanguardistas e progressistas, e receberam doações de instituições como a Fundação Rockefeller até o início da Segunda Guerra Mundial.

Foi somente quando a horrível realidade da eugenia alcançou seu apogeu nos campos de concentração nazistas que essa “ciência” mergulhou na escuridão do ostracismo.

A eugenia mergulhou nos porões sombrios da História. No entanto, as devastadoras consequências do dogma evolucionário que lhe deram origem continuam assombrando o mundo ainda hoje.

A CAMINHO DO JUÍZO FINAL

Em 1831, no mesmo ano em que Charles Darwin deixou a Inglaterra a bordo do HMS Beagle, nasceu nas Ilhas Britânicas outro dogma do século XIX com consequências profundas para a História da humanidade. Nesse ano, John Nelson Darby, um sacerdote desiludido, deixou a Igreja da Inglaterra e uniu-se a um grupo separatista chamado “Os Irmãos de Plymouth”.

Darby aceitou a perspectiva pré-milenista dos Irmãos, porém a modificou profundamente. Assim como Darwin, Darby era um inovador. De modo muito semelhante à maneira em que Darwin inseriu suas especulações nas informações científicas que coletou nas costas da Patagônia, Darby introduziu seus próprios conceitos e ideias na informação bíblica que encontrou na cidade de Plymouth.

Darby afirmava que Deus tem dois povos distintos com dois destinos distintos. Somente um desses povos, o povo judeu, sofreria a Tribulação. O outro, a igreja, seria tirada do mundo numa Vinda Secreta de Jesus, sete anos antes da Segunda Vinda. Esse postulado característico de Darby logo seria conhecido como escatologia dispensacionalista. Desde Darby, os dispensacionalistas sustentam que devido ao assassinato de seu Messias, os judeus entrarão num tempo de sofrimento sem precedentes, denominado “A Tribulação de Jacó” ou “A Grande Tribulação” [8]. Os primeiros dispensacionalistas declararam que os judeus estavam sob uma “culpa nacional”, por causa do “assassinato de Jesus Cristo” [9]. No livro Conflict of the Ages o autor dispensacionalista Arno C. Gaebelein descreveu os judeus como “infiéis” e “uma ameaça” [10]. O historiador Dr. Timothy Weber comenta que apesar de tais declarações o livro de Gaebelein recebeu críticas entusiasticamente favoráveis por parte de publicações dispensacionalistas como a revista Moody Monthly do Instituto Bíblico Moody e a revista Biblioteca Sacra do Seminário Teológico de Dallas [11].

Em seu livro On the Road to Armageddon (“A Caminho do Armagedom”), Weber denuncia vários líderes dispensacionalistas que promoviam teorias conspiratórias contra os judeus, todas sem fundamento. Alguns deles aclamaram o falso e nefasto livro The Protocols of the Elders of Zion (“Protocolos dos Sábios de Sião”) como uma prova positiva de que os judeus estavam por trás de uma conspiração global para destruir a civilização cristã [12]. James M. Gray, do Instituto Bíblico Moody, afirmou que esse livro era “um argumento contundente do dispensacionalismo” [13]. E Arno Gaebelein elogiou Serge Nilus, o primeiro publicador de Protocolos, dizendo que ele era “um crente na Palavra de Deus e na profecia, e um verdadeiro cristão” [14]. Mesmo depois que o óbvio saiu à luz e o livro foi desmascarado, Gaebelein não quis reconhecer que o livro Protocolos era uma fraude [15]. Charles C. Cook, do Instituto Bíblico de Los Angeles, também declarou que Protocolos era autêntico e descreveu de forma estereotipada as “características distintivas” dos judeus como “orgulho, arrogância exagerada, amor às coisas materiais, egocentrismo”. Na revista do instituto, King’s Business, Cook escreveu que a razão pela qual o povo judeu era persona non grata em muitos lugares e nas elites sociais era que “o judeu não regenerado geralmente tem uma personalidade muito pouco atraente” [16].

Tais declarações fizeram Harry A. Ironside declarar que era perturbador “ver que o livro Protocolos dos Sábios de Sião estava sendo usado não somente por gentios ímpios, mas também por alguns cristãos fundamentalistas que tentavam gerar o ódio e a suspeita contra o povo judeu em geral” [17]. Apesar dessa vergonha, os dispensacionalistas (inclusive Ironside) continuaram predizendo um futuro de Tribulação sem precedentes para os judeus.

Desde a sua perspectiva, era necessário levar os judeus de volta à Palestina, onde duas terças partes deles morreriam num Armagedom apocalíptico. Um líder dispensacionalista, Dr. John Walvoord, declarou: “Israel está destinado a passar por um tempo especial de sofrimento que eclipsará qualquer coisa que tenha ocorrido no passado”. Walvoord enfatiza essa declaração acrescentando que os judeus que retornassem à Palestina estariam “colocando a si próprios no centro de um redemoinho futurista que destruirá a maioria das pessoas que vivam na terra da Palestina” [18].

Hal Lindsey, mantendo o mau agouro de Walvoord, disse aos cristãos que pouco depois do “arrebatamento da igreja” uma “multidão incontável” de judeus será massacrada num banho de sangue que excederá os horrores do Holocausto. Lindsey predisse ainda que a brutalidade da Besta fará com que os carniceiros nazistas “pareçam meninas brincando num acampamento” [19].

Por sua vez, Tim LaHaye utiliza nomes bíblicos tais como “O dia da calamidade de Israel” para referir-se ao que ele chama de “a solução final” do Anticristo ao “problema judeu” [20]. Assim como Lindsey, LaHaye está convencido de que esse tempo de sofrimento nacional para os judeus “será pior que a inquisição espanhola do século XVI ou que o Holocausto promovido por Adolf Hitler no século XX” [21]. Segundo LaHaye, o tempo da Tribulação será um pesadelo real além da imaginação: “Todos os horrores de todas as guerras desde que o mundo surgiu, cada desastre natural da História e toda a sua crueldade inexplicável, todo o ódio e toda a injustiça do homem contra o seu próximo, tudo isso levado a um clímax completo e comprimido num período de sete anos. Mesmo que alguém pudesse imaginar tal horror, nada disso se compara ao terrível caos da Tribulação!” [22]

O CORAÇÃO DO DISPENSACIONALISMO

Da mesma forma que seu contemporâneo Charles Darwin, que escreveu sobre o dia em que embarcou no navio HMS Beagle: “Naquela época eu não duvidava da verdade literal de cada palavra da Bíblia”, J. N. Darby também se envergonhou de suas tradições religiosas e teológicas. Vários historiadores mencionam que o pré-milenismo do início do século XIX, contagiado pelas ideias de Darby, estava se transformando rapidamente em obscurantismo religioso típico de indivíduos “socialmente problemáticos, psicologicamente perturbados e teologicamente ignorantes” [24].

Naquela época muitos buscavam ingenuamente datar o terror e o caos da Tribulação e mesmo a Segunda Vinda mediante a correlação de eventos históricos e profecia bíblica. No extremo sectário, Joseph Smith, o fundador do mormonismo, começou a proclamar que sua geração estava vivendo na véspera da vinda de Cristo. Smith alegava que Deus lhe havia revelado que Jesus voltaria antes de que ele, Joseph Smith, chegasse aos 85 anos. Isso fez com que historiadores como Ernest Sandeen chamassem Joseph Smith e seus seguidores de “bêbados do milênio” [26].

Em outros círculos, o pregador batista William Miller (um dos fundadores da seita que viria a chamar-se “Igreja Adventista do Sétimo Dia”) também circulava a ideia de que sua geração viveria para ver o milênio. Em 1831 disse publicamente que Jesus Cristo voltaria no ano 1843. Disse que de acordo com Dn 8.14, o milênio começaria 2300 “dias”, isto é, anos, depois do decreto de Artaxerxes (457 a.C.). Nesse mesmo ano de 1831 Darby acrescentou seu toque único a esse jogo de datas, ao introduzir o conceito de uma “vinda secreta” sete anos antes da Segunda Vinda de Cristo. Desse modo, qualquer um poderia datar a Segunda Vinda de Cristo, depois da vinda secreta e do arrebatamento da igreja. Mais tarde, dispensacionalistas como LaHaye inventaram várias novas regras para o jogo de datas. LaHaye chegou a declarar que a geração que ouviu a declaração austríaca da Primeira Guerra Mundial de 1914 não morreria antes da Segunda Vinda de Cristo! [27]

No entanto, os próprios Irmãos de Plymouth, que receberam em primeira mão as novas ideias de Darby, as consideraram exegeticamente insustentáveis. E o sistema de interpretação de Darby, baseado na divisão da Bíblia, acabou dividindo a igreja dos Irmãos [28]. O erudito dos Irmãos, Samuel P. Tregelles, reconhecido pela sua análise histórica do texto grego do Novo Testamento, descartou as doutrinas escatológicas de Darby dizendo que eram tolices especulativas. Sua opinião era que o sofisma da vinda secreta de Cristo, sete anos antes da Segunda Vinda, teve sua origem numa declaração “profética” na congregação do Pr. Edward Irving, e não na exegese bíblica. Tregelles afirmou: “Foi dessa suposta ‘revelação’ que surgiu a moderna doutrina dispensacionalista. Não surgiu da Santa Escritura, mas de algo que foi apresentado falsamente como sendo o Espírito de Deus”. [29]

Darby, no entanto, afirmava que suas ideias e concepções não se baseavam numa declaração “profética” na igreja de Edward Irving em Londres, e nem das visões extáticas de uma escocesa chamada Margareth MacDonald. Ao contrário, afirmava tirar suas conclusões da premissa que a Bíblia conta a história de dois povos diferentes, para os quais Deus tinha dois planos completamente diferentes: Israel e a igreja. [30] Por esse motivo Darby ensinava que para ler a Bíblia corretamente, é preciso identificar quais passagens falam de Israel e quais falam da igreja. É o método de decidir antecipadamente quais passagens da Bíblia se aplicam a Israel e quais se aplicam à igreja, para só então interpretar essas passagens à luz dessa “divisão” da Palavra. [31]. B. W. Newton, “um dos mais antigos e reconhecidos dentre os Irmãos”, considerava, no entanto, que o método de Darby era uma “tolice fantasiosa”. [32]

C. I. Scofield (autor das notas da Bíblia de Estudo Scofield), que sucedeu a Darby como a maior autoridade do dispensacionalismo para a interpretação da Bíblia, publicou em 1888 seu livro Right Dividing the Word of God (“A Correta Divisão da Palavra de Deus”), que se tornou a mais ampla defesa da teoria de Darby a respeito dos “dois povos de Deus”. [33]

Em nossa geração, Tim LaHaye (co-autor da série Deixados para Trás) é o escritor que se encontra à frente do dispensacionalismo, defendendo e propagando o dogma dos “dois povos de Deus” de Darby. Por meio de suas obras de ficção e não-ficção, do rádio e da televisão, de igrejas e seminários, ele promove e fortalece as teses dispensacionalistas. Em suas próprias palavras: “A distinção entre Israel e a Igreja é importante porque a distinção atual da Igreja no plano de Deus é a base teológica do arrebatamento pré-tribulacional”. [34]

Mesmo que a habilidade de LaHaye de comercializar o dogma de Darby seja impressionante, em última instância devemos nos perguntar se é bíblica. De fato, devemos descobrir se os dispensacionalistas, a começar com Darby, têm feito uma exegese correta da Palavra ou se a dividiram incorretamente, baseados em uma eisegese doentia. Durante 1900 anos de história eclesiástica ninguém (inclusive grandes nomes como Agostinho, Lutero, Calvino, Knox, Zwinglio e Wesley) descobriu na Escritura o conceito de “arrebatamento pré-tribulacionista da igreja” que LaHaye afirma ser “ensinado claramente” na Bíblia. Eram todos eles – incluindo todos os cristãos em 1900 anos de Igreja – cegos biblicamente??? Ou será que LaHaye e seus seguidores são os verdadeiramente cegos?

Isto não é um simples debate. As ideias trazem consequências. E as consequências do dogma de Darby se fazem presentes no mundo contemporâneo. Da mesma forma como as ideias subjetivas de Darwin na ciência produziram o pesadelo da eugenia, a posição subjetiva de Darby sobre as Escrituras também produz um pesadelo inexorável. Se LaHaye tivesse razão, a Tribulação seria uma realidade terrível para o povo judeu.

Em gerações anteriores, os dispensacionalistas contentavam-se em ser simplesmente espectadores de eventos que ocorriam ao seu redor. Os dispensacionalistas atuais, no entanto, querem ser protagonistas dos tempos que precederão os horrores do Armagedom. Timothy Weber observa: “Durante os primeiros cem anos, os dispensacionalistas foram observadores dos eventos. Mas isso mudou desde que Israel reclamou seu lugar na Palestina. Pela primeira vez, os dispensacionalistas creram que era necessário tomarem providencias para assegurar que o jogo terminaria de acordo com seu roteiro divino”. [35]

O único modo de deter essa marcha evangélica rumo ao Armagedom é obter uma iluminação fiel das Escrituras. Em outras palavras, os cristãos devem buscar obter uma exegese fiel para compreender o que o Espírito realmente ensina nas Escrituras, em vez de colocar suas próprias predileções no texto bíblico. Insights momentâneos de inspiração ou intuição são maus substitutos para o estudo criterioso das Escrituras. Devemos orar para que o Espírito Santo nos dê mentes esclarecidas e corações abertos para adentrarmos na Escritura. Isso significa ler a Bíblia pelo seu valor real. E acima de tudo significa rejeitarmos uma eisegese estéril e prosseguir sem desvios rumo a uma exegese fiel.

DOIS POVOS DIFERENTES?

Começaremos pelo coração do dogma dispensacionalista, que afirma que Deus tem dois povos diferentes, sendo que um deles será arrebatado antes de Deus continuar seu plano em relação ao outro. As Escrituras revelam que Deus tem dois povos distintos? Ou revela que há um só povo escolhido, que forma uma comunidade pactual?

Em vez de afirmar que Deus tem dois povos diferentes, a Escritura revela, do princípio ao fim, que somente há um povo escolhido, comprado “de toda raça, língua, povo e nação” (Ap 5.9). Como Paulo afirma: “os gentios são co-herdeiros com Israel, membros do mesmo corpo, e co-participantes da promessa em Cristo Jesus” (Ef 3.6).

Além disso, a mesma terminologia utilizada para descrever o povo de Israel no Antigo Testamento é utilizada para descrever a Igreja no Novo Testamento. Pedro chama esse único povo escolhido de “geração eleita, sacerdócio real, nação santa, povo exclusivo de Deus” (1Pe 2.9). Esse é o povo escolhido de Deus, a geração eleita, não em virtude de uma descendência física de Abraão, mas em virtude de uma relação genuína com “a pedra viva – rejeitada pelos homens, mas escolhida por Deus e preciosa para ele” (1Pe 2.4). A verdadeira Igreja é o verdadeiro Israel, e o verdadeiro Israel é a verdadeira Igreja.

E mais: assim como o Antigo e o Novo Testamento revelam um só povo escolhido, também revelam que esse povo escolhido forma uma só comunidade da aliança. Ainda que essa única comunidade da aliança encontra-se fisicamente ligada à semente de Abraão, cujo número seria como o das “estrelas” no céu (Gn 15.5) ou como o “pó da terra” (Gn 13.16) [36], ela fundamenta-se espiritualmente numa descendência singular, única – ou seja, num descendente individual. Paulo explica em sua epístola aos Gálatas: “as promessas foram feitas a Abraão e ao seu descendente. A Escritura não diz: ‘E aos seus descendentes’, como se falando de muitos, mas: ‘Ao seu descendente’, dando a entender que se trata de um só, isto é, Cristo” (Gl 3.16). Paulo continua explicando: “E se vocês são de Cristo, são descendência de Abraão e herdeiros segundo a promessa” (Gl 3.29).

Afirmar que Israel deve “cumprir seu destino nacional como uma entidade separada depois do arrebatamento e da Tribulação durante o milênio” [37] é uma afronta ao único descendente no qual todas as promessas feitas a Abraão foram cumpridas. Como disse Keith Mathison: “As promessas feitas aos israelitas, literalmente falando, foram cumpridas por um israelita literal, Jesus, o Messias. Ele é o descendente (‘a semente’) de Abraão”. [38] O remanescente fiel de Israel do Antigo Testamento e do Cristianismo do Novo Testamento unem-se numa descendência genuína de Abraão, tornando-se seus herdeiros segundo a promessa. Esse remanescente não foi escolhido pela religião ou pela raça, mas pela sua relação com o Redentor ressurreto. Revestidos de Cristo, homens, mulheres, “de toda tribo, língua e nação” [39], formam uma única comunidade da aliança.

Finalmente, esse único povo escolhido por Deus, que forma a comunidade da aliança, é belamente representado em Romanos como uma oliveira cultivada (Rm 11.11-24). A árvore simboliza o Israel nacional, os ramos simbolizam os que creem, e suas raízes simbolizam Jesus, “a Raiz e o Descendente de Davi” (Ap 22.16). Os ramos naturais que foram cortados representam os judeus que rejeitaram Jesus. Os ramos de oliveira brava que foram enxertados representam os gentios que receberam Jesus. Por isso, Paulo diz: “Pois nem todos os descendentes de Israel são Israel. Nem por serem descendentes de Abraão passaram todos a ser filhos de Abraão. Ao contrário: ‘Por meio de Isaque a sua descendência será considerada’. Noutras palavras, não são os filhos naturais que são filhos de Deus, mas os filhos da promessa é que são considerados descendência de Abraão” (Rm 9.6-8).

Jesus é o único Descendente genuíno de Abraão. E todos os que estão revestidos de Cristo formam uma comunidade da aliança escolhida e unida em Cristo. Portanto, “não há judeu nem grego [nem árabe nem chinês, nem norteamericano nem africano, nem australiano nem brasileiro, etc], nem escravo nem livre, nem homem nem mulher, pois todos vocês são um em Cristo Jesus. E se vocês são de Cristo, são descendência de Abraão e herdeiros segundo a promessa” (Gl 3.28,29). Estas palavras de Paulo são o epitáfio no túmulo do dispensacionalismo!

Portanto, a Bíblia simplesmente contradiz o ensino dispensacionalista de que Deus possui dois povos distintos. E se Deus sempre teve um único povo, o dogma dispensacionalista é esmagado pelo peso das Escrituras.

DOIS PLANOS DIFERENTES?

Assim como existe somente um povo escolhido que forma uma única comunidade da aliança, existe somente um plano divino, caracterizado em Ef 2.15 como “a nova humanidade” criada por Deus. O argumento dispensacionalista de que Deus propôs um plano originalmente para Israel e que depois iniciou outro plano, entre parênteses, para a Igreja, plano esse que terminaria abruptamente no “arrebatamento”, carece de base bíblica e esquece do objetivo real do propósito de Deus.

Em primeiro lugar, ao contrário do que diz o argumento dispensacionalista de um plano original de Deus para Israel, a Escritura revela uma progressão do único plano divino para estabelecer por meio de Israel uma nova humanidade (Ef 2.15) numa nova Pátria (Rm 4.13; Hb 12.18,22). Esse plano progressivo começa no Paraíso perdido e termina no Paraíso restaurado.

A imagem bíblica é profunda e incisiva. Adão entra numa vida de pecado e é separado do Paraíso. É relegado ao descontentamento e a vagar separado da comunhão com o Criador. O mesmo capítulo que faz referência à Queda também registra o plano divino para a restauração da comunhão (Gn 3.15). O plano de Deus é definido como a promessa de Deus de fazer por meio de Abraão que “todos os povos da terra” sejam “abençoados” (Gn 12.3). O chamado de Abraão, portanto, constitui o antídoto divino para a Queda.

A promessa de Deus de que os filhos de Abraão herdariam a Terra Prometida era um passo preliminar no plano progressivo de Deus pelo qual Abraão e seus descendentes herdariam “uma pátria melhor, isto é, a pátria celestial” (Hb 11.16). O plano é melhor visualizado quando observamos Moisés dirigindo os descendentes de Abraão e tirando-os de seus 400 anos de escravidão no Egito. Depois peregrinaram por 40 anos no deserto. Deus habitou em meio ao povo e o preparou para a Terra Prometida. Do mesmo modo que Abraão, Moisés, no entanto, somente viu a promessa de longe.

O plano de Deus assume uma realidade concreta quando Josué dirige a conquista da Palestina. As peregrinações de Adão, Abraão e Moisés terminam quando Josué estabelece o povo na Terra Prometida (Js 21.43). Como diz Josué: “Vocês sabem, lá no fundo do coração e da alma, que nenhuma das boas promessas que o SENHOR, o seu Deus, lhes fez deixou de cumprir-se. Todas se cumpriram; nenhuma delas falhou” (Js 23.14).

Porém, assim como Adão caíra no Paraíso, os descendentes de Abraão cairiam na Palestina. Portanto, as palavras de Josué em sua despedida anunciaram uma trágica realidade: “Mas, assim como cada uma das boas promessas do SENHOR, o seu Deus, se cumpriu, também o SENHOR fará cumprir-se em vocês todo o mal com que os ameaçou, até eliminá-los desta boa terra que lhes deu. Se violarem a aliança que o SENHOR, o seu Deus, lhes ordenou, e passarem a cultuar outros deuses e a inclinar-se diante deles, a ira do SENHOR se acenderá contra vocês, e vocês logo desaparecerão da boa terra que ele lhes deu” (Js 23.15,16).

As “boas promessas” de Deus alcançaram seu apogeu durante o reinado de Salomão, cujo governo cobria a terra desde o rio Eufrates ao norte até o rio do Egito ao sul (1Rs 4.20,21; compare com Gn 15.18), mas mesmo assim a terra vomitou os israelitas do mesmo modo como havia feito com os cananeus antes deles. Durante os exílios assírio e babilônio, as peregrinações experimentadas por Adão foram também experimentadas pelos descendentes de Abraão.

No entanto, as promessas de Deus a Abraão não seriam anuladas. Palestina era somente uma fase preliminar da promessa patriarcal. Abraão não seria somente pai de uma nação, mas “pai de muitas nações” (Gn 17.5). Abraão seria “herdeiro do mundo” (Rm 4.13). O alvo da promessa não era a Palestina, mas o Paraíso restaurado.

Deus também prometeu a Abraão uma semente real. Josué dirigiu o povo de Israel à Terra da Promessa. Um dia Jesus dirigirá Seu povo ao Paraíso restaurado. Lá o povo de Deus entrará em seu descanso. Desde a rebelião de Adão até a semente real de Abraão, as Escrituras revelam um único plano de Deus para a humanidade. Em vez de uma sobreposição de dois planos divinos causada pela rejeição de Jesus pelos judeus, as Escrituras revelam o cumprimento do plano de Deus na crucificação. Porque somente mediante a fé na morte e na ressurreição de Cristo é que a única comunidade da aliança poderá encontrar o descanso de suas peregrinações (Hb 4.1-11). Em Cristo, o último Adão (1Co 15.45), as promessas de Deus encontram seu pleno cumprimento. Paulo coloca nestes termos: “E, se vocês são de Cristo, são descendência de Abraão e herdeiros segundo a promessa” (Gl 3.29).

Assim como não existe uma “sobreposição” de dois planos divinos, igualmente não existe um “parêntese” nos propósitos de Deus. O argumento dispensacionalista de que existe um parêntese no plano de Deus para Israel, e que esse parêntese é o plano de Deus para a Igreja, nada mais é do que o produto de uma leitura estranha e fantasiosa da Bíblia. O enfoque principal desse dogma dispensacionalista encontra-se numa interpretação incorreta do livro de Daniel. Tim LaHaye costuma dizer: “É impossível compreender a profecia da Bíblia sem compreender o livro de Daniel. Muitas informações a respeito de assuntos importantes e a sequência correta dos últimos dias encontram-se em Daniel” [40]. Algo que os dispensacionalistas fazem questão de ressaltar, por exemplo, são as “setenta semanas” de Daniel (Dn 9.24-27).

De fato, LaHaye criou uma série de pressupostos a respeito das setenta semanas de Daniel. Ele afirma simplesmente que existe um lapso de 2000 anos (!) entre a semana 69 e a semana 70. E que esse lapso é o “parêntese” no qual está inserido o plano de Deus para a Igreja [41]. Finalmente, supõe que a Igreja era “um mistério oculto no Antigo Testamento (Rm 16.25,26; Ef 3.2-10; Cl 1.25-27)” e que “Israel, e não a Igreja, cumprirá seu destino nacional como uma entidade separada depois do arrebatamento e da Tribulação e durante o milênio” [42].

Deveria ser evidente a todos que essas invenções não são produto de uma leitura fiel do texto bíblico, mas sim o resultado de uma imaginação fértil! A própria ideia de que os profetas do Antigo Testamento não viram “o vale da Igreja” [43], que a Igreja “não existia antes de seu nascimento em Pentecostes” e que “terá um fim abrupto no arrebatamento” [44], é completamente falsa. Os profetas do Antigo Testamento não somente viram o “vale da Igreja” – eles anunciaram a Igreja! Pedro, falando no Pentecoste, disse: “De fato, todos os profetas, de Samuel em diante, um por um, falaram e predisseram estes dias” (At 3.24). O que os profetas do Antigo Testamento não viram nem anunciaram foi que a Igreja teria um “fim abrupto no arrebatamento”! Em outras palavras, a ideia de que a Igreja é um mero “parêntese” nos planos de Deus não tem o menor fundamento bíblico.

Finalmente, assim como não há uma sobreposição nem um parêntese no plano de Deus, também não há nenhum arrebatamento pré-tribulacionista.. Durante 1900 anos, a ideia de um arrebatamento pré-tribulacionista foi completamente desconhecida pela Igreja. Antes de Darby, os Irmãos de Plymouth acreditavam que o arrebatamento e a Segunda Vinda de Cristo eram eventos simultâneos. A invenção inovadora de Darby provocou o nascimento da ideia do arrebatamento da Igreja antes da Tribulação. Timothy Weber explica: “Antes de Darby, todos os pré-milenistas, inclusive os futuristas, criam que o arrebatamento aconteceria no fim da Tribulação, na Segunda Vinda de Cristo. Mas Darby viu o arrebatamento e a Segunda Vinda como dois acontecimentos separados. No arrebatamento, Cristo viria para seus santos, e na Segunda Vinda ele viria com os seus santos. Entre esses dois eventos aconteceria a Tribulação” [45].

Antes de Darby essa ideia nunca havia sido conhecida no corpo de Cristo. Harry Ironside, um dispensacionalista, desafiava aos que não aceitavam essa posição: “Procurem, assim como eu procurei, as declarações dos chamados Pais da Igreja, nos períodos anteriores e posteriores a Nicéia; os comentários teológicos dos eruditos; os escritores católico romanos de todas as correntes de pensamento; a literatura da Reforma; os sermões dos puritanos; as obras teológicas da atualidade, e perceberão a notável ausência desse mistério” [46]. Ironside, a quem LaHaye considera como um de seus “heróis”, costumava, contraditoriamente, também dizer: “Quando você ouvir algo novo, examine-o cuidadosamente, porque pode ser um erro” [47].

LaHaye seguiu o conselho de seu “herói” e esforçou-se para tentar demonstrar que o arrebatamento pré-tribulacional da Igreja não é algo novo. Como evidência, menciona “a emocionante descoberta de uma declaração contida num sermão apocalíptico do século IV, de Pseudo-Efraim”, apresentada por Grant Jeffrey [48]. Jeffrey disse que havia levado “uma década” procurando, mas que valeu a pena: “O texto efraimita revela uma declaração clara sobre o retorno pré-tribulacionista de Cristo para levar seus santos ao céu a fim de que escapem da Tribulação” [49].

Assim como LaHaye, o filósofo e teólogo Norman Geisler ficou emocionado com a descoberta de Grant Jeffrey. Para fortalecer sua posição dispensacionalista ele menciona uma declaração de Jeffrey que diz que “o manuscrito efraimita revela que a perspectiva pré-tribulacionista existia desde o século III” [50]. Sua opinião é de que os primeiros Pais da igreja primitiva, “tais como Efraim da Síria, eram abertamente pré-tribulacionistas” [51]. Portanto, assim como LaHaye, Geisler não aceita o argumento de que o conceito de arrebatamento pré-tribulacionista teve origem no século XIX. Segundo Geisler, quem pensa desse modo está cometendo um erro [52]. As declarações de Geisler a esse respeito circulam amplamente como demonstração de autoridade final. Não obstante, seguindo a orientação do Dr. Ironside, seria bom “examinar cuidadosamente” o sermão efraimita para ver se depois de uma década de buscas, os dispensacionalistas realmente conseguiram encontrar um precedente histórico do arrebatamento pré-tribulacionista anterior ao século XIX.

Para começar, é instrutivo perceber que enquanto Norman Geisler atribui o sermão em questão a “Efraim da Síria”, no “século III”, Tim LaHaye acredita que esse sermão pode ser de autoria de “um certo Pseudo-Efraim” que teria escrito “talvez entre os anos 565 e 627” [53]. Sem importar quem de fato o escreveu e quando, podemos dizer com certeza absoluta que nenhuma tradição de arrebatamento pré-tribulacionista se originou nele ou se desenvolveu a partir dele. Ainda mais importante, como sabem os historiadores e os teólogos sérios, uma simples pesquisa nos escritos de Efraim revela que ele era pós-tribulacionista, e não pré-tribulacionista. Não somente isto, mas o próprio sermão apresentado pelos dispensacionalistas como “evidência” de suas ideias, utiliza claramente a tradição do arrebatamento pós-tribulacionista do verdadeiro Efraim.

Na verdade, é difícil imaginar que alguém, lendo esse sermão em seu contexto, consiga chegar à conclusão de que Efraim (ou Pseudo-Efraim) estivesse falando de um arrebatamento secreto antes da Tribulação, pois nesse mesmo sermão, o autor enfatiza que os cristãos deverão passar pela Grande Tribulação. De fato, o sermão menciona a necessidade de uma regeneração antes da Tribulação, e não de um arrebatamento antes da Tribulação [54].

Ainda que a “emocionante descoberta” do sermão apocalíptico do século IV de Efraim (ou Pseudo-Efraim?) tenha seu valor como uma peça de retórica, ainda assim não é lá muito relevante para a teologia cristã. O problema não está na autoria do documento, mas na exegese correta que é feita do mesmo. No entanto, mais do que a exegese correta desse documento, devemos preocupar-nos com a exegese correta dos textos bíblicos. Podemos começar com a Primeira Epístola de Paulo aos Tessalonicenses, numa passagem muito usada pelos dispensacionalistas para “comprovar” a teoria do arrebatamento pré-tribulacionista de Darby. LaHaye afirma: “Um dos eventos proféticos mais convincentes da Bíblia é o arrebatamento da Igreja. Ele é ensinado claramente em 1Ts 4.13-18, trecho no qual o apóstolo Paulo nos dá os melhores detalhes disponíveis” [55].

Do mesmo modo que a exegese do texto efraimita, uma exegese de 1Ts 4 mostra que Paulo não está pensando num arrebatamento pré-tribulacionista. A mensagem de Paulo refere-se à gloriosa esperança da ressurreição, e não num novo ensino a respeito de uma vinda secreta de Cristo, na qual Ele arrebatará a Igreja. Como todo erudito bíblico sabe, o ensino de Paulo em 1Ts 4 é paralelo ao seu ensino em 1Co 15. Ambos textos tratam da bendita esperança de que o fim ocorrerá quando Cristo voltar. Ele entregará o Reino a Deus Pai depois de ter destruído todo domínio, autoridade e poder. Quando soe a trombeta, estaremos com o Senhor para sempre [56].

O texto não diz em nenhum lugar que quando Cristo vier do céu “com a voz do arcanjo e o ressoar da trombeta de Deus” (1Ts 4.16), Ele se deterá no meio do caminho, mudará de direção e nos levará consigo às mansões celestiais, enquanto a terra mergulha no caos. Os tessalonicenses também não entenderam desse modo. O Dr. N. T. Wright observa: “Paulo apresenta a imagem de um imperador que está visitando uma província. Os cidadãos saem ao seu encontro em campo aberto e o escoltam até a cidade. A imagem de Paulo do povo ‘se reunindo com o Senhor nos ares’ deve ser lida assumindo-se que o povo imediatamente voltará com o Senhor para um mundo novo” [57].

Além disso, existe pouca justificativa para supor que a ideia do arrebatamento pré-tribulacionista se baseia numa “correspondência” entre o ensino de Cristo em Jo 14.1-3 e o ensino de Paulo em 1Ts 4.13-18. Ou seja, LaHaye erra mais uma vez ao utilizar as palavras do Salvador (“Não se perturbe o coração de vocês. Creiam em Deus; creiam também em mim. Na casa de meu Pai há muitos aposentos; se não fosse assim, eu lhes teria dito. Vou preparar-lhes lugar. E se eu for e lhes preparar lugar, voltarei e os levarei para mim, para que vocês estejam onde eu estiver”) pretendendo que elas sejam o primeiro ensino sobre o “arrebatamento pré-tribulacionista” nas Escrituras [58].

Ver desse modo toda uma cosmovisão em Jo 14 e 1Ts 4 segundo a qual duas terças partes do povo judeu serão erradicadas num massacre enquanto o povo de Jesus descansa despreocupadamente em mansões celestiais é, para dizer o mínimo, uma imposição preocupante de uma eisegese insana, que tem contaminado muitíssimos evangélicos. A imagem do Paraíso de Paulo ou a metáfora das mansões celestiais de Cristo não foram apresentadas para significar um refúgio temporário no céu enquanto a terra experimenta um holocausto de sete anos. Antes, representam a imagem gloriosa de “um novo céu e uma nova terra” nos quais “não haverá mais morte, nem tristeza, nem choro, nem dor, pois a antiga ordem já passou” (Ap 21.4).

DUAS VINDAS DIFERENTES?

Assim como a ideia de que Deus tem dois povos diferentes e dois planos diferentes para os mesmos, o conceito de que há duas fases diferentes na Segunda Vinda de Cristo também é produto de uma imaginação fértil. De fato, uma exegese saudável das Escrituras não revela nenhuma vinda secreta de Cristo seguida por uma Tribulação de sete anos, nem uma segunda oportunidade para pecar e para ser salvos depois da Segunda Vinda de Cristo. Ao contrário, quando Cristo regressar, o Reino que havia sido inaugurado em sua primeira vinda será consumado em “novos céus e nova terra, onde habita a justiça” (2Pe 3.13).

Em primeiro lugar, a própria ideia de uma vinda secreta não tem apoio bíblico. LaHaye é forçado a reconhecer: “Não existe um só versículo que declare especificamente que “Cristo virá [secretamente] antes da Tribulação” para arrebatar a sua Igreja [59]. Também não existe nenhum grupo de versículos que possa ser utilizado para expressar uma vinda secreta antes da Segunda Vinda de Cristo. A ideia de uma vinda secreta, como admitem os proponentes do arrebatamento pré-tribulacionista, é uma “dedução a partir do conjunto de um sistema teológico” [60].

Apesar disso LaHaye consegue chegar à conclusão de que haverá uma vinda secreta durante a qual somente a Igreja será arrebatada. Em vez disso, nosso Senhor declara: “Está chegando a hora em que todos os que estiverem nos túmulos ouvirão a sua voz e sairão; os que fizeram o bem ressuscitarão para a vida, e os que fizeram o mal ressuscitarão para serem condenados” (Jo 5.28,29; compare com Mt 25.31-46; Lc 12.35-48). A teologia de LaHaye, portanto, encontra-se em franca oposição ao ensino de Jesus. O sentido literal e claro das palavras de nosso Senhor é que no futuro ambos, justos e injustos, ressuscitarão e serão julgados ao mesmo tempo. A ideia de uma vinda secreta do Senhor é uma imposição ao texto.

Mesmo que façamos uso das pressuposições dispensacionalistas, o sentido literal da parábola do joio indica que os ímpios serão julgados antes de reunir o trigo, e não depois (Mt 13.24-30). Da mesma forma, no discurso do Monte das Oliveiras, o injusto será “levado” enquanto o justo será “deixado”, e não ao contrário, como querem os dispensacionalistas (Mt 24.36-41). Durante seus dias na Terra, nosso Senhor pediu fervorosamente ao Pai Celestial para não tirar a Igreja do mundo, mas para protegê-la do Maligno enquanto estiver no mundo (Jo 17.15) [61].

E mais: procure o quanto queira, e jamais encontrará uma Tribulação de sete anos no texto bíblico. Realmente, os sete anos futuros de Tribulação aclamados por Tim LaHaye chamam a atenção pela sua ausência nas Escrituras. LaHaye diz que “quase não há dúvida acerca de quando essa Tribulação acontecerá e quanto tempo durará” [62]. No entanto, ele não apresenta evidências a respeito. Simplesmente apela vagamente às profecias de Daniel e Apocalipse sem apresentar nenhum texto de apoio. Em vez disso, ele simplesmente diz que o Apocalipse de João divide a Grande Tribulação em “dois períodos de três anos e meio cada um, ou seja, 1260 dias, dando um total de sete anos. Durante os primeiros três anos e meio mais da metade da população mundial morrerá. Durante a segunda metade, as condições irão piorar ainda mais depois de Satanás ser expulso do céu e tomar posse do corpo do Anticristo, exigindo que o mundo o adore” [64].

É uma temeridade tirar, acrescentar ou dividir a “revelação de Jesus Cristo, que Deus lhe deu para mostrar aos seus servos o que em breve há de acontecer” (Ap 1.1). Em nenhum lugar a revelação de Jesus divide a Tribulação em “dois períodos de três anos e meio cada um, ou seja, 1260 dias”. Historicamente, houve um período de três anos e meio de tribulação durante a guerra judaica que começou na primavera de 67 d.C. e terminou no outono de 70 d.C., no entanto, não existe nenhum precedente bíblico para duplicar esse período de tempo ou para transferi-lo para o século XXI. Além disso, qualquer pessoa inteligente reconhece o significado do simbolismo bíblico do número sete, e em consequência, de sua metade. [65]

LaHaye faria bem em reconhecer, igualmente, que quando Jesus falava de uma tribulação “como nunca houve desde o princípio do mundo até agora, nem jamais haverá” (Mt 24.21), Ele estava usando uma hipérbole profética [66]. Se esse e os diversos outros gêneros literários não são compreendidos, as Escrituras naufragam num mar de contradições. Pior ainda, aceitar as interpretações de LaHaye implica em negar a Divindade de Cristo. Daniel disse: “Debaixo de todo o céu jamais se fez algo como o que foi a Jerusalém” (Dn 9.12). Da mesma forma Deus disse: “Por causa de todos os seus ídolos detestáveis, farei com você o que nunca fiz nem jamais voltarei a fazer” (Ez 5.9; compare com Ex 11.6; Jl 2.2). Se Israel enfrentou essa grande tribulação em seu passado, Cristo teria cometido um grave erro ao predizer uma tribulação maior ainda para o futuro, maior ainda que a catástrofe do Dilúvio.

Apesar da evidência bíblica, LaHaye insiste numa tribulação de sete anos no século XXI, descrevendo-a como o tempo de angústia de Jacó e o tempo da tribulação para os judeus [67]. O que LaHaye não revela é o fato fundamental de que a referência de Jeremias a um “tempo de angústia para Jacó” (Jr 30.7) ou a referência de Jesus a um período de “grande tribulação, como nunca houve desde o princípio do mundo até agora, nem jamais haverá” (Mt 24.21), não se referem a um holocausto no século XXI, causado pela rejeição dos judeus a Yahweh no século VI a.C. ou pela rejeição dos judeus a Jesus no século I d.C. Ambas referências referem-se, inquestionavelmente, a tempos passados nos quais o templo de Jerusalém foi destruído.

Jeremias afirma claramente que a “angústia de Jacó” acontece durante o exílio babilônico, aproximadamente seis séculos antes de Jesus nascer. E Jesus coloca enfaticamente o tempo da “grande tribulação” dos judeus no século I [referindo-se ao cerco e destruição do templo e de Jerusalém no ano 70 d.C.]. Assim como Ezequiel utiliza a linguagem hiperbólica para comunicar que os horrores da destruição do templo pelos babilônios não seriam igualados jamais, Jesus utiliza a hipérbole profética para comunicar que os horrores da destruição do templo pelos romanos não teriam paralelo.

Insistir em declarações extremamente literais inevitavelmente leva à conclusão de que Bíblia contradiz a si mesma. Se a destruição dos dias de Jeremias jamais seria igualada, como poderia, então, ser superada pela destruição profetizada por Jesus? Levar a linguagem hiperbólica a um entendimento estritamente literal seria supor que Jeremias equivocou-se, ou que Jesus equivocou-se. É colocar a linguagem figurada da Bíblia numa camisa-de-força. As consequências para o Cristianismo e para o cânon bíblico são catastróficas. Em suma, não há nenhuma justificação bíblica para uma preocupação fatalista a respeito de uma tribulação futura de sete anos.

Finalmente, assim como não existe nenhuma base bíblica para uma vinda secreta e uma tribulação de sete anos, também não há nenhuma base bíblica para crer numa segunda oportunidade de salvação depois da Segunda Vinda de Cristo. Jesus Cristo é muito claro: “todos” os que o Pai lhe deu serão ressuscitados no último dia (Jo 6.37-40). Em contraste direto com a revelação bíblica, LaHaye apresenta uma interpretação fictícia na qual todas as pessoas poderão ser salvas depois da “vinda secreta” e da Segunda Vinda de Cristo. As implicações de sua teologia são igualmente ousadas e blasfemas. Se Cristo e a Igreja unem-se nas “bodas do Cordeiro” entre a vinda secreta e a Segunda Vinda, a “noiva de Cristo” deve continuar “crescendo para incluir outras pessoas redimidas nos dias do Reino” [68]. Por outro lado, se Deus tem uma noiva (a Igreja) e uma esposa (Israel), os que são salvos depois da Segunda Vinda devem ser “acrescentados à esposa de Deus” em vez de à noiva de Cristo. Esse cenário é inimaginável. É absurdo supor que a noiva com quem Cristo casou durante a Tribulação está incompleta e portanto, imperfeita. Além disso, é pura blasfêmia afirmar que o Deus único, revelado em três Pessoas, tenha uma noiva e uma esposa [69].

Paulo observa que a libertação da criação ocorre juntamente com a redenção de nossos corpos (Rm 8.18-25). Portanto, podemos estar certos de que ninguém será salvo numa era mitológica que aconteceria depois da Segunda Vinda de Cristo. A ideia de que nossos corpos serão redimidos no arrebatamento e que a Terra será libertada de sua escravidão somente para deteriorar-se aproximadamente 1007 anos depois não tem precedente bíblico. Na Segunda Vinda, a noiva de Cristo, a Igreja [formada por judeus e gentios], estará completa. Ninguém mais poderá ser salvo. Porque o fim terá chegado.

O DOGMA DISPENSACIONALISTA: FICÇÃO E HERESIA

Mesmo quando LaHaye afirma com insistência que o arrebatamento é “um dos eventos proféticos mais convincentes da Bíblia” e que “em 1Tessalonicenses Paulo nos dá os melhores detalhes disponíveis”, a verdade é que o arrebatamento é o fruto maduro de uma fértil imaginação, e não o fruto de uma fiel interpretação da Bíblia.

Os “detalhes” que LaHaye menciona surgem de sua série fictícia Deixados Para Trás, e não da Bíblia Sagrada. Somente nessa série [que rendeu milhões de dólares, diga-se de passagem] é que Jesus volta secreta e silenciosamente para arrebatar a Igreja, sete anos antes da Segunda Vinda, e não em 1Tessalonicenses. Na ficção de LaHaye, depois de reunir-se com seus santos em algum lugar nos ares, Jesus muda de direção e leva a Igreja para as mansões celestiais, para as bodas do Cordeiro. LaHaye diz: “A Igreja (a noiva de Cristo) e nosso Senhor Jesus se casarão oficialmente no Céu” [70].

Portanto, “enquanto a Terra sofre as angústias da Tribulação, a Igreja desfrutará de uma boda celestial e de uma grande festa” [71]. Os convidados dessa festa são “os santos fiéis do Antigo Testamento” e “aqueles que morreram ou foram martirizados durante a Tribulação” [72]. LaHaye diz que um dos convidados será João Batista [73]. Segundo LaHaye, mesmo tendo sido decapitado na Terra e ainda sem um corpo glorificado, João Batista participa da festa no Céu juntamente com o Noivo e a “noiva” – que sim, já têm seus corpos glorificados.

Enquanto isso, ainda segundo o script de LaHaye, na Terra os judeus que se prostituem com a Besta experimentam um holocausto de proporções mitológicas. Dois terços ficam reduzidos a cadáveres cobertos de sangue. Junto com o massacre, acontece uma “colheita de almas”, em parte devido a um vídeo feito pelo já arrebatado T. D. Jakes [74] e em parte devido à grande habilidade evangelística de 144.000 virgens judeus (!) que “não se contaminaram com mulheres”.

Enquanto a festa prossegue no Céu, o mundo sofre “um terremoto tão forte que cada montanha e cada ilha são movidas de seus lugares” [75]. O Sol “escurece e a lua fica vermelha como sangue”. Enquanto isso, “meteoritos” e “grandes nuvens de origem desconhecida” inundam o planeta [76].

E isso é só o começo do “Apocalipse segundo LaHaye”. Os juízos e as trombetas dos primeiros 21 meses da Tribulação representam apenas a obra do Anticristo. Depois disso, a ira do Todo-Poderoso é derramada sobre a face da Terra. “No primeiro período da Tribulação a Terra conheceu a ira do Anticristo; agora começará a sentir a ira do Todo-Poderoso” [77]. O castigo inclui granizo, chuva de fogo com sangue, e “um desastre ecológico sem paralelo na história da humanidade” [78]. O terremoto que moveu as montanhas e as ilhas de seus lugares e os meteoros que golpearam a Terra são insignificantes comparados a esse desastre ecológico. Nem mesmo o Dilúvio de Noé, que matou todo o planeta com exceção de oito pessoas, se aproxima ao massacre causado por esta catástrofe.

Pouco depois, outro grande meteoro cai na Terra e faz com que uma terça parte do mar se transforme em sangue. Uma terça parte dos rios e lagos também se torna amarga e venenosa. Logo o Todo-Poderoso reduz “reduz a quantidade de energia radiante que chega à Terra, vinda do Sol e das estrelas, a uma terça parte” [79] e libera gafanhotos com “um poder semelhante a escorpiões para que atormentem os descrentes” [80]. Depois dos gafanhotos, aparece um exército de 200 milhões de homens a cavalo, ou como prefere dizer LaHaye: demônios a cavalo [81]. (LaHaye repreende outros “pregadores de profecia” que interpretam esse texto de modo literal, porque “a logística necessária para mover um exército de 200 milhões de pessoas do Oriente através do Eufrates e do deserto árabe à pequena terra de Israel parece impossível” [82]. Evidentemente, mover cada montanha e ilha de seus lugares é mais factível para LaHaye do que mover um exército do Oriente para Israel). Os demônios a cavalo matam fisicamente “um terço da população mundial”, atacando com suas bocas e caudas e fazendo com que outros morram de pânico. [83]

LaHaye diz: “Na primeira metade da Tribulação, pragas atrozes varrem a Terra, meteoritos em chamas envenenam um terço das águas, exércitos matam milhões, seres demoníacos torturam os descrentes, a escuridão cobre uma terça parte do Sol e a metade da população mundial morre de forma horrível. E logo virá o pior!” [84]

LaHaye prossegue seu show de horrores em Deixados Para Trás: a elite cultural muda-se de Nova York, Londres e Bruxelas para várias vilas localizadas no quartel-general da Besta na Babilônia [85], que apesar de tudo continua firme na Terra e foi restaurada à sua grandeza anterior por ninguém mais, ninguém menos do que Saddam Hussein! [86] Ali tomam a “decisão irrevogável” de aceitar a “marca da Besta” [87]. Em pouco tempo o Anticristo tem o controle absoluto sobre aqueles que foram deixados para trás. “O Grande Irmão Internacional, cujo número é 666” [88], juntamente com a “Comissão Trilateral e outras organizações secretas e semi-secretas” finalmente realizam seu sonho de “uma economia mundial interdependente” [89].

A Besta encontra-se agora em posição de romper seu pacto com Israel. Quando ela começa sua “solução final” para o “problema judeu”, Deus começa a afligir os que receberam a marca da Besta com “úlceras terríveis” [90]. Logo “ordena ao mar que se transforme em sangue como de um cadáver” e faz com que todos os rios e mananciais se transformem em sangue. (LaHaye diz: “Se Jesus pôde transformar água em vinho, não há problema em transformar água em sangue” [91]).

Quando não há mais água para beber, Deus faz com que o Sol “queime” com “tremendo calor” [92]. Mas tudo isso, no entanto, é só o começo do grande final. “E que final! O terremoto mais severo que o mundo conheceu sacode o planeta e seus fundamentos” [93]. “E isso não é tudo”, prossegue LaHaye em seu delírio. “Enormes pedras de granizo de mais de 60 quilos caem do céu, matando pessoas por todo o planeta”. Finalmente o cenário está pronto para “a mais famosa batalha da História” [94].

Jesus regressa com sua noiva vestida de branco. Toca o monte das Oliveiras e a montanha é dividida ao meio (provavelmente ela não tinha sido removida juntamente com todas as outras montanhas e ilhas) [95]. Então o Senhor mata todas as pessoas que ainda estavam vivas e que não eram salvas [96], amarra Satanás e dá início a “um tempo de paz que homens e mulheres de boa vontade têm desejado através dos séculos” [97].

Depois da vinda secreta de Cristo, de sete anos de matança e da Segunda Vinda de Cristo, na teologia de Deixados Para Trás ainda há uma segunda oportunidade de salvação durante o reinado milenar de Cristo. Homens, mulheres e crianças têm outros mil anos para aceitar ou rejeitar o Salvador [98]. Milhões de pessoas são salvas, mas outros milhões sucumbem aos encantos de Satanás. Seu número, diz LaHaye, “é como a areia do mar”. Portanto, depois de um tempo de paz e prosperidade, mais uma vez o planeta entra num processo de destruição. “E é desse modo”, diz LaHaye, “que com uma bola de fogo celestial a rebelião humana será varrida da existência” [99].

Tal como a teoria da evolução darwiniana, esta escatologia dispensacionalista continua evoluindo desde seu humilde começo nas ilhas britânicas, com a série Deixados Para Trás como carro-chefe. O dogma de Darby de dois povos, dois planos divinos e duas fases da Segunda Vinda agora é a norma, não a exceção. As doutrinas dispensacionalistas propagam-se graças a muitas instituições educacionais e penetram nas áreas mais altas de influência e poder. Conglomerados televisivos multimilionários, tais como o Trinity Broadcasting Network (TBN) produzem diariamente mais especulações proféticas dispensacionalistas.

Os que se atrevem a questionar a ideia do arrebatamento pré-tribulacionista seguido por um holocausto na Terra Santa no qual a maioria dos judeus perece, são chamados de hereges. Cunharam um termo para designar aqueles que negam as ideias dispensacionalistas. São chamados de “teólogos da Substituição” e são considerados culpados por “espalhar o anti-semitismo” [100]. Os dispensacionalistas populares, como John Hagee, são contundentes em suas críticas: “Os teólogos da Substituição estão cobrindo suas mensagens com a unção de Hitler” [101].

A única coisa que podemos fazer é orar para obter coragem a fim de enfrentar a heresia e o atrevimento dos dispensacionalistas, fazendo todo o possível para que essa pseudoescatologia, assim como a pseudociência da eugenia, desapareça nos porões escuros da História.

TRADUZIDO E ADAPTADO POR F.V.S. DE:

HANEGRAAFF, Hank. El Código del Apocalipsis. Nashville: Grupo Nelson, 2008.

NOTAS:

[1]. Charles Darwin, The Deseent ofMan, capítulo 6, "On the Affinities and Genealogy of Man", no livro de Robert Maynard Hutchins, ed., Great Books of the Western World, vol. 49, Darwin (Chicago, IL: Encyclopedia Britannica, 1952), p. 336.

[2]. Arthur Keith, Evolutíon and Ethícs (Nova York, NY: Putnam, 1947), p. 30, http://reactor-core.org/evolution-and-ethics.html (acessado em 25-01-2007).

[3]. Daniel Goleman, "Lost Paper Shows Freud's Effort to Link Analysis and Evolution", New York Times, 10 de fevereiro de 1987, Cl. Goleman explica: «A ideia evolucionista na qual Freud apoiava suas teses era principalmente a contida no manuscrito “A Ontogenia recapitula a Filogenia”, ou seja, o desenvolvimento do indivíduo repete a evolução total da espécie». Confira Henry M. Morris, The Long Wár Agaínst God: The Hístory and Impactof the Creatíonl Evolutíon Conflíct (Grand Rapids, MI: Baker, 1989), p. 33.

[4]. Henry M. Morris e Gary E. Parker, What Is Creatíon Science? ed. revisada (El Cajon, CA: Master Books, 1987), p. 67; veja também Stephen Jay Gould, "Dr. Down's Syndrome", Natural History (abril 1980): pp. 142-148.

[5]. Marvin L. Lubenow, Bones of Contentíon: A Creationist Assessment of Human Fossils, ed. revisada (Grand Rapids, MI: Baker, 2004), p. 62.

[6]. Uma perspectiva concisa da história da eugenia é a seção do apêndice 1 do livro State of Fear de Michael Crichton, "Why Politicized Science is Dangerous" (New York, NY: Harper Collins, 2004), pp. 575-580.

[7]. Ibid., p. 576.

[8]. Veja Jeremias 30.7 e Mateus 24.21.

[9]. Timothy P. Weber, On the Road to Armageddon: How Evangelícals Became Israel's Best Friend (Grand Rapids, MI: Baker, 2004), pp. 136, 146; veja pp. 129ss.

[10]. Arno Clemens Gaebelein, The Conflíct of the Ages: The Mystery of Lawlessness, Its Origin, Historic Development, and Coming Defeat (Vienna, VA: The Exhorters, s.f., ed. reimpressa, sem censura ), p. 147.

[11]. Weber, On the Road to Armageddon, pp. 135-136.

[12]. Veja ibid., pp. 130ss.

[13]. James M. Gray, "The Jewish Protocols", Moody Bíble lnstitute Monthly 22 (outubro de 1921): p. 598, citado no livro de Weber, On the Road toArmageddon, p. 132.

[14]. Gaebelein, Conflíct of the Ages,p. 99; veja também o comentário no livro de Weber, On the Road to Armageddon, p. 134.

[15]. Weber, On the Road to Armageddon, p. 142.

[16]. Charles C. Cook, "The International Jew", King's Business 12 (novembro de 1921): p. 1087, citado no livro de Weber, On the Road to Armageddon, p. 132.

[17]. Harry A. Ironside, "Are the Jews as a People Responsible for the So-Called Protocols of the Elders of Zion?" Chosen People 39 (março de 1934): pp. 5-7, citado no livro de Weber, On the Road to Armageddon, p. 138.

[18]. John Walvoord, Israel in Prophecy (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1968), pp. 107,113-114, citado no livro de Weber, On the Road to Armageddon, p. 149 (ênfase acrescentado).

[19]. Hal Lindsey com C. C. Carlson, The Late Great Planet Earth (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1970 [edição número 40, maio de 1974]), p. 110; e no livro de Weber, On the Road to Armageddon, p. 151.

[20]. Tim LaHaye e Thomas Ice, Charting the End of Times (Eugene, OR: Harvest House, 2001), p. 63.

[21]. Tim LaHaye e Jerry B. Jenkins, Are We Living in the End Times? (Wheaton, IL: Tyndale, 1999), p. 146 [¿Estamos viviendo los últimos tiempos? (Miami, FL: Editorial Unilit, 2000)].

[22]. LaHaye e Ice, Charting the End Times, p. 58.

[23]. Referindo-se ao seu estado mental depois e sair da Inglaterra a bordo do HMS Beagle, Darwin escreveu: «Naqueles momentos eu não duvidava da verdade literal e estrita de cada palavra da Bíblia.» (F. Darwin, ed., The Life and Letters of Charles Darwin, vol. 1 [Londres: John Murray, 1888], p. 45, citado no livro de Michael Denton, Evolution: A Theory in Crisis [Bethesda, MD: Adler & Adler, 1986), p. 25). A noção de que Darwin foi, em algum momento de sua vida, um cristão criacionista é amplamente debatida. De fato, seu avô, Erasmus, o verdadeiro inventor da teoria da evolução, era um racionalista do século XVIII.

[24]. Timothy P. Weber, Living in the Shadow of the Second Coming: American Premillennialism, 1875-1982 (Chicago, IL: University of Chicago Press, 1983 ed.), p. 6. Weber cita Winthrop S. Hudson, Martin E. Marty, William Warren Sweet e Sydney Ahlstrom.

[25]. Minhas principais fontes são os livros de Weber, Living in the Shadow of the Second Coming; On the Road to Armageddon; e de Ernest R. Sandeen, The Roots of Fundamentalism: British and American Millenarianism 1800-1930 (Chicago, IL: University of Chicago Press, 1970); e de George Eldon Ladd, The Blessed Hope (Grand Rapids, MI: Eerdmans, 1956).

[26]. Sandeen, Roots of Fundamentalism, pp. 42, 47-48.

[27]. Veja Tim LaHaye, The Beginning of the End (Wheaton, IL: Tyndale, 1972), pp. 38-39; além disso, veja todo o capítulo 3: "The First Sign of the End" e o capítulo 15: "Is This the Last Generation?" LaHaye argumentava que a Primeira Guerra Mundial cumpriu de maneira singular a profecia de Mateus 24.7, que seria para ele o “começo do fim”. En 1999, LaHaye escreveu juntamente com Jerry B. Jenkins o livro Are We Living in the End Times? (Wheaton, IL: Tyndale, 1999), logo traduzido para o espanhol no ano 2000 [¿Estamos viviendo los últimos tiempos? (Miami, FL: Editorial Unilit, 2000)], no qual ainda não havia descartado a possibilidade de que a geração que viu a Primeira Guerra Mundial não passaria antes da volta do Senhor, dizendo que esse cenário “não deveria ser descartado por mais cinco anos” (p. 59).

[28]. Ladd, The Blessed Hope, p. 41.

[29]. S. P. Tregelles, The Hope of Christ's Second Coming: How Is It Taught in Scripture? and Why?(Chelrnsford, Inglaterra: The Sovereign Grace Advent Testimony, sexta ed., s.d. [primeira ed. 1864]), p. 35; e no livro de Ladd, Blessed Hope, p. 41.

[30]. Segundo o historiador Timothy Weber, o próprio Darby explicou que “a doutrina do arrebatamento pré-tribulacionista praticamente saltou das páginas da Bíblia uma vez que compreendeu e manteve de forma coerente a distinção absoluta entre Israel e a Igreja nos planos proféticos de Deus” (On the Road to Armageddon, p. 25).

[31]. Ladd, Blessed Hope, p. 130.

[32]. Ibid., p. 41.

[33]. Weber, On the Road to Armageddon, p. 39.

[34]. LaHaye e Ice, Charting the End Times, p. 81.

[35]. Weber, On the Road to Armageddon, p. 15.

[36]. Ironicamente, o sionista cristão John Hagee sustenta que a alusão bíblica às estrelas e ao pó é prova de que Deus tem dois povos diferentes, um celestial (as estrelas) e outro terrestre (o pó). Hagee diz: “Deus menciona dois elementos separados e diferentes: as estrelas do céu e o pó das praias. As estrelas são celestiais, não terrenas. Representam a Igreja. A areia das praias, por outro lado, é terrena, e representa um reino terreno com uma Jerusalém literal como capital. Estrelas e areia existem ao mesmo tempo e nenhuma substitui a outra. Do mesmo modo, a nação de Israel e o Israel espiritual coexistem ao mesmo tempo e não substituem um ao outro” (John Hagee, Final Dawn over Jerusalém [Nashville, TN: Nelson, 1998], pp. 108-109 [El último amanecer em Jerusalén] (Nashville, TN: Caribe Betania, 1998). Interpretar a Escritura à luz da Escritura, no entanto, destrói completamente a afirmação de Hagee. O profeta Neemias, por exemplo, exaltava a fidelidade de Deus em cumprir suas promessas fazendo com que os descendentes de Abraão [isto é, os judeus, Israel] fossem tão numerosos quanto as estrelas do céu (Ne 9.23; compare com Gn 15.5; 22.17).

[37]. LaHaye e Ice, Charting the End Times, p. 48.

[38]. Keith A. Mathison, Dispensationalism: Rightly Dividing the People of God? (Phillipsburg, NJ: P & R, 1995), p. 29 (ênfase no original).

[39]. Veja Apocalipse 5.9; 7.9.

[40]. LaHaye e Ice, Charting the End Times, p. 87.

[41]. Ibid., p. 90.

[42]. Ibid., p. 48 (ênfase acrescentada).

[43]. Ibid., p. 27.

[44]. Ibid., p. 46.

[45]. Weber, On the Road to Armaggedon, p. 24 (somente a primeira ênfase foi acrescentada).

[46]. H. A. Ironside, The Mysteries of God (Nueva York, NY: Loizeaux, 1946), pp. 50-51, citado no livro de Gary DeMar, End Times Fiction: A Biblical Consideration of the Left Behind Theology (Nashville, TN: Nelson, 2001), p. 20.

[47]. Como aparece no livro de Tim LaHaye, "Introduction: Has Jesus Already Come?" e no livro de Tim LaHaye e Thomas Ice, eds., The End Times Controversy (Eugene, OR: Harvest House, 2003), p. 11 (ênfase acrescentada).

[48]. Tim LaHaye e Jerry B. Jenkins, Are We Living in the End Times? (Wheaton, IL: Tyndale, 1999), p. 114 [¿Estamos viviendo los últimos tiempos? (Miami, FL: Editorial Unilit, 2000)].

[49]. Grant R. Jeffrey, "A Pretrib Rapture Statement in the Early Medieval Church", citado no livro de Thomas Ice e Timothy Demy, eds. gerais, When the Trumpet Sounds (Eugene, OR: Harvest House, 1995), pp. 108, 109.

[50]. Norman L. Geisler, "A Friendly Response to Hank Hanegraaff's Book, The Last Disciple", http://www.ses.edu/NormGeisler/lastdisciple.htm (acesso em 25-01-2007).

[51]. Norman L. Geisler, Systematic Theology, vol. 4, Church,, Last Things (Minneapolis, MN: Bethany House, 2005), p. 658.

[52]. Geisler, "Friendly Response".

[53]. LaHaye e Jenkins, Are We Living in the End Times?, p. 114 (ênfase acrescentada). [¿Estamos viviendo los últimos tiempos? (Miami, FL: Editorial Unilit, 2000)].

[54]. Para um comentário mais profundo, veja "Postscript: Pseudo-Efraín on Pretrib Preparation for a Posrtrib Meeting with the Lord", no livro de Robert Gundry, First the Antichrist (Grand Rapids, MI: Baker, 1997), pp. 161-188.

[55]. LaHaye e Jenkins, Are We Living in the End Times?, pp. 95-96 (ênfase acrescentada) ¿Estamos Viviendo los últimos tiempos? (Miami, FL: Editorial Unilit, 2000).

[56]. Veja 1Co 15.51-52; 1Ts 4.14-17.

[57]. N. T. Wright, "Farewell to the Rapture", Bible Review, agosto 2001, http://www.ntwrightpage.com/WrighCBR_Farewell Rapture.pdf (acesso em 26-01-2007).

[58]. A Biblia de estudo das Profecias de Tim LaHaye é explícita ao dizer que Jesus em Jo 14.1-3 não se refere à sua Segunda Vinda, mas a uma vinda secreta. Veja Tim LaHaye, ed., Tim LaHaye Prophecy Study Bible, p. 1151.

[59]. LaHaye, No Fear of the Storm (Sisters, OR: Multnomah, 1992), p. 188.

[60]. Thomas D. Ice, "The Origin of the Pretrib Rapture: Part II", Biblical Perspectives, março-abril de 1989, p. 5, citado no livro de Gary DeMar, End Times Fiction: A Biblical Consideration of the Left Behind Theology (Nashville, TN: Nelson, 2001), p. 20. Em outro trecho Thomas Ice escreve: “Nenhum versículo da Bíblia diz precisamente quando acontecerá o arrebatamento em relação à Tribulação ou à Segunda Vinda, de tal forma que assim o assunto estaria resolvido”. Ice continua dizendo que o ensino das Escrituras sobre o arrebatamento pré-tribulacionista é igual que o da Trindade, ou seja, “o resultado de harmonizar muitas passagens relativas a esses assuntos”. Enquanto ele pensa que a Bíblia ensina “uma posição clara” sobre o arrebatamento pré-tribulacionista, reconhece que essa doutrina depende de “quatro afirmações”, que são controversas. Ice afirma: “Quatro afirmações proveem o marco de referência bíblico do arrebatamento pré-tribulacional : (1) A interpretação literal coerente; (2) o pré-milenismo; (3) o futurismo; (4) uma distinção entre Israel e a Igreja. Não são simples suposições, mas doutrinas bíblicas importantes sobre as quais é construída a doutrina do arrebatamento pré-tribulacionista” (Thomas Ice, "Why I Believe the Bible Teaches Rapture Before Tribulation", http://www.pre-trib.org/pdflIceWhyIBelieveTheBibleTe.pdf [acesso em 30-12-2006]). Porém Gary DeMar refuta cuidadosamente a tentativa de tornar o conceito de arrebatamento pré-tribulacionista semelhante às doutrinas bíblicas da Encarnação e da Trindade: “A natureza encarnada de Cristo pode ser provada utilizando somente dois versículos: Jo 1.1,14. A Trindade também pode ser provada facilmente: o Pai é Deus (1Co 8.6), Jesus é Deus (Jo 1.1); o Espírito Santo é Deus (At 5.3-4); e há somente um Deus (1Tm 2.5). Diferente do arrebatamento pré-tribulacionista, estas duas doutrinas têm sido parte da história eclesiástica durante séculos” (DeMar, End Times Fiction, p. 219).

[61]. A ilustração de nosso Senhor do Dilúvio aclara que o injusto será levado em juízo enquanto o justo será deixado para trás. A força deste argumento é tão grande que mesmo Tim LaHaye reconhece que Lucas 17.34-36 “não faz referência ao arrebatamento” e que os que são “levados” são os descrentes que estão experimentando juízo e não os crentes arrebatados (veja LaHaye, ed., Tim LaHaye Prophecy Study Bible, p. 1113).

[62]. LaHaye, "The Tribulation", em LaHaye, ed., Tim LaHaye Prophecy Study Bible, p. 1374.

[63]. A única frase que LaHaye utiliza para apoiar suas ideias é Daniel 9.27: “Com muitos ele fará uma aliança que durará uma semana”. The Popular Encyclopedia Of Bible Prophecy afirma que “a profecia de Daniel das 70 semanas (hebraico: shavuah, "setes") em Daniel 9.24-27 provê a chave indispensável e cronológica para a profecia bíblica” (Randall Price e Thomas Ice, "Seventy Weeks of Daniel", em Tim LaHaye e Ed Hindson, eds., The Popular Encyclopedia of Bible Prophecy [Eugene, OR: Harvest House, 2004], p. 356). A profecia das setenta semanas é tão difícil de interpretar que não há nenhuma interpretação que possa ser mantida com dogmatismo. Além disso, a interpretação dispensacionalista é simplesmente a menos aceitável de todas as interpretações que eruditos que honram a Cristo têm oferecido para essa passagem. Portanto, esse trecho de Daniel não pode servir como o argumento forte que o dispensacionalismo reivindica. Para ter uma ideia de quão difícil é interpretar essa passagem das setenta semanas, especialmente à luz do livro de Daniel em todo o seu contexto, compare e contraste as exposições relevantes apresentadas pelos seguintes autores: Kim Riddlebarger, A Case for Amillennialism: Understanding the End-Times(Grand Rapids: Baker Books 2003) pp. 149-156; Edward J. Young, The Prophecy of Damel: A Commentary (Eugene, OR;Wipf and Stock, 1998, publicado originalmente em 1949); Milton S. Terry, Biblical Hermeneutics: A Treatise on the Interpretation of the Old and New Testaments (Grand Rapids, MI: Zondervan, [sem data], reimpresso em 1974); Milton S. Terry, Biblical Apocalyptics:.A Study of the Most Notable Revelations of God and of Christ in the Canonical Scriptures (Eugene, OR: Wipf and Stock Publishers, 2001), pp. 181-212, especialmente as pp. 200-207; Gary DeMar, Last Days Madness: Obsession of the Modern Church, quarta edição, GA: American Vision, 1999), pp. 323-335; Richard L. Pratt Jr., “Hiper-Preterism and Unfolding Biblical Eschatology", em Keith A. Mathison, ed., When Shall These Things Be: A Reformed Response to Hyper-Preterism, (Phillipsburg, N: P & R, 2004), pp. 121-154, especialmente pp. 144-146;]. Dwight Pentecost, Things to Come: A Study in Biblical Eschatology (Grand Rapids, MI: Zondervan, 1958), pp. 239-250.

[64]. LaHaye, "The Tribulatíon", em LaHaye, ed., Tim LaHaye Prophecy Study Bible, p.1374.

[65]. É ampliamente aceito que o número sete simboliza totalidade ou plenitude (veja Richard Bauckham, The Climax of Prophecy: Studies in the Book of Revelation [Edimburgo: T. & T. Clark, 1993], pp. 30-31, 405; Dennis E. Johnson, Triumph of the Lamb: A Commentary on Revelation [Phillipsburg, NJ: P & R, 2001], p. 14).

[66]. Veja também o comentário no capítulo 2 do livro El Código del Apocalipsis: “Principio literal”, pp. 29-31, livro do qual este artigo (que corresponde ao capítulo 3) foi extraído.

[67]. Para uma lista extensa de títulos, que incluem "The Time of Jacob's Trouble"; "The Great Tribulation"; "The Day of Israel's Calamity"; "The Day of Clouds"; "The Hour of judgment"; os quais LaHaye utiliza para apoiar sua tribulação futura de sete anos, veja LaHaye e Ice, Charting the End Times, p. 56.

[68]. Paul Benware, "The Marriage of the Lamb", em LaHaye, ed., Tim LaHaye Prophecy Study Bible, p. 1395.

[69]. Comp. Stephen Sizer, Christian Zionism: Road-map to Armageddon? (Leicester: Inter-Varsity, 2004), p. 138.

[70]. LaHaye e Jenkins, Are We Living in the End Times?.

[71]. Ibid.

[72]. Ibid., pp. 231-232.

[73]. Ibid., p. 23!.

[74]. Esse foi um cenário incrível apresentado no filme Deixados Para Trás (Cloud Ten Pietures, 2000).

[75]. LaHaye e Jenkins, Are We Living in the End Times?,pp. 185-186. LaHaye e Jenkins citam Apocalipse 6.14 e o interpretam de modo literal.

[76]. Ibid., p. 186.

[77]. Ibid., p. 187.

[78]. Ibid., ênfase acrescentada.

[79]. Ibid., p. 188.

[80]. Ibid., p. 189.

[81]. Ibid., pp. 191, 192.

[82]. Ibid., p. 191.

[83]. Ibid., p. 192.

[84]. Ibid., p. 193 (ênfase acrescentada).

[85]. Ibid., p. 195.

[86]. Ibid., pp. 138-142.

[87]. Ibid., p. 198.

[88]. Ibid., p. 201.

[89]. Ibid., pp. 198-203.

[90]. Ibid., p. 206.

[91]. Ibid., p. 207.

[92]. Ibid., p. 208.

[93]. Ibid., p. 218.

[94]. Ibid., p. 219.

[95]. Ibid., pp. 226-227.

[96]. Ibid., p. 229.

[97]. Ibid., p. 231.

[98]. Citando Isaías 65.20, LaHaye e Jenkins escrevem: “Acreditamos que isto significa que os crentes viverão durante todo o período, mas os descrentes terão mais 100 anos para se arrepender e aceitar a Cristo como Senhor. Se o rejeitarem, morrerão. Portanto, no final do milênio, haverá uma população enorme sobre a face da Terra, e a grande maioria será salva. De fato, acreditamos que devido ao milênio, haverá mais gente no céu do que no inferno” (Ibid., p. 240).

[99]. Ibid.

[100]. John Hagee, Should Christians Support Israel? (San Antonio, TX: Dominion, 1987), pp. 1,73.

[101]. Ibid., p. 132 (ênfase acrescentada).