segunda-feira, 11 de maio de 2009

TRIUNIDADE: A DIVERSIDADE NA UNIDADE

INTRODUÇÃO

Em contraste com outros aspectos da doutrina de Deus, o desenvolvimento histórico da doutrina da Triunidade foi tratado muito cuidadosamente, e também com toda a certeza trata-se de um assunto estimado na história do dogma. Não pretendo suplantar tudo o que já foi descoberto, analisado e posto em prática sobre a doutrina da Triunidade. Grandes vultos eclesiásticos já se ocuparam desta Santíssima doutrina, dentre eles cita de passagem, Tertuliano, Agostinho e recentemente Karl Barth, que, todos hão de admitir, prestou um grande serviço à Teologia por dar nova ênfase à decisiva importância da doutrina da Triunidade dentro do evangelicalismo.
O Deus “Trino” é o Deus da revelação, não o Deus dos filósofos, e está no topo da revelação de Deus em si mesmo como um “principium cognoscendi”. Pois trata da revelação dada pelo Criador e sustentador de todas as coisas. Passando à Teologia como um “principium essendi”, por se tratar em uma das mais discutidas e importantes da dogmática.
A doutrina bíblica é apenas um lado da questão da formulação da triunidade, que também teve a contribuição da especulação filosófica. E foi exatamente aqui que se deram as maiores aberrações sobre a doutrina.
Ao considerar esta parte da dogmática, é necessário que um tom de reverência santa e temor caracterizem toda a abordagem. Que haja a mesma atitude que Moisés teve ao aproximar-se da montanha onde a sarça ardia sem se queimar, com reverencia e temor, trato deste assunto “triunidade”, pois, estou pisando em solo sagrado. Que Deus me ajude.


A TRIUNIDADE

“III. Na unidade da Divindade há três pessoas de uma mesma substância, poder e eternidade - Deus o Pai, Deus o Filho e Deus o Espírito Santo, O Pai não é de ninguém - não é nem gerado, nem procedente; o Filho é eternamente gerado do Pai; o Espírito Santo é eternamente procedente do Pai e do Filho”. (1)


A TRI-UNIDADE NO ANTIGO TESTAMENTO

Conceituando

O termo Trindade vem sendo usado há dezesseis séculos, para tentar explicar a natureza de Deus. A unidade de Deus é fundamental na religião cristã, e nenhuma doutrina pode ser verdadeira sendo inconsistente com este princípio. Entendo pelas Escrituras que o Pai é Deus, o Filho é Deus e que o Espírito Santo é Deus. Conciliar a Deidade com cada uma dessas três pessoas com a estrita unidade de Deus é tarefa de grande dificuldade. Usualmente os teólogos afirmam que os três são um em essência.
Quando um cristão usa a palavra trindade (que significa, simplesmente, três), inconscientemente comunica aos ouvintes não cristãos um conceito de politeísmo, por isso acredito que a escolha do termo trindade é infeliz e não comunica o que se propõe.
A palavra trindade “trinitas” foi cunhada a fim de referir-se à pluralidade que há em Deus, ao mesmo tempo em que manteria o pensamento da unidade divina, concordo que a intenção foi boa, mas não atingiu o alvo desejado.
Muitos não cristãos supõem que o cristianismo acredita e adora a três deuses, e não a um só Deus. E não somente os não cristãos, mas muitos da própria cristandade não aceitam o conceito trinitariano entre estes se destacam as “Testemunhas de Jeová” e os “unitaristas”.
Por esses e outros motivos acredito que o termo mais apropriado para descrever corretamente o verdadeiro conceito bíblico da natureza de Deus, o vocábulo “tri-unidade”, transmite melhor a idéia de que Deus é um só, e ao mesmo tempo em que consiste em três pessoas.


A UNIDADE

A Unidade de Deus
Para melhor compreendermos o assunto, devemos fazer uma distinção entre “unitas singularitatis” e “unitas simplicitatis”.

Unidade Singular (unitas singularitatis)
Esse atributo salienta a unidade e a unicidade de Deus, o fato de que Ele é numericamente um e que, pela natureza do caso, só pode existir apenas um, e que todos os outros tem sua existência dele, por meio dele e para Ele. (2) Em várias passagens a Bíblia nos ensina que existe somente um Deus verdadeiro, Salomão ensinou isso ao pedir que Deus os ajudasse: “para que todos os povos da terra saibam que o Senhor é Deus e que não há outro” (1Rs 8.60). E Paulo escrevendo aos Coríntios: “todavia, para nós há um só Deus, o Pai, para quem são todas as coisas, e nós também, por Ele”. (1Co 8.6). Há, no entanto muitas outras passagens que salientam não uma unidade numérica, mas uma unicidade composta como é o caso da bem conhecida declaração da unicidade Divina em Dt 6.4 “ouve [shema] Israel, o Senhor [Yahweh/Iavé] nosso Deus [Elohim] é o único [echad] Senhor [Yahweh/Iavé] (3). Também vemos que em (Êxodo 15.11), que o Senhor é o único que faz Jus ao nome Iavé. E exclui completamente o politeísmo.

Unidade Simples (unitas simplicitatis)
Embora a unidade discutida no item anterior distinga Deus dos demais seres, a perfeição agora em foco revela a unidade interior e qualitativa do ser Divino. Quando falamos de simplicidade de Deus, empregamos o termo para descrever o estado ou a qualidade que consiste em ser simples, a condição de estar livre de divisão em partes e, portanto, de composição. Quer dizer que Deus não é composto e não é suscetível de divisão em nenhum sentido da palavra. Isso implica que as três pessoas da Triunidade não são outras tantas partes das quais se compõe à essência Divina, que não há distinção entre a essência e as perfeições de Deus, e que os atributos não são adicionados a sua essência. A Bíblia fala de Deus como amor e justiça, luz e vida, identificando-o como assim com suas perfeições.

Pluralidade e unidade
Em Números 13, Moisés registrou o relato sobre doze espias hebreus que tinham sido enviados para espiar a terra de Canaã. Quando retornaram daquela missão (v. 23), eles pararam em Escol, onde cortaram um ramo de videira com um cacho de uvas. A palavra que aparece como “um“ em “um cacho”, é novamente “Echad”, pelo próprio texto fica claro que esse único cacho de uvas consistia de muitas uvas.
De igual modo, em Esdras 2.64, está registrado: “Toda esta congregação junta foi de quarenta e dois mil trezentos e sessenta”. A palavra traduzida por “toda”, na expressão “toda esta congregação”, é a palavra hebraica “echad”, logicamente toda a congregação de Israel era composta de muitos indivíduos, nada menos do que 42.360 israelitas, que compunham uma única congregação.
Em Jeremias 32.38,39. A mesma palavra “echad” está inserida, trazendo-nos uma vez mais a idéia de unidade composta, veja: “Eles serão o meu povo, e eu serei o seu Deus. Dar-lhes-ei um só coração e um só caminho...” A referencia a “um só coração” e “um só caminho” envolve a nação de Israel na sua completude. Assim, muitos, coletivamente, são considerados como “somente um”.
É importante salientar, que uma palavra hebraica que comunica a idéia de “unidade absoluta” existe. O termo é “yachid”. E é encontrada em Gênesis 22.2: “Toma teu filho, teu único (yachid), Isaque, a quem amas, e vai-te a terra de Moriá; oferece-o ali em holocausto”.
Provérbios 4.3, Salomão assevera: “... Eu era filho em companhia de meu pai, tenro, e único diante de minha mãe”. O termo usado para “único” é “yachid”. Davi escreve no Salmo 22.20: “Livra a minha alma da espada, e das presas do cão a minha vida”, onde tem “minha vida”, no hebraico é “minha única”, sendo usada a palavra hebraica “yachid”.
Também encontra escrito em Juízes 11.34: “Vindo, pois Jafté a Mispa, a sua casa, saiu-lhe a filha ao seu encontro, com adufes e com danças: e era ela filha única; não tinha ele outro filho nem filha”. Jeremias declara, em 6.26 de seu livro: “Ó filha de meu povo, cinge-te de cilício, e revolve-te na cinza. Pranteia como por um filho único...”
Percebe-se, portanto, que os escritores sagrados, inspirados pelo Espírito Santo, dispunham de duas palavras que podiam escolher para usar para referir-se a unidade como demonstrei acima. Deus usou os escritores para selecionar o termo “echad” para comunicar algo de sua natureza, que o identifica com a idéia de pluralidade. Esse substantivo coletivo sempre foi escolhido, e não o singular absoluto “yachid”, para não deixar dúvidas do que Deus queria nos transmitir.

A PLURALIDADE NO NOME DE DEUS

Nas nossas traduções da língua portuguesa, ao traduzirem as palavras hebraicas “El” e “Elohim”, os tradutores usaram letra maiúscula “D”, “Deus”, no hebraico, essas palavras significam ambas, “Todo-poderoso”.
Ambos esses nomes, na verdade, são uma só palavra. De particular importância se dá ao fato que dentre as 2.750 vezes em que essas palavras são empregadas no Antigo Testamento, Elohim, a forma plural, é empregada nada menos do que 2.500 vezes.
Êxodo 20.2,3. É-me um belo aliado para demonstrar este fato. Nesta passagem, Moisés estava transmitindo os dez mandamentos de Deus ao povo de Israel. Yahweh, pois, declara ali: “Eu sou o Senhor teu Deus... Não terás outros deuses diante de mim”. Nesta declaração, “Deus” e “deuses” são idênticas no original hebraico, isto é, Elohim. A variação que se vê nas traduções bíblicas em língua portuguesa deve-se ao fato que os tradutores, apesar de traduzirem a segunda ocorrência da palavra por “deuses”, no primeiro caso, no entanto preferiu traduzir Elohim no singular, “Deus”.
Não sou especialista em tradução, mas acredito que se poderia traduzir esta passagem mais naturalmente, usando o próprio princípio de tradução de equivalência verbal. “Eu sou o Senhor teus Deuses... Não terás outros deuses diante de mim”. Seria aceitável.
Deus decidiu comunicar o conceito de pluralidade na unidade através dos escritos de Moisés, para demonstrar mesmo que de maneira velada no Antigo Testamento a sua Tri-unidade, pois Deus poderia simplesmente ter usado um termo singular para a sua pessoa, para a sua unidade, mas não o quis, pois os termos singulares não transmitiriam o ensinamento correto do que Ele estava ensinando através de Moisés.
Que a pluralidade existente na Deidade é Triúna, é algo que se tem demonstrado acima, mas posso ir mais adiante ao tema e tomar como base a tripla declaração da santidade de Deus (Is 6.3). E na tripla benção do sumo sacerdote (Nm 6.24-26). Entretanto, um argumento mais satisfatório é derivado da passagem em que as três pessoas divinas são distintamente trazidas à cena (Is 48.16. 61.1; 63.7-10).

A TRINDADE NA TRADIÇÃO CRISTÃ
A regra de fé de Irineu assegura que:
“A igreja embora tenha aparecido em todo o universo, desde os confins da terra, recebeu dos apóstolos e dos seus discípulos, a fé em um só Deus, Pai Onipotente, que fez os céus e a terra e os mares e tudo o que neles se encontra; e um só Jesus Cristo, Filho de Deus, que se encarnou pela nossa salvação; e um só Espírito Santo; que por meio dos profetas anunciou as economias divinas, os acontecimentos, o nascimento virginal, a Paixão, a Ressurreição dos mortos e a ascensão corporal ao céu do dileto Jesus Cristo, nosso Senhor e a sua parousia, quando dos céus ele comparecerá à direita do Pai, para restaurar todas as coisas e ressuscitar a carne de toda humanidade.”(4)
A segunda confissão Helvética.
Deus é uno. Cremos e ensinamos que Deus é um em essência ou natureza, subsistindo por si mesmo, todo suficiente em si mesmo, invisível, incorpóreo, imenso, eterno, criador de todas as coisas, visíveis e invisíveis, o supremo-bem, vivo, vivificador e preservador de todas as coisas, onipotente e supremamente sábio, clemente ou misericordioso, justo e verdadeiro. Abominamos a pluralidade de deuses, porque está claramente escrito: “O Senhor nosso Deus é o único Senhor” (Dt 6.4). “Eu sou o Senhor teu Deus. Não terás outros deuses diante de mim” (Êx 20.2-3). “Eu sou o Senhor, e não há outro; além de mim não há Deus. Deus justo e Salvador não há além de mim” (Is 45.5.21). “Senhor, Senhor Deus compassivo, clemente e longânimo, e grande em misericórdia e fidelidade” (Êx 34.6).
Deus é trino. Entretanto, cremos e ensinamos que o mesmo Deus imenso, uno e indiviso é inseparavelmente e sem confusão, distinto em pessoas - Pai, Filho e Espírito Santo - e, assim como o Pai gerou o Filho desde a eternidade, o Filho foi gerado por inefável geração, e o Espírito Santo verdadeiramente procede de um e outro, desde a eternidade e deve ser com ambos adorado.
Assim, não há três deuses, mas três pessoas, consubstanciais, co-eternas e co-iguais, distintas quanto às hipóstases e quanto à ordem, tendo uma precedência sobre a outra, mas sem qualquer desigualdade. Segundo a natureza ou essência, acham-se tão unidas que são um Deus, e a essência divina é comum ao Pai, ao Filho e ao Espírito Santo.
A Escritura ensina-nos manifesta distinção de pessoas, quando o anjo diz, entre outras coisas, à bem-aventurada Virgem; “Descerá sobre ti o Espírito Santo e o poder do Altíssimo te envolverá com a sua sombra; por isso também o ente santo que há de nascer, será chamado Filho de Deus” (Lc 1.35). E, igualmente, no batismo de Cristo, ouve-se uma voz do céu a seu respeito, dizendo: “Este é o meu Filho amado” (Mt 3.17). O Espírito Santo também apareceu em forma de pomba (Jo 1.32). E, quando o Senhor mesmo mandou os apóstolos batizarem, mandou-os batizar “em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo” (Mt 28.19). Em outra parte do Evangelho, diz ele: “O Espírito Santo, a quem o Pai enviará em meu nome” (Jo 14.26). E noutro lugar: “Quando, porém, vier o Consolador, que eu vos enviarei da parte do Pai, o Espírito da verdade, que dele procede, esse dará testemunho de mim”, etc. (Jo 15.26). Em resumo, recebemos o Credo dos Apóstolos, porque ele nos comunica a verdadeira fé. (5)

A TERMINOLOGIA “TRINITÁRIA” HISTÓRICA
Desde o princípio os latinos foram mais felizes que os gregos na uso da terminologia trinitária. Tertuliano fornecera-lhes os termos: natureza, substância, para significar o que é comum às três pessoas, isto é, a essência igualmente introduzirá a Palavra Pessoa para significar o que é particular, enquanto a essência deve ser considerada como individual subsistente em si, usara deste termo em relação ao Pai e ao Filho, originando-se daí o hábito de falar de: “Tres Personae e de Una Natura, ou substantia, ou essentia” – (Três pessoas e de uma natureza ou essência).
Aos gregos faltou tanta precisão na sua terminologia para significar o que é comum, usavam fisis “physis” foi também usado para designar pessoa, portanto no mesmo sentido de upostasis “hipostasys”.
Os termos essência, substância e natureza, a igreja usou-as no IV Concílio Lateranense, como sinônimos, mas podem ser distinguidos com maior precisão como se vê a seguir:

A) Essência; indica a razão íntima do ser, aquilo pelo qual é propriamente o que é. Aplica-se ao termo a tudo quanto é, de algum modo, um entre “ens” real ou possível, existente em si ou num outro.

B) Substância: É a essência enquanto está em algo subsistente em si ou por si, opõe-se ao acidente, que não existe em si, mas no sujeito. Distingue Aristóteles a substância primeira e ser individual existente realmente, substância por excelência; e a substância Segunda. Conceito individual, conceito universal. Exemplo: Sócrates na sua existência concreta é uma substância primeira; a humanidade, isto é, aquilo pelo que Sócrates é homem, é uma substância segunda.

C) Natureza: É na maioria das vezes sinônimo de essência, porém em termos mais precisos serve para indicar a essência enquanto é princípio de modificação e de atividade (Natureza, de nasci, eu nasço).

TRI-UNIDADE NO NOVO TESTAMENTO
Se no Antigo Testamento a Tri-unidade de Deus é revelada de modo velado, no Novo Testamento, porém, ela está claramente exibida nas palavras ordenança do batismo em Mateus 28.19: “Portanto, ide e fazei com que todos os povos da terra se tornem discípulos, batizando-os em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”. Somos batizados em um único nome, porque Deus é um só, mas esse nome é o do Pai, do Filho e do Espírito Santo, pois pertence igualmente a cada uma das pessoas divinas.
Encontro com essa doutrina logo no início da minha profissão de fé no cristianismo. No batismo como já me referi acima e também temos esta crença logo na primeira declaração do credo apostólico:
“Creio em Deus Pai Todo-Poderoso, Criador do Céu e da terra. E em Jesus Cristo, seu filho unigênito, nosso Senhor; concebido pelo Espírito Santo...” (6).

Jesus o Cristo – numa perspectiva Tri-unitária
No Novo Testamento, em centenas de versículo explícitos que chamam Jesus de “Deus” e “Senhor” e empregam alguns outros título de divindade em referência a Ele, e em muitas passagens que lhes atribuem ações ou palavras aplicáveis somente a Deus, declara repetidas vezes a divindade plena de Jesus. “...aprouve a Deus que, Nele, residisse toda Plenitude” (Colossenses l.19), e: “Nele , habita corporalmente toda a plenitude da divindade” (Colossenses 2.0), Jesus é corretamente chamado “Emanuel”, “Deus Conosco” (Mateus 1.23).

A natureza de Cristo
Teólogos evangélicos de gerações anteriores não hesitaram em fazer distinção entre coisas feitas pela natureza humana de Cristo, mas não pela natureza divina, ou pela natureza divina e não pela humana. Parece que em tempos como os nossos temos que ressaltar a Confissão de Calcedônia de que: “é preservada a propriedade de cada natureza”.
Quando nos referimos à natureza humana de Jesus, podemos dizer que Ele subiu ao céu e não está no mundo (João 16.28; 17.11; Atos 1.9-11), mas concernente à sua natureza divina, podemos dizer que Jesus está presente em toda a parte: “onde estiverem dois ou três reunidos em meu nome, ali estou no meio deles” (Mateus 18.20); “Eis que estou convosco todos os dias até a consumação do século (Mateus 28.20); “se alguém me ama, guardará a minha Palavra e meu Pai o amará, e viremos para ele e faremos nele morada” (João 14,23); podemos, portanto afirmar que Jesus voltou para o céu e que também está presente conosco, do mesmo modo, podemos dizer quanto à humanidade de Jesus que Ele tinha trinta anos, mas concernente à sua natureza divina ele sempre existiu, porquanto é eterno (João 1.1-2-8.58). Em sua natureza humana Jesus cansava e experimentava a fraqueza (Mateus 4.2-8.24; Marcos 15:21; João 4.6), enquanto que sua natureza divina era Onipotente (Mateus 8.26-27; Colossenses 1.17; Hebreus 1.3).


Argumentos gerais em favor da tri-unidade
1. Na visão de Daniel. Ao profeta Daniel foi concedido à visão do Filho do Homem o que se dirigiu ao Ancião de Dias (Dn. 7.9, 13-14). O ‘Filho do Homem’ só pode ser Cristo Jesus, o Filho de Deus. O Ancião de Dias, revelado no v. 9 é claramente Deus, o Pai, e não algum anjo ou querubim.
2. Na visão do Apóstolo João cerca de 600 anos depois do tempo de Daniel. João o Apóstolo, recebeu uma visão semelhante na ilha de Patmos cerca do ano 96 d.C., ele também viu o trono de Deus, e Deus o Pai, nele sentado. Diante do trono em pé estava o cordeiro de Deus que é Jesus que morreu por nós. A terceira pessoa da Tri-unidade também figura como os Sete Espíritos de Deus, expressão esta que significa o Espírito Santo na sua Plenitude de operação (Apocalipse 4.2-3; 5.1, 6-10), vemos, igualmente, que os vinte e quatro anciãos que adoram Deus o Pai, e ao cordeiro (Apocalipse 4; 10; 5.8-10, 13; e 7.9-10).
3. Na visão de Estêvão (Atos 7.55) que registra o martírio de Estevão o primeiro mártir da Igreja. Mas Estevão cheio do Espírito Santo fitou os olhos no céu e viu a glória de Deus (o Pai), e Jesus que estava a sua direita. Aqui nota-se claramente o testemunho (martírio).
4. No texto de (I João 5.6-11, 13, 20), o tríplice testemunho sobre Cristo, sobre Cristo o Filho de Deus, é o testemunho das três pessoas da Triunidade, mencionadas no v.7 e v.8. Segundo a Bíblia, era necessário que houvesse duas ou três testemunhas para provar alguma coisa.

O ESPÍRITO SANTO NA TRI-UNIDADE
Por incrível que pareça, há líderes cristãos que não sabem que o Espírito Santo é uma Pessoa. Pelo fato de o Espírito Santo não se manifestar em carne, não significa que não seja uma pessoa. Tal idéia confunde corpo com personalidade. Deus o Pai é uma pessoa, Deus o Filho também é uma pessoa, e já o era antes de sua encarnação, e Deus o Espírito Santo também é uma pessoa.
O que é uma pessoa? É qualquer ser que tenha a capacidade de pensar, sentir, exercer vontade e agir. Os homens, os anjos e até os demônios são pessoas, e não é necessário ter um corpo físico para ser uma pessoa. O rico nas chamas do inferno podia fazer tudo isso (pensar, exercer vontade, agir), embora seu corpo estivesse numa sepultura na superfície da terra (Lucas 16).
1. O Espírito Santo tem sabedoria. I Coríntios 2.10-11;
2. O Espírito Santo exerce volição. I Coríntios 12.11.
O Espírito Santo tem mente – Romanos 8.27. A palavra mente no original grego significa pensamento próprio, sentimento.
O Espírito Santo pode agir, ele perscruta (I Coríntios 2.10), fala (Atos 2.4), testifica (João 15.26; Gálatas 4.6), intercede (Romanos 8.26), ensina (João 14.26, 16.12-14), guia (Romanos 8.14), ordena (Atos 16.6-7, 13.2), separa (Atos 20.28), revela (2 Pedro 1.21). Devemos ter muito cuidado ao tratar o Espírito Santo. É possível entristecê-lo (Isaías 63.10; Efésios 4.30), rebelar-se contra ele (Isaías 63.10), fazer agravo a ele (Hebreus 10.29), mentir a ele (Atos 5.3), blasfemar contra ele (Mateus 12.31-32), resistir a ele (Gênesis 6.3), e até apagá-lo (I Tessalonicenses 5.19). As escrituras afirmam categoricamente que o Espírito Santo é Deus. E os quatro atributos naturais da divindade encontram-se nele também:

1. ETERNIDADE – Hebreus 4.14.
2. ONIPOTÊNCIA – Gênesis 1.2; Lucas 1.35; Romanos 8.11.
3. ONIPRESENÇA – Salmo 139.7-10.
4. ONISCIÊNCIA - I Coríntios 2.10-11.
E também são atribuídas ao Espírito Santo obras que somente Deus pode fazer como:
1. CRIAÇÃO – Gênesis 1.2; Jó 33.4; Salmo 104.30.
2. IMPLANTAÇÃO DA VIDA – Gênesis 2.7; Romanos 8.6.
3. INSPIRAÇÃO – 2 Samuel 23.2-3; 2 Pedro 1.21.


Devemos crer na Tri-unidade?
Uma pergunta emerge das páginas das Escrituras: “Devemos Crer em um Deus que consiste em mais de uma pessoa, ou devemos aceitar o politeísmo?” Tenho certeza que a Bíblia não ensina o politeísmo. É intransponível o abismo entre o ensina da tri-unidade de Deus e o conceito de muitas divindades. Acusar os cristãos de “triteísmo” é sem fundamento. O politeísmo ensina que os deuses são entidades independentes umas das outras, deuses que sempre entram em choque com outros deuses por seus próprios interesses, mas dentro da Tri-unidade, sempre há harmonia e unidade perfeitas.

Conclusão

O ponto de vista que tenho apresentado é importante para fortalecer a fé na doutrina da Triunidade. Enquanto imagino que é necessária uma plena compreensão da natureza de Deus para o exercício da fé, aí então, a verdade será abraçada com decisão, ao examinar as proposições em que a doutrina se expressa, fica inteligível a triunidade, e então a doutrina é recebida com alegria e fé inabalável.
Os vocábulo “trindade” e “tri-unidade”, não aparecem na Bíblia, e, por isso, existe uma certa objeção contra o seu uso. Outro fator de resistência é a forma filosófica com que a doutrina é apresentada, e essas explicações nem sempre têm dirimido as dúvidas, pelo contrário, muitas vezes as tem aumentado.
Na Patrística há muitos elementos sobre a “trinitas”, termo este, usado e inventado por um advogado líbio chamado Tertuliano, que em seus ensaios beirava perigosamente o “triteísmo”. Por isso, não vejo muita ajuda na patrologia para este assunto em particular, exceto claro, o tratado de Agostinho sobre a Trindade.
O ponto crucial do problema inteiro repousa, em última análise, sobre o impacto exercido pela vida e ministério de Jesus o Cristo, por mais de dois milênios. Ele tem cativado os corações humanos, e trem dominado a história a ponto de dividi-la em antes e depois de sua vida terrena.
A doutrina da Tri-unidade é um daqueles preciosos mistérios que desafiam a Teologia, e justamente por ser um mistério é que repousa no ser inescrutável de Deus, que não pode ser totalmente dissecado. E nem plenamente entendido.

NOTAS

1. Confissão de Westminster. Cap. 2, § 3, de Deus e Santíssima Trindade.
2. Teologia Sistemática, Louis Berkhof, São Paulo 2004: ed. Cultura Cristã, p.61.

3 . Jerusalém um cálice de tontear, Dave Hunt, Porto Alegre 1999: ed. Chamada da Meia Noite, p.234.

4 . apud. BARTMANN, Bernardo. Teologia dogmática. São Paulo: Paulinas, 1962, p. 271

5. Segunda confissão Helvética capítulo 3 – A Trindade.

6 .GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova, 1999, p.996.

BIBLIOGRAFIA

Confissão de Westminster. Cap. 2, § 3,

BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática, São Paulo, Cultura
Cristã: 2004, p.61.

HUNT, Dave. Jerusalém um cálice de tontear. Porto Alegre:
Chamada da Meia Noite, 1999, p.234.

BARTMANN, Bernardo. Teologia Dogmática, São Paulo:
Paulinas, 1962, p. 271.

Segunda Confissão Helvética – A Trindade.

GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova,
1999, p. 996.

segunda-feira, 4 de maio de 2009

A DOUTRINA DA ELEIÇÃO: DEUS REINA

INTRODUÇÃO

Parece haver na mente humana um arraigado preconceito contra a doutrina da eleição; entre todas as doutrinas bíblicas, algumas são simplesmente aceitas, outras são aceitas alegremente. Há, entretanto aquelas que são alvo de grande desconsideração e repúdio. Esse é o caso da doutrina da eleição.
Vejo em nosso solo pátrio uma perda de identidade, o início de um entorpecimento quanto à palavra de Deus e suas doutrinas sacrossantas. E, com relação ao pecado, quase tudo tem sido relativizado, e a imoralidade e a autojustificação inundam não somente a sociedade, isto é, o meio secular, mas também o seio da igreja brasileira. Embora tenhamos experimentado um crescimento avultado desde o início da década de 80, a qualidade dos crentes não tem mudado muito. A igreja “protestante” no ocidente parece que está vivendo o seu período medieval, onde as superstições, a imoralidade e a ignorância sobre a Bíblia andam de mãos dadas. Algumas doutrinas têm sido obscurecidas. Substituídas por “doutrinas enlatadas diet”, o cerne de toda a doutrina bíblica da salvação tem perdido o foco.
O crente aprende hoje que ele salva-se a si mesmo. Isso leva o homem a viver como bem entende, não adora mais a Deus; afinal, o que Deus faz, o faz por mera obrigação; caso contrário Ele é taxado de injusto.
O objetivo desta postagem é levar ao conhecimento da doutrina bíblica da eleição, em um momento crucial da atual história protestante, pois a Bíblia deve ocupar o lugar de primazia, e um ministro deve submeter-se a ela. Não nos compete usar a Bíblia como uma plataforma para apresentar um conjunto de ideias, mas como a autoridade que está acima de todo o nosso pensamento, considerando o fato de que a Bíblia se encontra em um plano mais elevado e algumas verdades contidas nela ultrapassam o nosso limitado entendimento.
Sabe-se que não se está sendo ensinado nada novo, mas sim as antigas e vigorosas verdades da Bíblia que, parece, foram esquecidas, daí o resultado que temos diante dos nossos olhos. Propõe-se uma volta às Escrituras Sagradas, e uma análise bíblica da questão. Não se tem a pretensão de esgotar o assunto, o presente trabalho é, na verdade, apenas um ensaio, pois muitos dos tópicos aqui apresentados dariam muitos volumes, se estudados minuciosamente, mesmo em separado.
Procuro usar a Bíblia para fundamentar aquilo que defendo, pois sei que a Bíblia é o juiz em toda e qualquer discussão teológica.
A Deus toda a glória!

ELEIÇÃO (DEFINIÇÃO)
“Eleição é o ato de Deus, pelo qual, em seu soberano agrado e não por mérito algum previsto nos homens, Ele escolhe alguns dos numerosos pecadores para serem os receptores da graça especial do seu Espírito e assim serem participantes voluntários da salvação de Cristo”. (1)
O PLANO DA SALVAÇÃO
O plano da salvação foi feito por Deus antes da fundação do mundo: “Assim como nos escolheu, nele, antes da fundação do mundo, parta sermos santos e irrepreensíveis perante ele; em amor” (Ef 1.4).
Visto que Deus, desde a eternidade passada, determina a redenção humana, ele determinou um plano para levar a cabo a salvação de seus eleitos. E, em Cristo, foram reunidos todos os objetos da redenção, quer no céu, quer na terra “de fazer convergir nele, na dispensação da plenitude dos tempos, todas as coisas, tanto as do céu como as da terra” (Ef 1.10). Mesmo sendo um mistério oculto em Deus (Ef 3.9), foi manifestada na plenitude dos tempos para que pela igreja seja revelada a multiforme sabedoria de Deus, aos principados e potestades nos lugares celestiais (Ef 3.10).
UM DECRETO REAL
Uma discussão teológica sobre a eleição, como uma obra de Deus, deve ter seu ponto de partida em Deus, tanto na obra de criação como na redenção. Gostaria de lembrar também que Deus, como o Deus da ordem, não faz coisas vagas, caóticas, desordenadas, não é pego de surpresa por nada, nem tampouco fica ansioso esperando um desenrolar de acontecimentos sobre os quais não tem poder para agir. Deus é Onipotente (detém todo o poder), é Onisciente (detém todo o saber) e Onipresente (enche toda a criação com a sua presença).
A teologia reformada dá ênfase à soberania de Deus. Desde toda a eternidade, o Senhor determinou tudo o que há de suceder, e executa a sua soberana vontade. “Nele, digo, no qual fomos também feitos herança, predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade” (Ef 1.11). Segundo o texto já citado, Deus faz todas as coisas segundo o conselho de sua vontade, ou seja, o que Deus decreta realmente acontecerá. Por isso devemos começar a análise pelos decretos de Deus.
Sem dúvida, a doutrina dos decretos é uma doutrina controvertida, isto porque não tem sido estudada devidamente, somente depois de que “a alma do cristão tem por coisa certíssima de que nada acontece ao acaso, nem a felicidade, senão que tudo acontece pela providência e ordenação de Deus, porá sempre seus olhos nEle como causa principal de todas as coisas” (2); então pode-se entender o plano de Deus, incluindo os seus decretos.
Segundo Hodge “Um plano pressupõe: 1 - A seleção de algum fim ou objetivo concreto a ser levado a bom termo. 2 - A escolha de meios apropriados. 3 - Ao menos no caso de Deus, a aplicação eficaz desses meios para atingir o fim proposto” (3)
Concernente aos decretos de Deus para a eleição, a Confissão de Westminster, Capítulo III, define:
“§I. Desde toda a eternidade, Deus, pelo mui sábio e santo conselho da sua própria vontade, ordenou livre e inalteravelmente tudo quanto acontece, porém de modo que nem Deus é o autor do pecado, nem violentada é a vontade da criatura, nem é tirada a liberdade ou contingência das causas secundárias, antes estabelecidas... §II. Ainda que Deus sabe tudo quanto pode ou há de acontecer em todas as circunstâncias imagináveis, ele não decreta coisa alguma por havê-la previsto como futura, ou como coisa que havia de acontecer em tais e tais condições... §III. Pelo decreto de Deus e para manifestação da sua glória, alguns homens e alguns anjos são predestinados para a vida eterna e outros preordenados para a morte eterna” (4).

A BASE DO DECRETO
ANTIGO TESTAMENTO
No antigo Testamento temos algumas palavras que denotam bem a idéia de um decreto, como a palavra: ’etsah, ‘aconselhar’, ‘dar aviso’: “Este é o desígnio que se formou concernente a toda a terra; esta é a mão que está estendida sobre todas as nações. Porque o Senhor dos Exércitos o determinou; quem, pois, o invalidará? A sua mão está estendida; quem, pois, a fará voltar atrás?” (Isaías 14.26,27).
“O conselho do Senhor dura para sempre; os desígnios do seu coração, por todas as gerações" (Salmo 33.11). “Que chamo a ave de rapina desde o oriente e de uma terra longínqua, o homem do meu conselho. Eu o disse, eu também o cumprirei; tomei esse propósito, também o executarei (Isaías 46.11)”. Mezimmah (5), ‘ter em mente’, ‘propor-se a’: “Por isso, a terra pranteará, e os céus acima se enegrecerão; porque falei, resolvi e não me arrependo, nem me retrato (Jeremias 4.28)”. Também o termo chaphets (6), ‘inclinação’, ‘vontade, ‘beneplácito’: “Todavia, ao Senhor agradou moê-lo, fazendo-o enfermar; quando der ele a sua alma como oferta pelo pecado, verá a sua posteridade e prolongará os seus dias; e a vontade do Senhor prosperará nas suas mãos (Isaías 53.10)”.

NOVO TESTAMENTO
O Novo Testamento, à semelhança do Antigo (Testamento), também tem termos que designam a idéia de decreto. A primeira, tendo também suas variantes, é: boule (7): que denota ‘conselho’, ‘desígnio’, ‘propósito’; uma variante de boule é boulenomai (8): ‘delibero consulto, proponho, quero fortemente; e a última variante é boulomai (9): ‘quero’, ‘desejo’, ‘tenciono’, ‘resolvo’: “Sendo este entregue pelo determinado desígnio e presciência de Deus, vós o matastes, crucificando-o por mãos de iníquos (Atos 2.23)”. “Para fazerem tudo o que a tua mão e o teu propósito predeterminaram (Atos 4.28)”. “Por isso, Deus, quando quis mostrar mais firmemente aos herdeiros da promessa a imutabilidade do seu propósito, se interpôs com juramento (Hebreus 6.17)”.
Outro vocábulo é thelema (10), que dá ênfase à vontade de Deus: “Nele, digo, no qual também fomos feitos herança, predestinados segundo o propósito daquele que faz todas as coisas conforme o conselho da sua vontade (Efésios 1.11)”. Temos finalmente o termo eudokia (11), ‘agrado’, ‘prazer’ que atenua a liberdade do propósito de Deus: “Sim, ó Pai, porque assim foi do Teu agrado” (Mateus 11.26). “Glória a Deus nas maiores alturas e paz na terra entre os homens a quem ele quer bem (Lucas 2.14)”. “Nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo, segundo o beneplácito de sua vontade (Efésios 1.5)”. “Desvendando-nos o mistério da sua vontade, segundo o seu beneplácito que propusera em Cristo (Efésios 1.9)”.

A NATUREZA DO DECRETO
O nosso conhecimento das ordens das coisas é sucessivo; aprendemos uma coisa, depois outra. Com Deus não é assim, Ele não aprendeu de ninguém: “quem é o seu conselheiro?” (Isaías 40.14,15). O conhecimento de Deus é de todo imediato e simultâneo, e sua compreensão é sempre completa. Assim como Deus é imutável, o seu decreto também o é, e abrange tudo o que se passa, tanto as coisas diminutas quanto as grandes.

QUANTO A SUA NATUREZA, O DECRETO DE DEUS É:
A. ETERNO
“E manifestar qual seja a manifestação do mistério, desde os séculos, oculto em Deus, que criou todas as coisas” (Efésios 3.9).
O decreto de Deus esteve oculto durante eras na mente do Senhor, e foi revelado no tempo. Nesse decreto, estava incluída a salvação de todos os eleitos: “Assim como nos escolheu, nele, antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis perante ele; em amor” (Efésios 1.4).

B. IMUTÁVEL
O decreto de Deus está firmado na base da imutabilidade de Deus, e essa é a nossa confiança, que tudo o que Ele decidiu Ele consumará “Mas, se Ele resolveu alguma coisa, quem o pode dissuadir? O que Ele deseja, isso fará (Jó 23.13)”. Jó estava bem ciente da imutabilidade dos projetos de Deus em sua vida “Pois Ele cumprirá o que está ordenado a meu respeito e muitas coisas como estas ainda tem consigo (Jó 23.14)”.
O que seria de nós se dependesse de nós mesmos a firmeza de nossa própria salvação? Seria sem dúvida alguma um caos e uma desesperança total. No entanto, a nossa santíssima salvação está além de nossas forças; ela depende não de criaturas falíveis e suscetíveis à sua própria natureza corrupta e enganadora, como os homens (Jeremias 17.9), mas é uma obra realizada unicamente por Deus, que não muda: “O conselho do Senhor dura para sempre; os desígnios do seu coração, por todas as gerações (Salmo 33.11)”.
O maior gozo do cristão reformado é dar glória a Quem ela pertence, a Deus. Pois mesmo que passem os séculos e as gerações, o conselho do Senhor permanecerá de pé (Isaias 46.10). A sua vontade se cumprirá, total e plenamente (Lucas 22.22; Atos 2.23).
“Esta eleição é o imutável propósito de Deus, pelo qual ele, antes da fundação do mundo, escolheu um número grande e definido de pessoas para a salvação, por graça pura. Estas são escolhidas de acordo com o soberano bom propósito de sua vontade, dentre todo o gênero humano, decaído pela sua própria culpa de sua integridade original para o pecado e perdição[...] como Deus é supremamente sábio, imutável, onisciente, e todo poderoso, assim sua eleição não pode ser cancelada e depois renovada, nem alterada, revogada ou anulada; nem mesmo podem os eleitos ser rejeitados, ou o número deles ser diminuído”.(12)
C. EFICAZ
Aquilo que Deus decretou certamente irá se cumprir “Muitos desígnios há no coração do homem, mas o conselho do Senhor permanecerá (Provérbios 19.21)”. “Por isso é que eu também me afadigo, esforçando-me o mais possível, segundo a sua eficácia que opera eficientemente em mim (Colossenses 1.29)”.
“De acordo com A.A. Hodge, o decreto providencia em cada caso que o evento será efetuado por causas que agirão de maneira perfeitamente coerente com a natureza do evento em questão. Assim, no caso de todo o ato livre de um agente moral, o decreto prevê ao mesmo tempo – (a) Que o agente seria um agente livre. (b) Que os seus antecedentes e todos os antecedentes do ato em questão seriam o que são. (c) Que todas as presentes condições do ato seriam o que são. (d) Que o ato seria perfeitamente espontâneo e livre, da parte do agente. (e) Que certamente seria um ato futuro. (Salmo 33.11; Provérbios 19.21; Isaías 46.10) (13)”.
D. UNIVERSAL
O decreto de Deus é universal, porque ele inclui tudo o que se passa no mundo “Para sempre, ó Senhor a tua palavra está firmada no céu. A tua fidelidade estende-se de geração em geração; fundaste a terra, e ela permanece. Conforme os teus juízos, assim tudo se mantém até hoje; porque ao teu dispor estão todas as coisas (Salmo 119.89-91)”.
E. CONCERNENTE AO PECADO, PERMISSIVO.
O decreto de Deus, concernente ao pecado, é permissivo, isto é, Deus sabia que o homem iria pecar, mesmo assim Deus determinou não impedir a autodeterminação pecaminosa do homem. “Concedeu-lhes o que pediram, mas fez definhar-lhes a alma (Salmo 106.15)”. “Então comeram e se fartaram a valer; pois lhes fez o que desejavam. Porém não reprimiram o apetite. Tinham ainda na boca o alimento, quando se elevou contra eles a ira de Deus e entre os seus mais robustos semeou a morte. E prostrou os jovens de Israel, sem embargo disso continuaram a pecar e não creram nas suas maravilhas (Salmo 78.29-32)”.
“Podemos concluir que a decisão de Deus de permitir que o pecado entrasse no mundo foi uma boa decisão. Isso não quer dizer que o nosso pecado seja uma boa coisa, mas meramente que a permissão de Deus para que pequemos, o que é mau, é uma boa coisa. Que Deus permita o mal é bom, mas o mal que ele permite ainda é mau. O envolvimento de Deus em tudo isso é perfeitamente justo. Nosso envolvimento nisso é mau. O fato de ter Deus decidido permitir que pecássemos não nos absolve de nossa responsabilidade pelo pecado (14)”.

ELEIÇÃO PROPRIAMENTE DITA:
DEUS É O AUTOR DA ELEIÇÃO
Acabamos de estudar os decretos de Deus, e indubitavelmente temos em Deus o Pai o autor da eleição: “Manifestei o teu nome aos homens que me deste no mundo. Eram teus, tu mos confiaste, e eles têm guardado a tua palavra. É por eles que eu rogo; não rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus (João 17.6,9)”.
A eleição tem unicamente em Deus, e aqui me refiro ao Deus Trino, o seu efeito salvífico levado a cabo. A doutrina da eleição tem sido rejeitada por não admitir ajuda humana, contribuição externa, isto é, fora da Deidade; por esse motivo, ela tem sido tão desprezada e vilipendiada. Calvino já dizia:
“Jamais nos convenceremos como se deve de que nossa salvação procede e mana da fonte da gratuita misericórdia de Deus, no entanto não havemos compreendido sua eterna eleição, pois ela por comparação nos ilustra a graça de Deus, enquanto que não adota indiferentemente a todos os homens a esperança da salvação, senão que a uns dá o que a outros nega” (15).
Deus, como autor da eleição, merece toda a glória e honra, pois o homem é salvo, não por alguma coisa boa em si, pois não a tem, mas unicamente pela vontade Divina. Não por alguma coisa prevista nele, pois seria o princípio de uma salvação por obras e não por favor imerecido. Se alguém perguntasse: Por que Deus escolhe uns e deixa os demais mortos em seus pecados? Qual é o motivo da escolha Divina? Então responder-se-ia simplesmente: não se sabe. Pois isso não é revelado e, portanto pertence unicamente a Deus (Deuteronômio 29.29).
Sabe-se, no entanto que Deus escolhe alguns, e esses escolhidos, sem sombra de dúvida, estão seguros nas mãos de Deus, o autor da eleição. “As minhas ovelhas ouvem a minha voz; e eu as conheço, e elas me seguem. Eu lhes dou a vida eterna; jamais perecerão e ninguém as arrebatará da minha mão. Aquilo que meu Pai me deu é maior do que tudo; e da mão do Pai ninguém pode arrebatar (João 10.27-29)”.

HOMEM, O OBJETO DA ELEIÇÃO.
O ser humano é o objeto da eleição, como já se disse anteriormente. A razão pela qual Deus escolhe a uns e deixa a outros, não se sabe, mas cabe dizer que ele não o faz com base em uma fé prevista, pois aí a salvação se inverteria, não seria uma salvação de cima para baixo (de Deus ao homem), mas de baixo para cima (começando no homem), o que logicamente seria um absurdo. A eleição pode ser bem ilustrada na história de Ezequiel que diz:
“Quanto ao teu nascimento, no dia em que nasceste, não te foi cortado o umbigo, nem foste lavada com água para te limpar, nem esfregada com sal, nem envolta em faixas. Não se apiedou de ti olho algum, para te fazer alguma destas coisas, compadecido de ti; antes, foste lançada em pleno campo, no dia em que nasceste, porque tiveram nojo de ti. Passando eu por junte de ti, vi-te a revolver-te no teu sangue e te disse: ainda que estás no teu sangue, vive[...] Então te lavei com água, e te enxuguei do teu sangue, e te ungi com óleo. Também te vesti com roupas bordadas, e te calcei com couro da melhor qualidade, e te cingi de linho fino, e te cobri de seda. Também te adornei com enfeites e te pus braceletes nas mãos e colar a roda de teu pescoço. Coloquei-te um pendente no nariz, arrecadas nas orelhas e linda coroa na cabeça (Ezequiel 16.4-6, 9-12)”.
Este relato de Ezequiel é a manifestação da graça de Deus e um tipo da eleição. Essa descrição do filho, rejeitado, em Ezequiel, é uma descrição de Israel, mas que também revela a graça eletiva de Deus. Israel não foi escolhido pelo Senhor por causa do grande número, pois era um povo pequeno, também não foi por sua força, pois era um povo fraco, por que então Deus o escolheu? Apenas uma resposta satisfaz, Deus escolheu por que ele quis, “segundo o beneplácito da sua vontade”.
Mas vamos mais adiante, pela formosura? Não. A descrição diz:
A criança estava suja (envolta em teu próprio Sangue).
Era repugnante ao olhar (não se apiedou de ti olho algum, para te fazer alguma dessas coisas).
Estava à sua própria sorte.
Deus a encontra e muda a sua sorte (olhou, cuidou, criou).
À semelhança desta criança de Ezequiel, nós também estávamos sujos pelos nossos pecados “Pois todos pecaram e carecem da glória de Deus” (Romanos 3.23). Mas afinal de contas como o homem ficou sujo? A Bíblia diz: “Portanto, como por um só homem entrou o pecado no mundo, e pelo pecado, a morte, assim também a morte passou a todos os homens, porque todos pecaram” (Romanos 5.12). “A morte veio por um homem” (1 Coríntios 15.21), e em Adão todos morrem (1Coríntios 15.22).
Romanos, diz que por um homem entrou a morte, o pecado e a condenação ao mundo, isto é, a todos os seres humanos. Em Gênesis 2.17 está escrito “mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás; porque, no dia que dela comeres, certamente morrerás”. Esta ordem foi dada a Adão (16).
Adão foi o nosso representante legal diante de Deus, e, com isso, no pecado de Adão todos foram constituídos pecadores por sua transgressão. Esta é a idéia que está na mente do Apóstolo Paulo quando ele argumenta sobre Cristo ser nosso único representante perfeito, e ele apresenta Jesus Cristo, o segundo Adão (Romanos 5.12-19).
Adão, com a queda, morre espiritualmente e essa morte espiritual passa a toda a sua descendência. “Como está escrito: não há um justo, nem um sequer” (Rm 3.10). “Depois de havendo a concupiscência concebida, dá à luz o pecado; e o pecado sendo consumado, gera a morte” (Tg 1.15). “E vos vivificou, estando vós mortos em ofensas e pecados” (Ef 2.1). “E, quando vós estáveis mortos nos pecados e na incircuncisão da vossa carne, vos vivificou juntamente com ele, perdoando-vos todas as ofensas” (Cl 2.13). “Jesus, porém disse-lhe: segue-me e deixa aos mortos sepultar os seus mortos” (Mt 8.22). “... Eu sei as tuas obras, que tens nome de que vives e estás morto” (Ap 3.1).
Comentando sobre Romanos 3.10, R.C. Sproul diz:
“No jardim do Éden, quando o pecado entrou no mundo, quem se escondeu? Jesus veio ao mundo para buscar e para salvar os perdidos. Não era Jesus quem se escondia. Deus não é um fugitivo”.
Nós somos daqueles que estão fugindo. A Escritura declara que o ímpio foge sem que nenhum homem o persiga. Como mencionou Lutero: ‘o pagão treme ao barulho de uma folha’. O ensino uniforme da Escritura é que os homens decaídos estão fugindo de Deus. "Não há nenhum que busque a Deus" (17).
O homem está morto espiritualmente, e totalmente depravado, por natureza o ser humano não busca a Deus, mas os seus próprios interesses (Romanos 3.11; Filipenses 2.21).
Por natureza, o homem está separado de Deus, pois o pecado de Adão, que era o representante legal da humanidade, assim o fez: o homem seria capaz de conhecer o bem e o mal, mas incapaz de fazer o bem e seria dominado pelo mal, assim sua natureza o arrasta para o pecado. “Pois são os pecados de vocês que os separam do seu Deus, são as suas maldades que fazem com que Ele se esconda de vocês e não atenda as suas orações” (Isaías 59.2, NTLH).
A Bíblia diz: “Todos pecaram e estão afastados da presença gloriosa de Deus” (Romanos 3.23).
Frequentemente, os líderes religiosos não gostam de falar sobre o pecado, porque o assunto é impopular. Mas João disse: “Toda maldade é pecado” e “Quem peca é culpado de quebrar a lei de Deus, porque o pecado é a quebra da lei” (1João 5.17; 3.4, NTLH).
A Bíblia define claramente os pecados que violam o tipo de vida que Deus quer, trazendo condenação àqueles que vivem na prática do pecado.
Jesus disse: “Porque é de dentro, do coração, que vêm os maus pensamentos, a imoralidade sexual, os roubos, os crimes de morte, os adultérios, a avareza, as maldades, as mentiras, as imoralidades, a inveja, a calúnia, o orgulho e o falar e agir sem pensar nas conseqüências. Tudo isso vem de dentro e faz com que as pessoas fiquem impuras” (Marcos 7.21-23).
Segue abaixo outra lista que caracteriza as ações do homem, o objeto da eleição Divina.
“Estão cheios de todo o tipo de perversidade, maldade, ganância, vícios, ciúmes, crimes de morte, brigas mentiras e malícia. Caluniam e fazem mal uns dos outros, tem ódio de Deus e são atrevidos, vaidosos. Inventam maneiras de fazer o mal, desobedecem aos pais, são imorais, não cumprem a palavra, não tem amor por ninguém e não tem pena dos outros. Eles sabem o mandamento de Deus que aqueles que fazem essas coisas merecem a morte. Mas mesmo assim continuam a fazê-las e, pior ainda, aprovam os que fazem as mesmas coisas que eles fazem” (Romanos 1.29-32).
Paulo nos oferece ainda outra lista:
“Vocês sabem que os maus não terão parte no Reino de Deus. Não se enganem, pois os imorais, os que adoram ídolos, os adúlteros, os homossexuais, os ladrões, os avarentos, os bêbados, os caluniadores e os assaltantes não terão parte no Reino de Deus” (1Coríntios 6.9-10)
Há, ainda, esta definição feia da natureza humana:
“As coisas que a natureza humana produz são bem conhecidas. Elas são: a imoralidade sexual, a impureza, as ações indecentes, a adoração de ídolos, as feitiçarias, as inimizades, as brigas, as ciumeiras, os acessos de raiva, a ambição egoísta, a desunião, as divisões, as invejas, as bebedeiras, as farras e outras coisas parecidas com essas. Repito o que já disse: os que fazem essas coisas não receberão o Reino de Deus” (Gálatas 5.19-21).
Deus promulgou os dez mandamentos, e então estabeleceu sua lei de que “a alma que pecar, essa morrerá” (Ezequiel 18.4) e “Porque quem quebra um só mandamento da lei é culpado de quebrar todos” (Tiago 2.10).
Por isso a Escritura encerrou tudo sob o pecado (Gálatas 3.22) e “se dissermos que não temos pecado nenhum, a nós mesmos nos enganamos, e a verdade não está em nós” (1João 1.8). “Pois quem pode dizer: purifiquei o meu coração, limpo estou do pecado?” (Provérbios 20.9).
“Todos nós andávamos desgarrados como ovelhas, cada um se desviava pelo seu próprio caminho” (Isaías 53.6) e “todos nós somos como o imundo, e todas as nossas justiças como trapo de imundícia” (Isaías 64.6).
Do céu olha o Senhor para os filhos dos homens, para ver se há quem entenda, se há um que busque a Deus. Todos se extraviaram, e juntamente se corromperam. Não há quem faça o bem, não há um sequer (Salmo 14.2-3).
Seja, portanto, honesto diante de Deus. Conforme disse Davi: “Se tu tivesses feito uma lista dos nossos pecados, quem escaparia da condenação?” (Salmo 130.3). “Quem continua pecando pertence ao Diabo porque o Diabo peca desde a criação do mundo...” “O Senhor conhece os pensamentos do homem, que são pensamentos vãos” (Salmo 94.11). “Enganoso é o coração, mais do que todas as coisas, e desesperadamente corrupto, quem o conhecerá?” (Jeremias 17.9). “Pois antigamente nós mesmos não tínhamos juízo e éramos escravos das paixões e dos prazeres de todo o tipo e passávamos a nossa vida no meio da malícia e da inveja. Os outros tinham ódio de nós, e nós tínhamos ódio deles”. (Tito 3.3). “Por isso as pessoas que tem a mente controlada pela natureza humana se tornam inimigas de Deus, pois não obedecem as leis de Deus e, de fato não podem obedecer a ela. As pessoas que vivem de acordo com a sua natureza humana não podem agradar a Deus” (Romanos 8.7-8).
Vê-se, portanto, que a natureza inconversa dos homens e das mulheres não é muito atraente, e precisamos compreender totalmente esse fato. Esses textos mostram a natureza hedionda e repulsiva da natureza humana caída. O Catecismo de Heidelberg na pergunta 6 faz a indagação que muitos devem estar se fazendo ainda: “Criou, pois, Deus o homem tão mau e perverso?”. A resposta define-se da seguinte maneira: “Não, ao contrário, Deus criou o homem bom fazendo-o à sua imagem e semelhança, é dizer, em verdadeira justiça e santidade, para que retamente conhecesse a Deus seu criador, lhe amasse de todo o coração, e bem aventurado vivesse com Ele eternamente, para louvá-lo e glorificá-lo” (18). Na pergunta 7, indaga-se: “De onde procede esta corrupção da natureza humana?” e a resposta do Catecismo define: “Da queda e desobediência de nossos primeiros pais Adão, e Eva, no paraíso, por isso, nossa natureza há caído de tal maneira corrompida, que todos somos concebidos e nascidos em pecado” (19).
“Somos tão corrompidos que somos totalmente incapazes de fazer o bem e inclinados a todo o mal? Certamente, se não temos sido regenerados pelo Espírito Santo” (20).
O câncer do pecado já corroeu todas as fibras da sociedade. O homem e a mulher, sem o conhecimento de Jesus Cristo, estão perdidos – totalmente perdidos – vivem sujeitos à justa pena final da perdição.
“Porque o salário do pecado é a morte” (Romanos 6.23). “A alma que pecar, essa morrerá” (Ezequiel 18.4). “Ao irmão, verdadeiramente, ninguém o pode remir, nem pagar por ele a Deus o seu resgate” (Salmo 49.7). “Nem a sua prata nem o seu ouro os poderão livrar no dia da indignação do Senhor” (Sofonias 1.18). O ser humano está tão corrompido que é totalmente incapaz de fazer o bem e inclinado a todo o mal? Certamente, se não é regenerados pelo Espírito de Deus.
Quando alguém resolve por conta própria que sua própria justiça e sua própria honestidade bastam – que é capaz de ficar em pé diante de Deus, baseado nos méritos da sua própria bondade e honra, está repudiando a misericórdia e a graça de Deus, chamando-O de mentiroso de modo direto e dizendo: "tudo bem, eu posso me salvar, afinal de contas eu não sou tão mau assim, tenho livre-arbítrio, sou deus e tudo depende de mim, até mesmo Deus, pois ele está sujeito à minha vontade, que é soberana."
Por mais absurda que seja esta declaração, ela tem sido lançada aos quatro ventos pelos arminianos, veja-se as obras comuns que eles usam. Norman Geisler, por exemplo, coloca adjetivos em Spurgeon chamando-o de “Calvinista radical”, em R.C. Sproul de “Calvinista extremado” (21). A isso deixo a Antiguidade responder a Geisler: “...O Senhor está presente onde é anunciada a soberania do Senhor” (22).
O maior reforço que a religião poderia ter na atualidade seria a volta à crença antiga na soberania de Deus; isto porque há grande falta de convicção de pecado e de culpa, e ainda permanecem o orgulho e a falta de vontade em submeter-se a Deus. Em tudo isso, pode-se ver a mão sinistra do arminianismo, que não é teologia, mas antropologia, pois o início e o fim da salvação está no homem. Todo o ser humano é pecador por natureza, assim também todo o ser humano é arminiano naturalmente, até que Deus lhe abra os olhos.

O QUE DEUS FEZ PARA NOS LIVRAR DA NOSSA JUSTA CONDENAÇÃO?
ELE NOS ESCOLHEU.
Como já vimos o homem não tem nada a oferecer a Deus pela sua salvação, aliás, o homem é incapaz de fazer o bem e está morto espiritualmente, incapaz de buscar a Deus, então o que fez Deus? Determinou de antemão quem seria salvo.
Enviou seu filho (João 3.16) .
O Filho veio ao mundo para salvar pecadores (1Timóteo 1.15).
Jesus foi entregue pelas nossas transgressões e ressuscitou por causa da nossa justificação (Romanos 4.25).
Quando o Apóstolo Paulo e também Barnabé começaram a pregar o Evangelho aos gentios, todos se alegraram: “E os gentios ouvindo isto, alegraram-se e glorificavam a palavra do Senhor, e creram todos quantos estavam ordenados para a vida eterna” (Atos 13.48). Somos levados a perguntar, quantos creram? A resposta é do texto bíblico: “todos quantos estavam destinados para a vida eterna”.
Em Romanos 8.28-30, está escrito: “E sabemos que todas as coisas contribuem juntamente para o bem daqueles que amam a Deus, daquele que são chamados pelo seu decreto. Porque os que dantes conheceu, também os predestinou para serem conforme a imagem de seu filho, a fim de que ele seja o primogênito entre muitos irmãos. E aos que predestinou, a esses também chamou, a esses também justificou, e aos que justificou, a esses também glorificou”.
Quando Deus escolheu Jacó, e aborreceu a Esaú, a Bíblia declara que não foi por alguma coisa que eles tivessem feito, pois ainda não tinham nascido, mas para que o propósito da eleição prevalecesse, Deus escolheu a Jacó (uma pessoa) e rejeitou a Esaú (outra pessoa). Passemos ao texto: “Porque, não tendo ainda nascido, nem tendo feito bem ou mal (para que o propósito de Deus segundo a eleição ficasse firme, não por causa das obras, mas por aquele que chama), foi-lhe dito a ela: o maior servirá o menor. Como está escrito: Amei Jacó e aborreci Esaú” (Romanos 9.11-13).
Outro fato importante de ser notado é que em Romanos 11.7, falando-nos sobre a eleição assim declara a Sagrada Escritura: “Pois quê? O que Israel buscava não o alcançou; mas os eleitos o alcançaram, e os outros foram endurecidos”. Neste texto o Apóstolo Paulo mostra dois tipos de pessoas: (a) os eleitos e (b) os endurecidos. Os primeiros foram salvos porque a eleição os alcançou, e obtiveram a salvação tão almejada. Enquanto os demais não foram salvos porque não foram eleitos, mas endurecidos.

A ESCOLHA FOI FEITA NA ETERNIDADE PASSADA
A Bíblia declara que Deus nos escolheu antes da fundação do mundo (Efésios 1.4-6). E essa escolha foi feita a fim de sermos para o louvor de sua glória, nós, os que de antemão esperamos em Cristo (Efésios 1.12).
Cristo é declarado em Apocalipse: “Cordeiro morto desde a fundação do mundo” (Apocalipse 13.8).
“Deus vos escolheu desde o princípio para a salvação...” (2Tessalonisensses 2.13). “Que nos salvou e chamou com uma santa vocação; não segundo as nossas obras, mas segundo o seu próprio propósito e graça que nos foi dada em Cristo Jesus, antes dos tempos dos séculos” (2Timóteo 1.9). Neste texto a ARA traduz “antes dos tempos eternos”
“John Newton costumava contar uma parábola sobre uma boa mulher que, de modo a provar a doutrina da eleição, dizia: "Ah! meu caro, o Senhor deve ter me amado antes de eu nascer, ou caso contrário Ele não teria visto nada em mim para amar depois” (23).

A ELEIÇÃO É MOTIVO DE ALEGRIA
“Porque, se eu cresse no que alguns pregam sobre uma salvação temporária, e sem importância, que somente dura por um tempo, eu raramente seria grato por ela, se é que seria; mas quando sei que aqueles que Deus salva, Ele os salva com uma salvação eterna, quando sei que Ele lhes dá uma justiça eterna, quando eu sei que Ele os assenta em uma fundação eterna de amor eterno, e que Ele os trará ao Seu reino eterno, oh, então me admiro, e me surpreendo pelo fato de uma bênção tal como esta tenha, em algum momento, sido dada a mim!” (24).

“A doutrina da eleição confere-nos humildade diante de Deus para pensar dessa forma. Faz-nos perceber que não temos direito algum à graça de Deus. Nossa salvação deve-se tão somente à graça. Nossa única resposta apropriada é dar eterno louvor a Deus” (25).

CONCLUSÃO

A eleição trata, não somente de criaturas, mas de pecadores culpados e condenados. Que qualquer um deve ser salvo é matéria de pura graça e aqueles que não estão incluídos neste propósito da salvação sofrem apenas a recompensa devida aos seus atos. Não há, portanto, nenhuma injustiça na eleição de Deus. Podemos melhor louvar o Deus que salva alguns do que acusá-lo de injustiça porque ele salva tão poucos. A todos os homens, salvos ou não, Deus pode dizer: “Amigo não te faço injustiça [...] ou não me é licito fazer o que eu quero com que é meu?” (Mateus 20.13,15).

NOTAS:
1 – STRONG, A.H. Teologia Sistemática: eleição. São Paulo: HAGNOS, 2003. Vol. II, p. 472.
2 – CALVINO, João. Institución de la religión cristiana. Barcelona: FELiRE, 5ª edicion 1999. vol I, p 140.
3 – HODGE, Charles. Teologia Sistemática: soteriologia. São Paulo: HAGNOS. 2001 p. 717.
4 – Confissão de Westminster, Os decretos de Deus.
5 – BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. São Paulo: Cultura Cristã, 2001. p. 96.
6 – Ibidem.
7 – Ibidem.
8 – TAYLOR, W.C. Dicionário do Novo Testamento Grego. Rio de Janeiro: JUERP, 1991. p. 46.
9 – VINE, W. E., UNGER, Merril. F., JR, William White. Dicionário Vine. Rio de Janeiro: CPAD, 2002. p. 920.
10 – TAYLOR, W.C. Dicionário do Novo Testamento Grego. Rio de Janeiro: JUERP, 1991. p. 46.
11 – Ibidem
12 – Os Cânones de Dort. Eleição e reprovação. Cap 1.§7 e §11, (www. Confissões reformadas.com.br).
13 – A.A. HODGE apud BERKHOF, Teologia Sistemática. São Paulo: Cultura Cristã 2001. p. 99.
14 – SPROUL, R.C, Eleitos de Deus. São Paulo: Cultura Cristã 2002. p. 22.
15 – CALVINO, João. Institución de la religión cristiana. Barcelona – Espanha: FELiRE 5ª edição 1999. Tomo II. p. 724. (tradução do autor).
16 - As palavras homem e Adão tem o mesmo sentido em hebraico ‘Adam’, que assemelha-se a palavra ‘adamah’ (nota sobre Gênesis 2.7 da Bíblia Shedd).
17 – SPROUL, R. C. Eleitos de Deus. São Paulo: Cultura Cristã 2002. p. 80.
18 – JANSE, J. C. Catecismo de Heidelberg, la confesión de la iglesia según las Sagradas Escrituras. Barcelona, Espanha: FELiRE 2000. p. 16
19 – Ibidem.
20 – Ibidem.
21 – GEISLER, Norman. Eleitos, mas livres. São Paulo: Vida 2005. p. 100.
22 – DIDAKÉ. O catecismo dos primeiros cristãos para as comunidades de hoje. São Paulo: Paulus 9ª edição 1989. p. 13.
23 – JOHN NEWTON Apud SPURGEON, C.H. Uma defesa do calvinismo, tradução de Walter Andrade Campelo http://www.cbb.org.br/
24 – Op. Cit.
25 – GRUDEM, Wayne. Teologia Sistemática. São Paulo: Vida Nova 1999. p. 575.

BIBLIOGRAFIA

1 – STRONG, A.H. Teologia Sistemática: eleição. São Paulo: HAGNOS, 2003.
2 - CALVINO, João. Institución de la religión cristiana. Barcelona: FELiRE, 5ª edicion 1999.
3 – HODGE, Charles. Teologia Sistemática. São Paulo: HAGNOS. 2001.
4 – Confissão de Westminster. Os decretos de Deus.
5 – BERKHOF, Louis. Teologia Sistemática. São Paulo: Cultura Cristã, 2001.
6 – TAYLOR, W.C. Dicionário do Novo Testamento Grego. Rio de Janeiro: JUERP, 1991.
7 – VINE, W. E., UNGER, Merril. F., JR, William White. Dicionário Vine. Rio de Janeiro: CPAD, 2002.
8 – Os Cânones de Dort. (www.confissoesreformadas.com.br).
9 – SPROUL, R.C. Eleitos de Deus. São Paulo: Cultura Cristã 2002.
10 – BÍBLIA SHEDD. São Paulo: Vida Nova 1998.
11 – JANSE, J. C. Catecismo de Heidelberg, la confesión de la iglesia según las Sagradas Escrituras. Barcelona, Espanha: FELiRE 2000.
12 – GEISLER, Norman. Eleitos, mas livres. São Paulo: Vida, 2005.
13 – DIDAKÉ. O catecismo dos primeiros cristãos para as comunidades de hoje. São Paulo: Paulus 9ª edição 1989.
14 – SPURGEON, C.H. Uma defesa do calvinismo, tradução de Walter Andrade Campelo http://www.cbb.org.br/.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

QUEM NÃO PRECISA DE TEOLOGIA?

“O homem não sabe em que lugar colocar-se. Está visivelmente perdido e caiu de seu lugar sem conseguir reencontrá-lo. Busca-o por toda parte com inquietação e sem êxito em meio a trevas impenetráveis”. (1) Blaisé Pascal.
“O fim de um teólogo não é deleitar ouvidos, com arguir loquazmente, mas firmar as consciências, em ensinando o verdadeiro, o certo, o proveitoso.” (2) João Calvino.

Lembro de conhecer alguns indivíduos que sentem verdadeiro pavor à Teologia, para eles é até pecaminoso estudar Hermenêutica, Exegese, Homilética e etc... O que dá “IBOPE” (segundo tais pessoas) é ter um grupo musical que execute bem as músicas “gospel” do momento. Nada de pregar sobre: arrependimento; santificação; testemunho cristão, nem pensar em pregar as doutrinas da Graça - aliás, quanto às doutrinas, não se deve nem pensar nelas, quanto mais pregá-las. Este é o espírito anti-dogmático da parcela brasileira da igreja dita “evangélica” que não está nem aí para a Teologia.
Já ouvi certo cidadão dizer que não suporta Teólogos, pois estes já lhe deram muitos problemas. Alguém poderia pensar que Teólogos são pessoas intransigentes, carrancudas e promotoras de divisão, por isso causam problemas. No entanto o que foi constatado é que os problemas que os pobres difamados, que gastam de 4 anos e meio a 9 anos estudando as Escrituras (somente estudo formal acadêmico, a maioria dos Teólogos, no entanto, estuda a vida inteira) causam, é confrontar pessoas que usam “O Príncipe” de Maquiavel como seu próprio texto “teológico”, aprendendo assim através deste piedoso modo de viver e pensar, (nunca, nunca ensinar), para então conduzir seu “Movimento dos Sem Bíblias” da forma como bem entendem.
Surge então a pergunta, quem precisa de Teologia? O que importa é fazer a obra do Senhor. Dizem eles: na verdade, discussões sobre assuntos dogmáticos devem ser descartadas, pois não trazem edificação, temos que ser espirituais, e pessoas espirituais, não lêem livros como: O velho Hodge, menos ainda Franklin Ferreira, tão pouco se familiarizaram com João Bunyan. Estas leituras são para os não-espirituais. Disse certo homem um dia: Não formamos teólogos, formamos obreiros. Quero discorrer sobre isso, enfatizando que algumas pessoas não precisam de Teologia para o que fazem, nem para o que pretendem fazer, sobre isso discorro agora:

Quem não precisa de Teologia?

Os Falsos Apóstolos
Os “Apóstolos” de hoje sentir-se-iam ofendidos se fossem chamados de falsos apóstolos, pois se acham legítimos ministros de Cristo e seus apóstolos. Estes não precisam de Teologia, pois receberam sua autoridade diretamente de Deus, que lhes revela tudo, à semelhança dos apóstolos de Jesus Cristo, incluindo Paulo. Se acham ministros com uma mensagem restaurada de um ministério restaurado, isso parece conhecido, não? Exatamente, os mórmons aparecem nas casas com um “evangelho” restaurado, e com outro livro que afirmam ter a mesma autoridade da Bíblia.
Os Falsos apóstolos com suas doutrinas extravagantes, não precisam de Teologia, isso é coisa de “fanáticos” como Lutero, Calvino, João Wesley e outros tantos. Já se foram os tempos quando os evangélicos lutavam contra pseudo-apóstolos de fora de suas igrejas, hoje, no entanto, é uma febre ser apóstolo. Por que será que quanto mais apóstolos aparecem, tanto maior é o abuso às Escrituras, os absurdos ensinados aumentam e o impacto social diminui ao invés de aumentar, quando falo de impacto social, me refiro ao impacto positivo, como: diminuição da violência, da corrupção e etc... Não falo do impacto negativo, que na verdade tem aumentado, tal como: dólares no exterior, ensino de como arrecadar volumosas quantias de dinheiro flagrado pela TV, escândalos morais, falsas doutrinas, amuletos à semelhança do: sal grosso; banho de sal com arruda, cruz com pedra do sepulcro de Jesus, água do Jordão, ad infinitum.
Agora está pipocando de apóstolos aqui e acolá, da maneira mais natural do mundo, falta pouco para se vender apóstolos nas esquinas. Claro que apóstolos existiram, e agora vamos analisar o caso mais detalhadamente.
1° caso, Efésios 4.11: “E ele mesmo deu uns para apóstolos, e outros para profetas, e outros para evangelistas, e outros para pastores e doutores”.
Esse texto de Efésios é amplamente usado pelos defensores do “apostolado”, o texto fica mais claro quando analisado dentro do contexto geral das Escrituras, pois de outra forma seria o princípio da uma heresia. Em outro texto parecido, 1Coríntios 12.28, lemos: “E a uns pôs Deus na igreja, primeiramente apóstolos, em segundo lugar profetas, em terceiro doutores, depois milagres, depois dons de curar, socorros, governos, variedades de línguas”.
2º caso. O único fundamento
Os textos acima citados declaram a existência do ministério apostólico?
Creio que para o período sim, pois o texto diz “primeiramente apóstolos” em segundo lugar “profetas”, então deixemos a Bíblia explicar a própria Bíblia. Apóstolos e profetas são descritos como primeiro e segundo consecutivamente, porque são o fundamento. Veja o que diz Efésios 2.20: “edificados sobre o fundamento dos apóstolos e profetas, sendo ele mesmo, Jesus Cristo, a pedra angular”. Cristo é a pedra angular de esquina, e ninguém pode lançar outro fundamento (1Coríntios 3.10-11).

3º caso. Matias. Texto: Atos 1.14-26
Matias só aparece aqui.
Lançaram sortes
Não foi Cristo que o escolheu, mas foi por iniciativa de Pedro.
Mesmo assim tinha requisitos, que eram:
Ø Ter acompanhado os apóstolos, todo o tempo em que Jesus estava na terra ensinando, antes da crucificação.
Ø Desde o batismo de João até o dia da ascensão.
Ø E isso se passa no século I.
Tome outro o seu lugar (NVI) encargo (ARA), o seu Bispado (ARC). Liderança (ECA). Não diz no próprio texto usado por Pedro a palavra “Apostolado”, mas bispado, do grego “Episkopen” e não “Apostolous”, será que a Palavra se engana de cargo? Ou é de outros o engano?
Quantos apóstolos há?
Bliblicamente só 12. Veja Apocalipse 21.14.
Mas outros têm se designado apóstolos, embora não o sejam (Ap 2.2):
“Conheço as tuas obras, tanto o teu labor como a tua perseverança, e que não podes suportar homens maus, e que puseste à prova os que a si mesmos se declaram apóstolos e não são, e os achaste mentirosos”.
Barnabé e Paulo
At 14.14. “Barnabé e Paulo são chamados apóstolos” aqui o sentido de “apóstolos” é enviados, ou missionários, é só ver o contexto, no capitulo 13 eles são enviados à missão e então vão a Chipre, Antioquia da Pisídia e no capítulo 14 eles vão para Icônio, Listra e Derbe e etc... O contexto é todo da missão, assim também Barnabé é apóstolo (missionário). Eles entendiam o sentido das palavras, exatamente; o que os “Apóstolos” de hoje não entendem.
Veja a comparação: o Fulano comprou carne e fez um churrasco. Você entende o que quero dizer por “churrasco”? Creio que sim (Carne assada).
Por sua vez, o cachorro do seu Beltrano tomou um choque de 220 volts e virou churrasco (você entende?). A mesma palavra tem o mesmo uso? (obviamente que não).
Poderia dizer aos defensores dos apóstolos atuais: “entenderam ou querem que eu desenhe?”.
E Paulo?
Paulo é Apóstolo da mesma maneira que os 11 o eram, pois lá vão as suas credenciais:
Apóstolo aos gentios (Rm 11.13).
Pela vontade de Deus (1Co 1.1) não de homens (Gl 1.1).
Viu ao Senhor (1Co 9.1; cf. 9.3 e At 22.6-11, onde descreve essa situação).
Mesmo assim se considerou um abortivo=fora de tempo e isso no século I (1 Co 15.8).
Se Paulo, vendo ao Senhor, e isso no século 1º, mesmo assim considerou-se um abortivo, o que diremos dos tais “apóstolos” de hoje, quando já se passaram quase 20 séculos depois da era dos apóstolos?
2Co 13.8 – Porque nada podemos contra a verdade, senão em favor da própria verdade.
Gl 4.16 – Fiz-me, acaso, vosso inimigo, dizendo a verdade?
Quem persevera na doutrina dos Apóstolos de Cristo não segue apóstolos de araque (2Co 11.13; At 2.42).

Os Falsos Profetas
Outro grupo que chama a atenção pelo seu desprezo à Bíblia são os falsos profetas. Conheci um dia um homem que se intitulava “profeta”. Ele veio à cidade vizinha de onde eu morava, e causou grande movimento entre muitos pastores que ficaram verdadeiramente eufóricos, por ter um “profeta” visitando a cidade. Na verdade o tal “profeta”, de aparência, era muito semelhante ao personagem Tattoo da série dos anos 70 e 80 chamada: “A Ilha da Fantasia”, só que a semelhança termina aí, pois a apresentação do dito “profeta” foi ridícula, isto é, sua mensagem, se é que poderia referir-me àquilo que ele falou como uma mensagem. Seu discurso foi pedir a alguém um sapato furado (não havia ninguém, por isso não pôde prosseguir com a profecia), mandou as pessoas correr desesperadamente em volta da igreja, falou contra o estudo da teologia, afirmando que era uma verdadeira maldição, e quanto aos teólogos, ele atribuiu-lhes tantos adjetivos detestáveis que não gostaria de repeti-los.
O ministério do tal homem era, segundo ele mesmo, “levantar apóstolos em todo o mundo”, e naquela região seriam quatro ao total, apenas dois deles foram “consagrados”.
Um depende do tempo para colocar na cabeça de suas ovelhas que ele é um apóstolo, o nome do outro ficou oculto, como o último segredo de Fátima.
Usam como base de seus pseudo-ministérios alguns textos fora de contexto, analisemos as referências e vejamos se o sistema não cai.
Ef 4.11.
Como já vimos “profetas estão classificados como fundamento” juntamente com os apóstolos e Cristo. Ef 2.20.
Argumentos a favor do ministério profético:
Mórmons- citam Amós 3.5 – mas Hebreus 1.1, nos informa que antigamente era assim, agora não.
Mateus 11.13, o período dos profetas foi até João.
Mas o caso de Ágabo? (At 21.10-11). Ágabo diz que os judeus entregariam Paulo nas mãos dos gentios, mas em At 23.12-25, está escrito que os judeus o queriam matar e Paulo não foi entregue por eles, mas foi tomado, para estar em segurança.
O fundamento é posto uma única vez.
Jesus predisse que nos últimos dias viriam falsos profetas (Mt 7.15) “ acautelai-vos dos falsos profetas”.
Mateus 24.11 “ surgirão falsos profetas e enganarão a muitos”
Mateus 24.24 “Falsos cristos e falsos profetas operando sinais e prodígios, se fosse possível enganariam até mesmo os eleitos”.
1João 4.1-6.

Os Falsos Pastores
Os falsos pastores, obviamente não irão estudar Teologia, se, no entanto estudarem, é apenas para conseguir um diploma para enfeitar parede. Certa criatura humana numa ocasião disse no púlpito que o estudo mais importante era o de uma certa profissão (coincidentemente, a de um visitante, profissional liberal, que visitava a comunidade naquele dia), e desprezava a teologia dizendo que ninguém precisa dela.
Certamente tal homem não leu D.M.Lloyd-Jones ou Spurgeon, eu ficaria até mesmo muito feliz se soubesse que tal pastor lê a Bíblia.
Os falsos pastores dizem que não precisam de Teologia, pois isso acabaria com o “zelo” espiritual quem eles têm. Mataria o desejo evangelístico de sua igreja, apagaria o fogo do Espírito em suas vidas, então se tornariam mortos, vazios e prolixos.
A espiritualidade que tais homo–não–sapiens defendem nada mais é do que seu modo de vida desregrado e vaidoso, sua maior preocupação é o próprio ventre, sempre preguiçosos. Não visitam os necessitados espontaneamente, somente quando após muito choro e vela são instados, não pela consciência, pois esta já há tempos foi cauterizada. Mas pelos outros que os questionam sobre o seu trabalho pastoral.
Para que estudar Teologia, quando a internet já tem sermões preparados?
Para que estudar Teologia se a preocupação é o entretenimento?
Para que estudar Teologia quando só se fala o que o povo quer ouvir?
Para que estudar Teologia quando se recebe “mensagens eletrônicas” vindas diretamente de Deus?
O que há alguns anos atrás era deboche através do Tim Tones (Personagem interpretado por Chico Anysio), hoje vive em muitos púlpitos através de jargões infelizes e interpretações jocosas das Escrituras.
Quando Deus retirar o fôlego de vida de tais embusteiros, e então se encontrarem diante de Deus para o julgamento final, aí se verá o que parecia ser tão espiritual, quando na verdade era obra da carne, vaidade, obra de demônios e mundanismo, tudo camuflado atrás de uma gravata e paletó.
Como alguém pode perder o que não têm? Certamente há alguns teólogos que não tem compromisso nenhum com Deus, no entanto veja qual é a sua teologia, analise sua crença. Geralmente vejo pessoas sem base nenhuma de fé fazendo todo o tipo de aberração, como profetizar a uma mãe que seu filho nascerá são e forte, e dará muitas alegrias à família, será alguém bem sucedido, tudo ocorrerá bem - e no entanto a criança morreu alguns dia depois do nascimento! Quem consolará tal mãe vitimada por tal “dito ministro do evangelho”.
Boa teologia leva o ser humano a render-se aos pés de Jesus, reconhece a condição caída do homem, sua incapacidade, glorifica a Deus por ser cheio de Graça e puramente, por Deus ser Deus.
Boa Teologia fará o Pastor ir atrás da ovelha que saiu do aprisco, incentivará o zelo evangelístico (“Tenho muito povo nesta cidade”). Atos dos Apóstolos revela que a igreja testemunhava e cooperava com eles o Senhor.
Boa teologia arderá por missões, um bom exemplo é William Carey, outro bom exemplo é David Linvingstone.

Os falsos Pregadores
Um grupo que tem crescido muito em nosso solo pátrio são os falsos pregadores. Falsos, porque sua mensagem não é bíblica, discorrem sobre tudo e qualquer coisa, menos a Bíblia.
Os falsos pregadores, à semelhança dos falsos profetas, se dizem inspirados por Deus, sempre estão descobrindo algo nunca antes visto no texto sagrado, são verdadeiramente a última batatinha do pacote. No entanto o que tenho constatado é que na verdade, o que tais homens pregam, nada mais é do que pensamentos e formulações teológicas incorretas, tudo regado a muito emocionalismo e misticismo.
Muitos pregadores usam palavras de efeito para impressionar a platéia, tais como: “tem um anjo aqui” ou “receeeebaaa”, isso, nos leva a perguntar, receber o quê, afinal de contas?
Falsos pregadores às vezes querem se passar por homens muito espirituais, que têm contato direto com Deus, recebem mais “revelações” em uma semana do que Moisés em toda a sua vida, tem mais “visões” em um único dia do que todos os profetas maiores e menores juntos, durante todo o tempo de seu ministério.
Será que a Bíblia não é mais suficiente? Antes o povo corria atrás de cartomantes e videntes, para muitos que frequentam as igrejas hoje a moda mudou, pois correm atrás de “profetas” para revelar suas vidas, vivem atrás de “pregadores diferentes”, que não deixam ninguém com a consciência pesada, falando de inferno e pecado. Quer encher um auditório? Então chame um “pregador” que cobre bem para discursar e pronto, você terá um mega-evento. Ah já estava esquecendo, contrate algum cantor gospel das paradas de sucesso, para abrilhantar seu evento.
Os falsos pregadores causam um dano terrível à causa do evangelho, pois seus ensinos ludibriam o povo, não estão interessados em pregar a verdade, pois isso não lhes enche os bolsos e não lhes trará fama. São semelhantes em tudo aos falsos profetas de Israel, e também aos falsos pregadores do Evangelho como Montano e Marcião, que arrastaram muita gente após si.

Os determinadores
Os determinadores não precisam estudar teologia, pois todo o poder lhes foi dado nos céus e na terra! Para que estudar quando tudo se torna realidade determinando, ordenando e batendo o pé?
Está precisando de boa saúde? Determine, dizem eles. Precisa de um carro novo? Gere-o pela fé. Comece pensar em uma bicicleta, depois uma moto, siga a sua gestação, então agora você está com oito meses de gravidez de sua “benção” agora sim seu carro novo já está pronto para nascer. Obs: não esqueça de escolher e determinar a cor do carro e dos faróis.
Quando alguém determina e não consegue o que determinou, a culpa é dele mesma. Se não aconteceu, ou a pessoa estava em pecado ou não teve fé suficiente, a culpa nunca recai sobre o “mestre Yoda” que ensina a determinação.
Quantas pessoas se frustraram, pois caíram nas malhas dos determinadores e não conseguiram o que determinaram, com isso acabaram se frustrando com o que pensavam ser o evangelho.
É preciso ter sobriedade para lidar com as inquietações dos seres humanos, o Único que determina as coisas e elas acontecem é Deus, ninguém mais. Nós não determinamos, pedimos, imploramos - se for da vontade dEle, Ele faz (cf. 1Jo 5.14).

Os incendiários
Por incendiários refiro-me àqueles que só querem fogo. Se no culto ninguém gritou, nenhuma pessoa sentiu um arrepio na coluna, se não houve aparição de anjo nem visão de bola de fogo, o culto não foi bom, Deus não estava presente.
Os incendiários não gostam de teologia, pois, a letra mata, e o Espírito vivifica. Teologia é coisa para frios espirituais, não para tochas humanas. A liturgia de uma igreja assim seria:
Oração: fogo no altar, e anjos (hierarquias como Querubins e Serafins são preferíveis) aparecendo.
Louvor: Noiva incendiando e igreja pegando fogo, ou corinhos tais como: “há uma roda de fogo entre nós!”
Oração pelas crianças: Queima as crianças, Senhor!!!!
Pregação: vida cheia de fogo, semeando fogo, plantando fogo, colhendo fogo, e etc....
Estes do fogo, certamente não precisam de teologia, sua vida é um fogo só. Será que na eternidade eles querem ter tanto fogo assim?

Os caçadores de Maldição Hereditária
Experiência pessoal acima de tudo!!! Não importa o que a Bíblia diz, contanto que eu presencie.
Livros sobre quebra de maldição estão por toda a parte, será que é mais fácil acreditar nesta pajelança do que na Bíblia?
Tratam contingências humanas na base do espiritual. Valores; criação; exemplo não são levados em conta, na verdade nem Bíblia é levada em conta, que textos usam? Li um livro que citava talvez uns três versículos de um livro da Bíblia para justificar seu ponto de vista, os versículos foram distorcidos para afirmar o que não dizem.
De onde vêm tais doutrinas? Não da Bíblia, e sim de: entrevistas com demônios; experiências pessoais; paganismo...
Muita gente vem para a igreja e segue acreditando em suas velhas crenças, ex-macumbeiros, ex-satanistas, ex-bruxas e etc... Mal entram na igreja e já começam a dar testemunho do que fizeram, e de como exorcizar tais poderes malignos, como quebrar maldições, vínculos e tantas outras coisas estapafúrdias.
Por que alguns que dizem serem pessoas aptas para quebrar maldição hereditária continuam, eles próprios, doentes?
Jesus se fez maldição por nós ou não? “Maldito é todo o que for pendurado no madeiro”, encaramos isso como lenda ou como verdade absoluta e inquestionável? Se for encarado como lenda, prepare-se para todo o tipo de neurose possível, pois, estarão vendo suas genealogias para caçar alguma maldição, esconjurar algum demônio que tenha permissão de endemonizar alguém.
Refutação da tal doutrina nefanda de maldição hereditária:
1. Deus frustra, pela sua bênção, uma maldição já proferida (Ne 13.2: Porquanto não tinham saído ao encontro dos filhos de Israel com pão e água; antes, contra eles assalariaram a Balaão, para os amaldiçoar, porém o nosso Deus converteu a maldição em bênção. Cf. Nm 23.23 e Sl 109.28).
2. Ele livra da maldição o seu protegido e o justo que não merece (2 Sm 16.12: Porventura, o SENHOR olhará para a minha miséria; e o SENHOR me pagará com bem a sua maldição deste dia.)
3. Deus muda em maldição a bênção de um sacerdote indigno (Ml 2.2: Se não ouvirdes e se não propuserdes no vosso coração, dar honra ao meu nome, diz o SENHOR dos Exércitos, enviarei a maldição contra vós e amaldiçoarei as vossas bênçãos; e também já as tenho amaldiçoado, porque não aplicais a isso o vosso coração. Cf. Pv 3.33).
4. A eficácia da maldição ou da bênção depende do querer de Deus para que se realize e da nossa resposta humana à sua vontade (Cf. Dt 11.26-32).
Maldição não é um dizer profético negativo sobre alguém, porque isso significaria que qualquer ser humano tem poderes ilimitados para amaldiçoar e para abençoar, como nós acabamos de ver, isso não passa de um verdadeiro disparate.
Para definir as palavras “bênção” e “maldição”, precisamos recorrer à Palavra de Deus. No AT, há pelo menos 2 expressões que interpretam e definem objetivamente a palavra “maldição”. A 1ª é “anátema” (em hebraico, “herem”), que significa ser “proibido, subtraído” do uso comum e profano. O AT conhece 3 tipos de herem:
1° - o herem com promessa, pela qual o homem consagra alguma coisa a Deus (Lv 27.28). Tudo que pode ser objeto de promessa pode cair sob esse herem. Anátema, aqui, não tem sentido negativo.
2° - O herem como medida militar. Consistia na consagração da presa, às vezes de toda a presa junto com o território conquistado a Deus, para assim obter a Sua ajuda no combate (O caso de Jericó).
3° - O herem como castigo divino. Sobretudo pela idolatria, aplicado a indivíduos (Ex 20.4-6; Dt 13.13-18).
No judaísmo posterior, o anátema da sinagoga era uma pena que excluía a pessoa, temporária ou definitivamente, da participação do culto religioso.
A 2ª palavra é “ariah”, que diz respeito à deprecação, usada algumas vezes até como oração. Na Septuaginta, seu uso comum vem associado ao ato de praguejar ou murmurar (no NT, veja Rm 3.14).
No NT, há duas expressões mais comuns para “maldição”: anátema e katara. A 1ª. Anátema, é muito usada, tanto nos evangelhos como nas epístolas paulinas. Algumas vezes aparece com o sentido de:
a) Castigo. At 23.14;
b) Separação de Deus. Rm 9.3; Gl 1.8,9.
2ª. Katara. A melhor definição para essa palavra, “maldição”, é uma sentença que vem da quebra da lei moral de Deus.
Quando Deus pronuncia uma maldição, isto é, em primeiro lugar, uma denúncia contra o pecado (Nm 5.21; Dt 29.19,20).
Não se faz muito esforço para refutar a tal “doutrina” da maldição hereditária, a minha admiração é que ainda existem pessoas que acreditam em tais coisas.
Estes caçadores de maldição hereditária, com certeza não precisam de Teologia, afinal já tem toda a gnose do mundo.
Meus pensamentos e convicções levaram-me a escrever este breve artigo sobre: “quem não precisa de teologia”, certo de que como ser humano que sou, posso estar errado, porém a menos que seja corrigido pela Palavra de Deus e pela razão comum, continuo pensando da mesma forma.
Minha oração sincera a Deus é que todos os Eleitos tenham ousadia de testemunhar de sua santíssima fé nestes dias tão conturbados em que vivemos; fé essa que nos foi dada por Deus, para o louvor de Sua glória.


NOTAS:
1 . PASCAL, Blaisé. Pensamentos. Abba Press, p.138.
2 . COSTA, Hermisten. Calvino de A a Z. Vida, p. 284.

segunda-feira, 13 de abril de 2009

A VIDA PARA CRISTO: O EXEMPLO DE PAULO

1. A Extraordinária Relevância de Paulo

É tarefa quase impossível escrever algo original a respeito do Apóstolo Paulo. Tantos foram os livros, artigos, ensaios, tratados e obras em geral escritos sobre o “Apóstolo da Graça” que se corre o sério risco de parecer redundante ao colocar-se diante do teclado para escrever, ainda mais quando se é um reles seminarista, “pobre, cego, ignorante e nu”! Mas, por outro lado, pesquisar e escrever sobre Paulo é um prazer! Deleitamos-nos em seus feitos, em suas assertivas apaixonadas, em sua tenacidade, em sua total e absoluta entrega ao seu Senhor que o conquistou naquela estrada poeirenta para Damasco. Ao acompanhá-lo em suas viagens pela pena de Lucas ou ao ouvi-lo em suas epístolas, não podemos deixar de nos alegrar com suas vitórias e de nos entristecer juntamente com ele em suas decepções e frustrações. E descobrimos que Paulo é humano, e que mesmo nós, que vivemos mergulhados numa sociedade hedonista e relativista, poderemos, quem sabe, experimentar o mesmo Poder espiritual que o transformou de fariseu perseguidor no maior (ou menor, como ele gostaria de ser chamado?) de todos os Apóstolos de Jesus Cristo. Se os cristãos hodiernos desejassem entregar-se a Cristo como Paulo se entregou! Se os cristãos hodiernos – se nós desejássemos nos gastar por Cristo como Paulo se gastou! Sua vida e sua teologia – entrelaçadas, unificadas, em dependência mútua – são um desafio para nós. Isaltino Gomes Coelho Filho escreveu a respeito de Paulo: “Queira Deus que ousemos ser cristãos radicais e serviçais como ele o foi. Este é o grande desafio de Paulo aos cristãos atuais: amar a Cristo e viver e estar disposto a morrer por ele”. (1)
É por isso que Paulo é absolutamente relevante para nós, como discípulos de Cristo (e leitores de Paulo) no século XXI.

2. Sua Vida Antes de Cristo e sua Conversão

Jesus é um divisor de águas na História da humanidade. Nosso calendário começa no (suposto) ano de Seu nascimento. Ele dividiu a História em antes e depois de Cristo, e dividiu também a história de nossas vidas em antes e depois de conhecê-lo.
E certamente foi assim com Paulo.
Nascido em Tarso, “cidade não insignificante” (cf. At 21.39, ARA) da Cilícia, província romana a nordeste do mar Mediterrâneo, o jovem Saul (esse era seu nome hebreu, e é assim que Jesus o chama em At 9.4) teve acesso a uma cultura cosmopolita, confluência dos mundos grego, romano e oriental, e centro financeiro importante, inclusive contando com um cais bem estruturado e eficiente (para os padrões da época), banhado pelo rio Cnido. Contava com muitas escolas onde seus cidadãos aprendiam retórica, matemática, ética, gramática e música. O próprio César Augusto havia sido educado por Atenodoro de Tarso, e escolhera outro educador daquela cidade para ser mestre de seu filho. Havia ali muitos prédios importantes, bem como estádios e ginásios, onde gregos e romanos participavam de competições atléticas. Rota entre o ocidente e o oriente, Tarso era realmente uma cidade importante. (2)
Hoje é lembrada unicamente por ter sido o berço do Apóstolo Paulo.
Do próprio Paulo temos nuances de sua esmerada educação, seja nos primeiros anos em Tarso, seja em Jerusalém, onde foi discípulo do grande rabino Gamaliel (At 22.3), que por sua vez era discípulo (ou filho, ou neto, como querem algumas tradições) de Hillel, fundador de uma escola rabínica que ensinava que o julgamento divino estava relacionado à preponderância do bem ou do mal na vida inteira de uma pessoa – bem diferente do que ensinava a outra escola famosa da época, a escola de Shammai, muito mais rígida em sua interpretação da Lei e em suas exigências (3). Seja como for, Gamaliel aparece na Bíblia como homem sensato e contemporizador, bem diferente do que seria seu jovem discípulo Saulo (cf. At 5.34-40). É em suas epístolas, e em alguns trechos de Atos, que o Apóstolo abre seu coração e revela suas ações passadas, movidas por um caráter não regenerado:
“Se alguém pensa que tem razões para confiar na carne, eu ainda mais: circuncidado no oitavo dia de vida, pertencente ao povo de Israel, à tribo de Benjamim, verdadeiro hebreu; quanto à Lei, fariseu; quanto ao zelo, perseguidor da igreja; quanto à justiça que há na Lei, irrepreensível” (Fp 3.4-6). (4)
“Persegui os seguidores deste Caminho até a morte, prendendo tanto homens como mulheres e lançando-os na prisão...” (At 22.4).
“Eu respondi: Senhor, estes homens sabem que eu ia de uma sinagoga a outra, a fim de prender e açoitar os que crêem em ti” (At 22.19).
“Eu também estava convencido de que deveria fazer todo o possível para me opor ao nome de Jesus, o Nazareno. E foi exatamente isso que fiz em Jerusalém. Com autorização dos chefes dos sacerdotes lancei muitos santos na prisão, e quando eles eram condenados à morte eu dava o meu voto contra eles. Muitas vezes ia de uma sinagoga para outra a fim de castigá-los, e tentava forçá-los a blasfemar. Em minha fúria contra eles, cheguei a ir a cidades estrangeiras para persegui-los” (At 26.9-11).
“Pois sou o menor dos apóstolos e nem sequer mereço ser chamado apóstolo, porque persegui a igreja de Deus” (1Co 15.9).
“Vocês ouviram qual foi o meu procedimento no judaísmo, como perseguia com violência a igreja de Deus, procurando destruí-la. No judaísmo, eu superava a maioria dos judeus da minha idade, e era extremamente zeloso das tradições dos meus antepassados” (Gl 1.13,14).
“... a mim que anteriormente fui blasfemo, perseguidor e insolente...” (1Tm 1.13a).
Lucas também descreve a conduta de Paulo no judaísmo perseguidor, corroborando as informações do próprio Apóstolo:
“Saulo, por sua vez, devastava a igreja. Indo de casa em casa, arrastava homens e mulheres e os lançava na prisão” (At 8.3).
“Enquanto isso, Saulo ainda respirava ameaças de morte contra os discípulos do Senhor. Dirigindo-se ao sumo sacerdote, pediu-lhe cartas para as sinagogas de Damasco, de maneira que, caso encontrasse ali homens ou mulheres que pertencessem ao Caminho, pudesse levá-los presos para Jerusalém” (At 9.1,2).
Shaul, Saul ou Saulo, o jovem hebreu apaixonado pela religião de seu povo e “extremamente zeloso” das tradições de seus antepassados, muito bem instruído na Torá, certamente destacou-se dentre os discípulos de Gamaliel. Porém sua educação não limitou-se ao conhecimento rabínico de seu povo; aquele era um judeu cosmopolita. Nascido cidadão romano (cf. At 22.22-29), o jovem Paulo (seu nome latino) soube tirar partido também de sua herança imperial. Além do hebraico e aramaico, aprendeu o grego, e possivelmente o latim. Como de praxe na educação judaica, aprendeu também uma profissão manual, e tornou-se fazedor de tendas (cf. At 18.3), ofício do qual muito se valeu durante suas jornadas missionárias. Saulo abraçou o farisaísmo (bem de acordo com sua personalidade e temperamento, aliás), “a seita mais severa da nossa religião”, como ele mesmo a descreveu ao rei Agripa (At 26.5). E certamente o fato de ser fariseu, e possivelmente membro do Sinédrio, era sem dúvida um motivo de orgulho para Saulo. Mesmo depois de sua conversão, ele, com muita inteligência, soube aproveitar-se de sua condição de fariseu (cf. At 23.6-10). (5)
Como fariseu, e dentro do judaísmo de sua época, Saul tinha um futuro brilhante pela frente. Mas o que para ele era lucro, passou a considerar como perda, depois de conhecer o brilho infinitamente maior dAquele que o chamou na famosa estrada para Damasco (cf. Fp 3.4-8). Muitas tentativas foram feitas por inúmeros pesquisadores – psicólogos, historiadores, teólogos liberais e afins – para tentar explicar a conversão de Paulo em termos “racionais”, eliminando o caráter sobrenatural do evento. Como homens não ressuscitam, certamente ele não teve um encontro real com Cristo! Desenterraram Estêvão para dizer que a consciência culpada de Paulo (cf. At 22.20) o levou a ter uma espécie de crise naquela estrada, culminando com um delírio (Dawkins???) ou alucinação. A própria Bíblia afirma que mesmo após o apedrejamento de Estêvão, Paulo ainda “respirava ameaças de morte” (At 9.1) contra os cristãos, e nem por um momento vemos em suas asseverações (algumas alistadas acima) ou no livro de Atos o menor sinal de remorso – não, antes daquele encontro na estrada, Paulo era um homem determinado a cumprir sua missão, que era, simplesmente, perseguir e destruir os seguidores do “Caminho”. A verdade é que nenhuma explicação psicológica ou liberal (ou neoliberal, ou neo-ortodoxa, ou outra aberração pseudoteológica semelhante) basta para explicar o evento na estrada para Damasco. O encontro com Jesus Cristo ressurreto mudou para sempre os planos, os sonhos, os objetivos e a vida inteira de Saul, o fariseu de Tarso.


3. Sua entrega total a Cristo

No passado distante, Deus levantou um rei para seu povo, o rei que o povo gostaria de ter. Tratava-se de um jovem alto, de porte atlético e apto para a arte da guerra, chamado Saul, da tribo de Benjamim. Ele destacou-se entre os demais jovens de sua geração e nos primeiros anos de seu reinado livrou Israel de seus inimigos. No fim, porém, voltou-se contra o Deus que o colocara no trono e mais tarde acabou substituído por outro rei, Davi, da tribo de Judá, cujo trono o Senhor prometeu firmar para sempre sobre Israel.
Chegada a “plenitude dos tempos” (cf. Gl 4.4), o prometido descendente de Davi, o Messias, da tribo de Judá, vem “tabernacular” entre o seu povo (cf. Jo 1.14). Após cumprir Sua missão na Terra, Ele retorna para os céus, de onde “voltará da mesma forma como o viram subir”, como disse o anjo (cf. At 1.11). E então Deus levanta seus apóstolos – e dentre eles um homem chamado Saul, da tribo de Benjamim, que destacava-se dentre os jovens de sua geração. Não era alto nem tinha porte atlético, a julgar pelos Atos de Paulo, apócrifo mui interessante. Mas era apto para a arte da guerra espiritual e extremamente hábil no manejo da Palavra de Deus, que corta mais profundamente do que qualquer espada romana. Os homens podem fracassar, mas o Senhor da História jamais fracassará.
Paulo entregou-se totalmente a Cristo. Não houve uma mudança gradual, uma conversão “processual” na experiência paulina. Ele saiu de Jerusalém como Saulo o fariseu perseguidor, e chegou em Damasco como outro homem. No instante mesmo em que foi atingido pelo clarão cegante, já soube o que estava acontecendo: sua mente ágil, seu intelecto privilegiado, seu conhecimento escriturístico e sua perspicácia imediatamente fizeram-lhe saber o que estava acontecendo ali. Tão perplexo estava, no entanto, que começou a esboçar a pergunta, a qual ele mesmo deu a reposta: “Quem és tu, Senhor?” (cf. At 9.5). “Na tradição rabínica, uma voz do céu como essa seria considerada a voz do próprio Deus. A repetição solene do nome de Saulo e a luz brilhante lhe mostraram que era possível estar na presença da deidade” (6).
Saulo foi conquistado por Cristo. Ali naquela estrada, ele percebeu que tudo o que ele era – hebreu de hebreus, fariseu, membro do Sinédrio, cidadão romano, equipado com a cultura mais avançada de sua época – reduzia-se a nada diante daquele esplendor ofuscante. Tudo o que ele conquistara na vida reduzia-se a nada diante daquela voz poderosa que o questionava. Todos os seus sonhos, seus planos e seu projeto de vida caíram por terra naquele instante. Pobre, miserável, cego e nu – mergulhado nas trevas da cegueira, Paulo viu claramente sua condição abjeta e miserável diante dAquele que lhe aparecera.
“Saulo falaria disso mais tarde como a última das aparições de Jesus aos seus seguidores após a ressurreição (1Co 15.8). (...) Para o rabino de Tarso, era concedida uma entrevista com o Cristo ressurreto”(7).
Nesse dia Saulo morreu. Morreu o hebreu de hebreus, morreu o fariseu, morreu o sábio, morreu o rabino, morreu o membro do Sinédrio, morreu o cidadão romano. A vida de Saulo de Tarso terminou naquela estrada, sob o fulgor daquela luz. A partir daí, “fui crucificado com Cristo. Assim, já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim. A vida que agora vivo no corpo, vivo-a pela fé no filho de Deus, que me amou e se entregou por mim” (Gl 2.20). A partir daí, “que eu jamais me glorie, a não ser na cruz de nosso Senhor Jesus Cristo, por meio da qual o mundo foi crucificado para mim, e eu para o mundo” (Gl 6.14).
A partir daí nasceu “Paulo, escravo de Cristo Jesus, chamado para ser apóstolo, separado para o evangelho de Deus” (cf. Rm 1.1).
Não mais o digníssimo membro do Sinédrio, mas o escravo de Cristo Jesus. Não mais o rabino de Tarso, discípulo de Gamaliel, mas aquele que fora chamado para ser apóstolo. Não mais o fariseu – agora ele havia sido separado para o evangelho de Deus.
Como ele viveu a partir daí? Novamente ele mesmo responde a partir de suas epístolas (note bem a força destas asseverações, colocadas em seqüência):
“Porque me parece que Deus nos colocou a nós, os apóstolos, em último lugar, como condenados à morte. Viemos a ser um espetáculo para o mundo, tanto diante de anjos como de homens. Nós somos loucos por causa de Cristo, mas vocês são sensatos em Cristo! Nós somos fracos, mas vocês são fortes! Vocês são respeitados, mas nós somos desprezados! Até agora estamos passando fome, sede e necessidade de roupas, estamos sendo tratados brutalmente, não temos residência certa e trabalhamos arduamente com nossas próprias mãos. Quando somos amaldiçoados, abençoamos; quando perseguidos, suportamos; quando caluniados, respondemos amavelmente. Até agora nos tornamos a escória da terra, o lixo do mundo” (1Co 4.9-13).
“Vocês não sabem que aqueles que trabalham no templo alimentam-se das coisas do templo, e que os que servem diante do altar participam do que é oferecido no altar? Da mesma forma, o Senhor ordenou àqueles que pregam o evangelho, que vivam do evangelho. Mas eu não tenho usado de nenhum desses direitos (...). Qual é, pois, a minha recompensa? Apenas esta: que, pregando o evangelho, eu o apresente gratuitamente, não usando, assim, dos meus direitos ao pregá-lo. Porque, embora seja livre de todos, fiz-me escravo de todos, para ganhar o maior número possível de pessoas. Tornei-me judeu para os judeus, a fim de ganhar os judeus (...) Para os que estão sem lei, tornei-me como sem lei (embora não esteja livre da lei de Deus, e sim sob a lei de Cristo), a fim de ganhar os que não têm a Lei. Para com os fracos, tornei-me fraco, para ganhar os fracos. Tornei-me tudo para com todos, para de alguma forma salvar alguns. Faço tudo isso por causa do evangelho, para ser co-participante dele” (1Co 9.13-15, 18-20a, 21-23).
“Se enlouquecemos, é por amor a Deus; se conservamos o juízo, é por amor a vocês. Pois o amor de Cristo nos constrange, porque estamos convencidos de que um morreu por todos; logo, todos morreram. E ele morreu por todos para que aqueles que vivem já não vivam mais para si mesmos, mas para aquele que por eles morreu e ressuscitou. De modo que, de agora em diante, a ninguém mais consideramos do ponto de vista humano. Ainda que antes tenhamos considerado Cristo dessa forma, agora já não o consideramos assim. Portanto, se alguém está em Cristo, é nova criação. As coisas antigas já passaram; eis que surgiram coisas novas!” (2Co 5.13-17).
“Não damos motivo de escândalo a ninguém, em circunstância alguma, para que o nosso ministério não caia em descrédito. Ao contrário, como servos de Deus, recomendamo-nos de todas as formas: em muita perseverança; em sofrimentos, privações e tristezas; em açoites, prisões e tumultos; em trabalhos árduos, noites sem dormir e jejuns; em pureza, conhecimento, paciência e bondade; no Espírito Santo e no amor sincero; na palavra da verdade e no poder de Deus; com as armas da justiça, quer de ataque, quer de defesa; por honra e por desonra; por difamação e por boa fama; tidos por enganadores, sendo verdadeiros; como desconhecidos, apesar de bem conhecidos; como morrendo, mas eis que vivemos; espancados, mas não mortos; entristecidos, mas sempre alegres; pobres, mas enriquecendo muitos outros; nada tendo, mas possuindo tudo” (2Co 6.3-10).
Falando dos “superapóstolos” que os coríntios tanto prezavam e que se gloriavam comparando-se com Paulo, ele replica: “São eles hebreus? Eu também. São israelitas? Eu também. São descendentes de Abraão? Eu também. São eles servos de Cristo? – estou fora de mim para falar dessa forma – eu ainda mais: trabalhei muito mais, fui encarcerado mais vezes, fui açoitado mais severamente e exposto à morte repetidas vezes. Cinco vezes recebi dos judeus trinta e nove açoites. Três vezes fui golpeado com varas, uma vez apedrejado, três vezes sofri naufrágio, passei uma noite e um dia exposto à fúria do mar. Estive continuamente viajando de uma parte a outra, enfrentei perigos nos rios, perigos de assaltantes, perigos dos meus compatriotas, perigos dos gentios; perigos na cidade, perigos no deserto, perigos no mar e perigos dos falsos irmãos. Trabalhei arduamente; muitas vezes fiquei sem dormir, passei fome e sede, e muitas vezes fiquei em jejum; suportei frio e nudez. Além disso, enfrento diariamente uma pressão interior, a saber, a minha preocupação com todas as igrejas. Quem está fraco, que eu não me sinta fraco? Quem não se escandaliza, que eu não me queime por dentro? Se devo orgulhar-me, que seja nas coisas que mostram a minha fraqueza. O Deus e Pai do Senhor Jesus, que é bendito para sempre, sabe que não estou mentindo. Em Damasco, o governador nomeado pelo rei Aretas mandou que se vigiasse a cidade para me prender. Mas de uma janela na muralha fui baixado numa cesta e escapei das mãos dele” (2Co 11.22-33).
“Por isso, por amor de Cristo, regozijo-me nas fraquezas, nos insultos, nas necessidades, nas perseguições, nas angústias. Pois, quando sou fraco é que sou forte” (2Co 12.10).
“Sei o que é passar necessidade e sei o que é ter fartura. Aprendi o segredo de viver contente em toda e qualquer situação, seja bem alimentado, seja com fome, tendo muito, ou passando necessidade. Tudo posso naquele que me fortalece” (Fp 4.12,13).
Isso tudo se parece com o modo como vivem aqueles que hoje se proclamam “apóstolos”? Isso se parece com o modo como vive a maioria dos cristãos de hoje em dia? Se parece com o que é pregado, ensinado e vivenciado na maioria das igrejas “evangélicas”? Se parece com o modo como vivemos nós?
Existe cristianismo autêntico hoje, como podemos ver claramente em Paulo? Existe cristianismo autêntico em nossas vidas? Podemos dizer, como Paulo: “Já não vivo eu, mas Cristo vive em mim”? Podemos afirmar juntamente com ele: “fiz-me escravo de todos”???
Se não podemos, precisamos urgentemente rever nosso Cristianismo!



4. O Impacto de Paulo na vida da Igreja, hoje

A identificação de Paulo com Cristo foi tão grande que ele não pôde fazer menos do que identificar a Igreja como o “corpo” de Cristo. Essa é a metáfora mais distintiva de Paulo para a Igreja, enfatizando a unidade dos crentes com Cristo e a interdependência e relação dos crentes uns com os outros. Essa solidariedade dos crentes com seu Senhor é claramente um reflexo da doutrina do próprio Jesus (cf. Mt 10.40; 25.40) e da experiência cristã de Paulo. Ele preserva uma clara distinção entre a Igreja e Cristo, porém utiliza a metáfora de “corpo de Cristo” para descrever o tipo de vida e atividade que a Igreja deve exercer no mundo. Ele muda um pouco essa idéia nas epístolas da prisão, onde descreve Cristo como o cabeça do corpo (Ef 4.15; Cl 1.18), de onde o corpo obtém seu crescimento (Cl 2.19). Com isto ele pretende assentar claramente a dependência absoluta da Igreja, por toda a sua vida e desenvolvimento, de Cristo. Além disso chama Cristo de “cabeça” para ressaltar Sua supremacia sobre todas as coisas (Ef 1.22). Ora, há um corpo, não muitos “corpos” de Cristo. Para Paulo, existe somente uma Igreja, porque há somente um Cristo (Ef 4.4-6). Esta unidade, porém, subsiste em inesgotável diversidade, como a metáfora do corpo nos ensina. É uma unidade que exclui toda e qualquer divisão (1Co 1.13), que se expressa em preferência humilde de um para com o outro (Rm 12.3); em amor e afeição mútuos (1Co 12.25,26) e destrói todo preconceito racial, social, sexual, cultural ou econômico (Gl 3.26-28; Ef 2.16), excluindo aberrações doutrinárias e religiosas (Cl 2.18,19). (8)
Essa unidade inquebrantável da Igreja somente existe por causa de Cristo, porque a Igreja também morreu com Cristo, foi crucificada com Cristo, e já não vive mais para si mesma, mas para Cristo. Essa unidade somente é possível porque o mundo foi crucificado para a Igreja, e a Igreja, para o mundo. Essa unidade somente é possível porque um morreu pela Igreja, portanto, a Igreja morreu para si a fim de viver para Cristo. Essa unidade somente é possível porque o amor de Cristo constrange a Igreja e faz com que a Igreja desempenhe na Terra o papel de Cristo.
Em outras palavras, a Igreja somente é viável se viver como Igreja, se viver como Paulo viveu. Em suas epístolas temos a descrição fiel da vida para Cristo.



5. Conclusão

A Igreja precisa sair para fora de si mesma, assim como Paulo saiu para fora de si mesmo. Precisamos, como Igreja, esvaziar-nos de nós mesmos para encher-nos do Espírito Santo, do Espírito de Cristo. Há muito a aprender com Paulo.
A teologia paulina é a teologia da cruz, da morte do eu e da vida para Cristo e para os outros. É a teologia da fé, da esperança e do amor, porque Cristo nos concede tudo isso e muito mais. A vida de Paulo é uma demonstração contundente de sua teologia. Ele viveu o que ensinou, o que pregou. Sua morte é também uma demonstração de sua teologia. Ele morreu do modo como viveu – Paulo anulado, Paulo cancelado, Paulo conquistado por Cristo. E ao mesmo tempo Paulo rico, riquíssimo – dono do maior tesouro de todos os tempos: Jesus. Por amor a Cristo ele sofreu a perda de todas as coisas – mas achou um tesouro, como diz a letra da música “Por amor a Cristo”, de Adhemar de Campos (faixa 2 do CD Cantando a Palavra, em comemoração aos 50 anos da Sociedade Bíblica do Brasil). Esse tesouro é Jesus, o “tudo” de Paulo.
“Todavia, não me importo, nem considero a minha vida de valor algum para mim mesmo, se tão-somente puder terminar a corrida e completar o ministério que o Senhor Jesus me confiou, de testemunhar do evangelho da graça de Deus” (At 20.24).
“Eu já estou sendo derramado como uma oferta de bebida. Está próximo o tempo da minha partida. Combati o bom combate, terminei a corrida, guardei a fé. Agora, me está reservada a coroa da justiça, que o Senhor, justo Juiz, me dará naquele dia; e não somente a mim, mas também a todos os que amam a sua vinda” (2Tm 4.6-8).
Paulo identificou-se com seu Senhor que o conquistou na estrada para Damasco a ponto de proclamar: “trago em meu corpo as marcas de Jesus” (cf. Gl 6.17). Se a Igreja é o corpo de Cristo, precisa mostrar também essas marcas. Se quisermos ser verdadeiros discípulos de Cristo como Paulo foi, precisamos mostrar ao mundo as marcas de Cristo em nossas vidas. Campbel Morgan, citado por John Stott, escreveu: “Só o homem crucificado pode pregar a cruz. (...) Só o homem que morreu com Cristo pode pregar a cruz de Cristo” (9).
Paulo certamente foi esse homem, e nós também precisamos sê-lo, se quisermos ser verdadeiramente parte do corpo de Cristo, a Igreja.
O Apóstolo foi executado sob Nero, em Roma, após uma vida de serviço abnegado e extraordinário ao seu Senhor e Salvador. Mas ele continua falando hoje, dois mil anos depois, e nos ensinando a viver a vida cristã. Sua memória viverá para sempre, enquanto houver mundo, enquanto houver Igreja. Paulo foi decapitado por ordem do Imperador de Roma – o homem mais poderoso de sua época - mas recebido na glória celestial do Rei do Universo, o Deus Onipotente. Condenado por um déspota insano, recebido pelo Senhor da Glória. E sobre a condenação do Apóstolo de Cristo por um imperador romano, T.R. Glover comentou que viria o dia em que as pessoas chamariam seus cachorros de Nero – e seus filhos de Paulo. (10)



NOTAS

(1). REGA, Lourenço Stelia (org.). Paulo, sua vida e sua presença ontem, hoje e sempre. São Paulo: Editora Vida, 2004. p. 31.
(2). BALL, Charles Ferguson. A Vida e os Tempos do Apóstolo Paulo. Rio de Janeiro: Casa Publicadora das Assembléias de Deus, 1998. p. 7-11.
(3). BRUCE, F.F. Paulo: o apóstolo da graça, sua vida, cartas e teologia. São Paulo: Shedd Publicações, 2003. p. 44-46.
(4). Todas as citações bíblicas, salvo indicação em contrário, são da Nova Versão Internacional (NVI), publicada pela Sociedade Bíblica Internacional e pela Editora Vida.
(5). Cf. o ensaio de Luiz Alberto Sayão, in REGA, Lourenço Stelio (org.). Op.cit., p. 98-99.
(6). Bíblia de Estudo NVI, São Paulo: Editora Vida, 2003. p. 1868 (nota sobre At 9.5).
(7). BALL, Charles Ferguson. Op. cit. p. 64.
(8). LADD, George Eldon. Teologia do Novo Testamento. São Paulo: Hagnos, 2001. p. 504-506.
(9). STOTT, John. A Cruz de Cristo. São Paulo: Editora Vida, 1998. p. 325.
(10). BRUCE, F.F. Op. cit. p. 07.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

DECIDI SEGUIR A CRISTO

Decidi seguir a Cristo. Cansei de seguir meu próprio caminho, tropeçando no escuro, tateando nas trevas, correndo o risco de escorregar nas pedras e despencar no abismo a qualquer momento.
Decidi seguir a Cristo. Cansei de preocupar-me com o dia de amanhã, de perder o sono por causa de meus medos e meus fracassos, de correr atrás do vento, de quimeras e ilusões.
Decidi seguir a Cristo. Cansei de correr sem rumo, de viver sem razão, de andar a esmo.
Decidi seguir a Cristo. Cansei de tentar planejar meu futuro, de nadar contra a corrente, de calcular o custo, de depender de mim mesmo. Decidi seguir a Cristo.
Agora sigo o caminho dele, à luz do dia que já raiou. Se tropeço, ele me ajuda a levantar. Já não ando à beira do abismo, agora meus pés pisam terra firme, uma verdadeira rocha. Como é bom seguir a Cristo!
Agora não me preocupo com o dia de amanhã, porque sei que amanhã ele estará comigo assim como está hoje, assim como sempre esteve. Meus antigos temores já não me assustam mais, e não temo mal algum, porque ele está comigo. Meus fracassos e derrotas já não me trazem vergonha e remorso, porque ele me fez nascer de novo, perdoou meus pecados e tornou o mal em bem. Já não corro atrás do vento, nem perco tempo com ilusões, porque ele mostrou-me uma realidade maravilhosa, e concedeu-me a graça de servi-lo. Como é bom seguir a Cristo!
Agora também não corro sem rumo: tenho um alvo bem definido, um objetivo, uma razão para viver e morrer, um caminho seguro a trilhar. Como é bom seguir a Cristo!
Agora meu futuro pertence a ele, como tudo o mais na minha vida - passado, presente, futuro, o que fui, o que sou, o que serei, o que tive, o que tenho, o que terei. Tudo é dele, por ele e para ele - ele é que sabe os planos que tem para mim, ele é que constrói meu futuro. Eu só preciso segui-lo. Ele me fortalece em todos os momentos para que eu continue nadando contra a correnteza deste mundo; não me canso mais. Ele me libertou do mundo, do pecado, do diabo e de mim mesmo, de meu egocentrismo monstruoso, de meu egoísmo insensível. Não dependerei jamais de mim mesmo. Dependo dele para tudo, sempre dependerei, porque sei que ele jamais me desamparará, jamais me prejudicará, jamais me decepcionará, jamais permitirá que eu volte a ser como era antes de conhecê-lo. Como é bom seguir a Cristo!